domingo, novembro 01, 2015

Em Observação: "Flowers" e "I Am a Ghost" - Espiritismo e Psicanálise no filme gnóstico



"Flowers" (2015) e "I Am a Ghost" (2012) são duas pequenas gemas da atual safra de filmes independentes que comprovam uma recorrência nos filmes desse início de século: narrativas sobre protagonistas presos em algum lugar entre a vida e a morte - a morte pode não ser um libertação, principalmente se você deixou essa existência sem fazer um acerto de contas com seus traumas e fantasmas. Filmes que fazem um surpreendente encontro entre Espiritismo e Psicanálise, merecendo estar "Em Observação" pelo Cinegnose. Além de serem filmes que comprovam a atual mudança de foco dos filmes gnósticos.




Título: Flowers (2015)
Diretor: Phil Stevens
Plot: Seis mulheres despertam em um espaço apertado sob as tábuas do assoalho da casa de seu assassino. Elas estão em uma espécie de limbo entre a vida e a morte. As mulheres terão que se arrastar e fazer o seu caminho através do sangue, vísceras e sujeira até chegarem ao interior da casa. Uma vez dentro, passarão por uma série de provações até saberem o que aconteceu com elas e como foram parar ali.

Título: I Am a Ghost (2012)
Diretor: H. P. Mendoza
Plot: Emily é um espírito perturbado que assombra sua própria casa perguntando-se por que não pode sair dali. Com a ajuda de uma clarividente contratada pelos atuais donos da casa para livrá-la de espíritos, Emily é forçada a participar de sessões mediúnicas que aos poucos se transformam em verdadeiras sessões de psicanalise para tentar descobrir mistérios perturbadores que levaram à sua morte. Dessa maneira Emily poderá passar para o “próximo lugar”.

Por que estão “Em Observação”? – Esse blogue “Cinegnose” vive procurando recorrências no cinema. E uma recorrência marcante nesse início de novo século é a de filmes sobre protagonistas presos em algum lugar entre a vida e a morte que são forçados  a buscar dentro de si mesmos as causas desse exílio espiritual. São um conjunto de filmes que parecem querer provar dois pontos: primeiro, morrer muitas vezes não quer dizer “partiu dessa para uma muito melhor” – a morte pode significar a perpetuação dos mesmos traumas e fantasmas que nos acompanharam por toda vida. E segundo: a possibilidade de uma gnose (iluminação espiritual) pós-morte.

Alguns filmes dessa recorrência: Os Outros (The Others, 2001), O Terceiro Olho (The Eye Inside, 2004), A Passagem (Stay, 2005), Um Olhar do Paraíso (The Lovely Bones, 2009) e agora os independente Flowers e I Am a Ghost - assista aos trailers abaixo.
"I Am a Ghost"
Além desses filmes representarem uma guinada na trajetória dos filmes gnósticos (até chegarmos em Matrix, os protagonistas eram prisioneiros em mundos virtuais criado por demiurgos tecnológicos) ao mostrarem protagonistas prisioneiros em mundos interiores criados por traumas e memórias, essa recorrência fílmica mostra uma surpreendente aproximação entre Espiritismo e Psicanálise.

E a casa com suas divisões em cômodos, sótão etc., como uma espécie de cartografia da mente dos espíritos prisioneiros – o sótão como o inconsciente, o quarto como a cena do trauma e assim por diante. Isso parece estar mais evidente em I Am a Ghost que será tema de uma postagem específica do “Cinegnose” ainda nessa semana.

No caso de Flowers, o que impressiona nesse filme é que não há diálogos: o filme é uma série de vinhetas focando cada uma das mulheres mortas em seus primeiros momentos após o despertar naquele limbo fétido e horripilante. Acompanhamos a trajetórias das seis mulheres (as “flores” do título) ao som de uma música ambiente etérea e atmosférica.
"Flowers"
Por isso, a proposta de Flowers parece a de criar uma experiência estética e sensorial com o espectador. Toda a emoção dos personagens é expressada pelo corpo – suas expressões, movimentos e posturas expressam sentimentos interiores e a forma como eles explorarão o ambiente acabará por revelar o motivos das suas próprias mortes.

Flowers parece partilhar de uma linha anti-realista no cinema do qual fizeram parte o russo Eisentein, Buñuel (o cinema surrealista), Abel Gance (o cinema impressionista francês) e o próprio Chaplin que acreditavam numa vocação abstrata do cinema: o cinema deveria ser menos um veículo narrativo e muito mais um espaço para experiências sensoriais, metafísicas e estéticas do espectador.

E o que também impressiona: são filmes de baixíssimo orçamento – Flowers feito com vísceras de animais reais e muitos truques ilusionistas de edição e montagem; e I Am a Ghost onde com apenas dez mil dólares fez um primoroso cruzamento entre o filme Os Outros com Nicole Kidman com a atmosfera assustadora dos corredores do hotel do filme O Iluminado de Kubrick.

O Que Esperar? – A crítica vem apontando para esses dois filmes como um sopro de renovação no gênero do horror: experimentais, mas ao mesmo tempo acessível ao gosto daqueles que procuram o horror extremo. Flowers e I Am a Ghost são pequenas gemas escondidas na atual enxurrada de produções independente nos EUA que gravitam em torno dos blockbusters hollywoodianos.

I Am a Ghost já possui releases na Internet e será objeto de análise específica do “Cinegnose” nessa semana. Quanto a Flowers, esse humilde blogueiro aguarda um release para uma análise mais detalhada. 



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