Em fevereiro, Donald Trump citou um atentado inexistente na Suécia, para justificar suas medidas anti-imigratórias. A grande mídia tratou o episódio como “gafe” de um presidente “desequilibrado”. Dois meses depois ele jogou dezenas de mísseis na Síria e em seguida um atentado ocorreu em Estocolmo, Suécia. Coincidência? Ato falho de um presidente que sem querer antecipou a agenda? Ou mais sincronismos como ocorreu antes e durante “não-acontecimentos” como os de Nice, Berlim e Londres? Mais sincronismos ocorreram horas antes dos ataques à Síria, à bordo do avião presidencial, dessa vez envolvendo Trump e o filme “Star Wars Rogue One”. O fato é que agora tudo mudou: a grande mídia trata o presidente dos EUA como estadista e até humanitário. Como sempre, esses atos falhos e sincrônicos levantam a suspeita da existência de um script pré-estabelecido. São verdadeiros “espasmos da realidade” pelos quais passamos despercebidos.
O escritor norte-americano Norman Mailer (1923-2007) acreditava
que nos momentos que antecedem a grandes eventos ocorrem estranhas
coincidências como fossem pequenos espasmos da realidade, para depois retornar
ao estado normal.
Esses “espasmos da realidade” podem ser uma mistura
tanto de eventos sincromísticos (uma “linguagem crepuscular” na qual eventos se
conectam em “coincidências significativas”) quanto de atos falhos, lapsos, nos
quais nos quais pessoas “preveem” eventos futuros como estivessem em algum modo
automático revelando o script dos acontecimentos.
Como, por exemplo, quando uma apresentadora de um
telejornal da Globo “previu” o mando de jogo da partida final da Copa do Brasil
com 24 horas de antecedência, indicando a sequência dos jogo de ida e volta da
decisão, sequência que ainda seria sorteada na sede da CBF no Rio de Janeiro (clique aqui). Para-jornalismo? Ou a
apresentadora, ligada no automático, num lapso revelou um script pré-definido?
São momentos que muitas vezes passam despercebidos.
Mas se assemelham àquele vivido pelo personagem Truman no filme Show de
Truman: no saguão de um edifício as portas se abrem e, incrédulo, vê ao
invés do elevador os bastidores da produção por trás de uma gigantesca
cenografia.
Norman Mailer e os "espasmos da realidade" |
Mais “espasmos da realidade”
Pois nesse momento estamos diante de mais desses “espasmos
da realidade” que se manifestam nos importantes eventos desse ano:
o ataque com armas químicas supostamente cometido pelo Governo contra a
população síria, a retaliação dos EUA lançando dezenas de mísseis na Síria e
o atentado em Estocolmo onde um caminhão em alta velocidade atropelou e matou
quatro pessoas ferindo outras 15.
Em fevereiro, ao discursar para milhares de pessoas
em Melbourne, Flórida, ligando o problema da imigração na Europa ao terrorismo
internacional, o presidente Donald Trump citou a Suécia como se tivesse
ocorrido um atentado dias antes.
Vejam o que está acontecendo na Alemanha, o que aconteceu ontem à noite na Suécia. A Suécia, quem iria acreditar? Suécia. Eles receberam muitos. Estão tendo muitos problemas que jamais imaginaram — acusou Trump em defesa do seu decreto para impedir a entrada de refugiados e cidadãos de sete países muçulmanos nos EUA, que fora suspenso pela Justiça.
A grande mídia reportou o episódio como uma “gafe”,
uma “invenção” para justificar sua “agenda de intolerância” e assim por diante.
Foi mais um episódio para os telejornais e comentaristas ridicularizarem um até
então presidente “folclórico”, “grosso”, chegando mesmo a ter “problemas
mentais” como noticiado pela mídia de que “profissionais da saúde” demonstravam
“preocupação com a instabilidade” do presidente.
O fato é que quase dois meses depois o ataque
terrorista citado em uma suposta “gafe” de Trump ocorreu na Suécia.
A piada tornou-se realidade? Ou ocorreu um “erro de
agenda”, um lapso de um presidente que mantém comunicação permanente com os quadros
do SD (Sverigedemokraterna, partido de extrema direita sueco) na elaboração de
estratégias para criar pânico e xenofobia entre os suecos? – sobre isso clique aqui.
O fato é que o “ato falho” de Trump foi encoberto
pela grande mídia pelo tom geral de piada e galhofa – afinal a percepção da
“coincidência” pode criar a desconfiança que Trump inadvertidamente teve uma
falha na memorização do roteiro.
Trump e Darth Vader
Mas há ainda mais “coincidências”, ou melhor
dizendo, sincronismos envolvendo Donald Trump. No dia 06/04, horas antes do
lançamento de dezenas de mísseis dos EUA contra a Síria, Trump estava o avião
presidencial (o “Number One”) quando colocou a cabeça para fora da sala em que
estava e deu uma improvisada conferência para os jornalistas que estavam a
bordo.
Em uma pequena tela na divisória passava naquele
momento o filme Star Wars Rogue One. A pequena conferência de imprensa iniciou
com Trump falando enquanto, ao seu lado, víamos Darth Vader como fosse um
irônico comentário sobre as pretensões do presidente.
Mas havia uma sincronização ainda mais
interessante: naquele momento o horário do relógio digital abaixo da tela
marcava 2:11. Nos EUA “211” é um código policial para designar “roubo em
andamento”. Sem falar de um sincronismo histórico: 06 de abril foi a data
marcada pela entrada dos EUA na Primeira Guerra Mundial, declarando guerra aos
alemães e seus aliados austríacos.
As “coincidências” 2:11, 211 e “roubo em andamento”
dão no que pensar quando sabemos que desde a sua posse Trump vive em guerra
declarada contra a CNN e New York Times enfrentando todo o trabalho de oposição
da mídia, crescentes protestos de ativistas, além da ofensiva dos próprios
republicanos contra seus projetos e a união de procuradores-gerais de vários
Estados contra as medidas do presidente.
Uma situação que guarda alguns paralelos com os
apuros do presidente dos EUA no filme Mera Coincidência (Wag The Dog,
1995): sob um escândalo de assédio sexual, com ajuda de produtores de Hollywood,
inventa uma guerra contra terroristas albaneses para unificar a nação e desviar
a atenção da opinião pública e mídia.
No caso de Trump, a comoção internacional do ataque
com armas químicas contra civis na Síria (para complementar a “midiogenia” da
tragédia, foco nas crianças mortas) foi um oportuno acontecimento para o
presidente mobilizar a opinião pública interna contra um inimigo externo – o
vilão “ditador” Bashar al-Assad.
Da mesma forma, há 100 anos as atrocidades alemãs
na Bélgica impactaram o público norte-americano servindo de pretexto para a
entrada na Primeira Guerra Mundial, sob os interesses econômicos de banqueiros
como JP Morgan: se os Aliados perdessem a guerra não seriam capazes de pagar
suas dívidas com bancos e empresas dos EUA. Por isso fizeram intensa campanha
pela intervenção dos EUA na guerra.
Fotos de Donald Trump na mídia: acima, antes do ataque à Síria (entre folclórico e desequilibrado); abaixo, depois do ataque à Síria (entre estadista e humanitário). |
Guerra “cirúrgica” e Guerra Suja
“Roubo em andamento”? Apesar do absoluto non
sense da conta do ataque químico ser entregue a al-Assad (com armas que não
possui e ainda num momento politicamente favorável ao presidente da Síria com ampla
presença militar russa e a recente libertação da cidade de Aleppo dos
terroristas do Estado Islâmico) a grande mídia comprou a versão de Donald
Trump: lançar mísseis para impedir com o envenenamento de mais crianças
inocentes.
Pronto! O viés midiático em relação a Trump deu uma
guinada radical: de bufão e desequilibrado mental passou ao perfil de estadista
e humanista. Até suas fotos nas mídias (sempre em ângulos desfavoráveis,
caretas e gestos que se assemelhavam a de um Mussolini) alteraram o estilo para
a construção do perfil de um estadista com ar grave e ângulo de câmera debaixo
para cima – a construção semiótica da figura do poderoso, idealista e
visionário.
De todos os não-acontecimentos como false flags,
a utilização da armas químicas são as mais impactantes na opinião pública:
enquanto mísseis são encobertos por uma construção semiótica de precisão –
“guerra cirúrgica” e “guerra limpa” – a imagem das armas químicas têm a ver com
“guerra suja”: contaminação, queimaduras e toda uma metáfora viral à qual as
pessoas são mais impactadas. A própria figura do terrorista é construída nesse
campo semiótico do perigo químico, viral ou invisível.
Esses “espasmos da realidade” ou anomalias surgem aqui e ali mostrando o modus operandi do script desses “não-acontecimento. O DailyMail em janeiro de 2013 (veja acima) reportou o vazamento de e-mails entre a Defesa britânica e a Casa Branca com a aprovação de Washington para que forças rebeldes na Síria utilizassem armas químicas para a culpa ser jogada no regime de Assad.
Esses “espasmos da realidade” ou anomalias surgem aqui e ali mostrando o modus operandi do script desses “não-acontecimento. O DailyMail em janeiro de 2013 (veja acima) reportou o vazamento de e-mails entre a Defesa britânica e a Casa Branca com a aprovação de Washington para que forças rebeldes na Síria utilizassem armas químicas para a culpa ser jogada no regime de Assad.
Por que a Suécia?
Apesar do
lapso da antecipação de agenda de Trump em fevereiro o script vem se
desenrolado de maneira precisa: ataque de armas químicas; contra-ataque
norte-americano contra a Síria; e a resposta do terrorismo internacional em
Estocolmo.
Embora o programa do governo de integração de
refugiados na sociedade sueca seja bem sucedido, a partir de fevereiro foram
estreitados os contatos com os quadros do partido de extrema-direita SD.
Lançaram-se na missão de encontrar problemas no país europeu, para argumentar
que a recepção de refugiados aumenta a ameaça extremista.
Para o cientista político Tobias Etzold (do grupo
de pesquisa do Instituto Alemão de Assuntos Internacionais e de Segurança) em
entrevista à TV Deutsche Welle, após a “gafe” de Trump a direita sueca “lucrou”
com o foco da grande mídia voltando-se para a discussão sobre a “real situação” dos imigrantes no país
escandinavo.
Considerada uma “potencia humanitária” a Suécia
sofrerá com o ganho de força da extrema-direita após o atentado em Estocolmo.
Principalmente porque a descoberta do suposto autor do atentado (um uzbeque de
39 anos) tinha pedido um visto de residência permanente em 2014 e recusado em
junho do ano passado. Os serviços de imigração o procuravam por ter
desrespeitado a ordem de deportação.
Assim como nos atentados de Nice, Berlim e Londres,
como sempre esses não-acontecimentos possuem timing (imediatamente após a
ofensiva bélica de Trump), oportunismo (quem ganha?) e um alvo simbólico: o
modelo humanitário bem sucedido da Suécia (acolhimento residencial de
imigrantes, ao contrário dos campos de isolamento), o contraponto ao discurso
anti-terror e anti-imigração.
Essa escalada de atentados que se destinam muito
mais às mídias do que qualquer espécie de “guerra de civilizações” ou “choque
de culturas” que ameace o poder Ocidental segue um script bem definido –
impactar o contínuo midiático (opinião pública + formadores de opinião) com o
medo e o ódio.
Por isso, devemos ficar atentos aos “espasmos da
realidade” que sempre passam despercebidos por nós: sempre prestamos mais
atenção aos grandes não-acontecimentos, sem conseguirmos contextualizar e
antecipar os próximos passos.
Porém, os sincronismos estão aí, diariamente diante
dos nossos olhos.
Com informações do Twilight Language, DailyMail, Deutsche Welle,
Aangirfan, Uol, O Cafezinho
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