quinta-feira, julho 04, 2024

Dez anos do 7 a 1 da Alemanha: uma goleada geopolítica


Nesse dia 08 de julho chegamos aos dez anos do chamado “Massacre de Belo Horizonte” ou simplesmente “Mineiraço”: a humilhante goleada de 7 a 1 da Alemanha sobre o Brasil na semifinal da Copa do Mundo de futebol de 2014. Uma anomalia em um esporte marcado por baixas contagens, principalmente em semifinais com equipes de forças equivalentes. Tão anômalo que mereceu uma análise exclusiva sobre a performance do jogador David Luiz, feita pelo New York Times. O fato é que num espaço de 48 horas após a goleada, a mídia internacional especializada foi dominada pela ideia de que o resultado da semifinal foi muito mais do que um evento esportivo: foi uma goleada geopolítica. Por que a mídia internacional politizou tão rapidamente um evento esportivo? O “Mineiraço” simplesmente aconteceu como um evento lógico e conveniente dentro da escalada de eventos que se iniciou nas Jornadas de Junho. O pontapé inicial do jogo da guerra híbrida que transformaria o 7 a 1 numa goleada geopolítica. 

Tudo começou na abertura da Copa de 2014, no “Itaquerão”, em São Paulo. Brasil versus Croácia. Os jogadores brasileiros entraram em campo enfileirados, cada um com o braço estendido e a mão apoiada no ombro do jogador da frente. Todos com fisionomias nada leves ou alegres. Rostos estranhamente tensos. E o enquadramento da câmera de TV da Globo em big close-up só acentuava essa estranha dramaticidade para um jogo de abertura de Copa do Mundo.

Jogadores da seleção cantaram o hino quase gritando. E alguns como Júlio César, David Luiz e Thiago Silva chegaram a chorar enquanto entoavam os versos do hino. E de setores da torcida (principalmente daqueles com os ingressos mais caro) ofensas à presidenta Dilma: “Ei, Dilma! Vai tomar no c*!”.

E essa performance vocal só se acentuaria nos jogos subsequentes.

Certamente esse cenário de tensão e dramaticidade era um eco das chamadas Jornadas de Junho do ano anterior, as manifestações de rua do “Não Vai Ter Copa” e a escalada do jornalismo de guerra que até aquele momento vivia a dualidade entre faturar com o evento esportivo e ao mesmo tempo apoiar os manifestos contra a Copa e o governo petista.

Esse humilde blogueiro pensou diante dessas imagens na TV: “isso não vai acabar bem...”. E não acabou mesmo: terminou no “mineiraço” do 7 a 1 da Alemanha no Brasil e a despedida melancólica ao ser despachada pela Holanda por 3 a 0. 

Em postagem anterior qualificávamos o “Massacre de Belo Horizonte” como uma “goleada geopolítica”, como está contido na críptica afirmação de Tim Vickary, um jornalista inglês free-lancer e correspondente da BBC Sports, logo depois da catástrofe futebolística brasileira: “uma oportunidade para que o Brasil possa recuperar sua identidade histórica e reconstruí-la num contexto moderno, global” – “Brazil must learn lessons from Germany humiliation”, BBC News, 2014 – clique aqui.  

Estranha análise para um jornalista esportivo, como se o resultado da partida fosse revestido de um simbolismo que transcenderia a mera arena futebolística.

A fala de Vickary parecia mais um wishfull thinking de que a goleada serviria para o país mudar a sua orientação geopolítica, até aquele momento francamente anti-EUA: junto com a Venezuela e Argentina o País matara o projeto da ALCA – projeto globalista de fazer crescer uma versão americana da União Europeia.

Além do insulto do Brasil se alinhar à Vladimir Putin no bloco comercial dos BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Também condenar o tratamento dado aos palestinos por Israel e a recusa em impor sanções comerciais ao Irã.



Ressaca política

Aliás, 24 horas depois da humilhação brasileira, pipocou na mídia internacional a tese de como um evento esportivo ganhou um imediato significado político. A BBC focou em Dilma Rousseff em um ano eleitoral – clique aqui.

O think tank “Foreign Policy” falava em “Ressaca política da derrota na Copa do Mundo do Brasil”:

Os políticos do Brasil já estão enfrentando as consequências da derrota devastadora da seleção nacional nas mãos da Alemanha em 8 de julho. O fato de alguns fãs brasileiros terem decidido reagir com violência, talvez, seja uma pequena surpresa. No dia seguinte à histórica derrota do Brasil por 7-1 para os alemães, os manifestantes queimaram mais de 20 ônibus em São Paulo, o centro econômico do país. Em Belo Horizonte, a cidade que sediou a partida, uma reunião de milhares de pessoas ficou desagradável quando os manifestantes incendiaram uma bandeira brasileira e outros jogaram pedras na polícia – clique aqui.

O grupo de mídia norte-americana Vox emplacava uma manchete com suposição apocalíptica: “A perda épica do Brasil na Copa do Mundo poderia custar o emprego de sua presidente?”:

Raramente um time foi tão espancado quanto o Brasil estava na semifinal da Copa do Mundo de terça-feira contra a Alemanha. No entanto, a pessoa que tem que se sentir pior sobre a perda não estava em campo: a presidente do Brasil, Dilma Rousseff. Porque, por mais louco que pareça, há uma chance real de que os eleitores brasileiros punam Rousseff pela derrota épica do Brasil nas eleições de outubro do país. – clique aqui.

Outro think tank, o “Open Democracy” falava em “conclusões políticas da Copa do Mundo” fazendo analogias da seleção nacional e o governo de Dilma Rousseff:

Os ministérios brasileiros podem ser frutiferamente comparados aos jogadores brasileiros (apesar do fato de serem quase quatro vezes mais numerosos do que um time de futebol), já que cada um deles joga seu próprio jogo e raramente trabalha com outro - eles são quase rivais, dependendo do patrocinador do partido político. Acrescente a isso que o treinador principal do governo também não está disposto ou incapaz de identificar os problemas da equipe, ou de desenvolver táticas sólidas, e tem se esquivado da necessidade de implementar planos e reformas abrangentes – clique aqui.


Era necessária uma derrota humilhante

Pela rapidez como os teclados funcionaram horas depois do “mineiraço”, parecia até que a mídia internacional contava com um colapso catastrófico da seleção brasileira. 

O que salta aos olhos em tudo isso é a certeza de que não bastaria apenas uma simples desclassificação em um jogo duro em uma semifinal. Afinal, derrotas acontecem em qualquer jogo. Não! Foi necessária uma derrota humilhante, um massacre, para: 

(a) justificar o aperto do gatilho das análises midiáticas que criaram uma simbologia política em um evento esportivo;

(b) atingir em cheio a autoestima de uma opinião pública que já estava diariamente sendo açodada pelo jornalismo de guerra da grande mídia. Jornalismo que cada vez mais dava visibilidade ao discurso de ódio do extremismo de direita – veja, por exemplo, a forma como foi naturalizado o “vai tomar no c*” contra Dilma Rousseff na abertura da Copa: “poucos segundos”, “vaias e xingamentos abafados pela música do estádio”, “qualquer político está sujeito a isso em um evento público” e assim por diante.

Dúvidas justificáveis

Por isso, não é por menos que saltaram as dúvidas justificáveis em uma goleada (5 a 0 em 18 minutos) totalmente incomum em um esporte que, por natureza, é marcado pela baixa pontuação (0-0, 1-0, 2-1 etc.), principalmente em jogos decisivos envolvendo forças futebolísticas equivalentes. 

Além disso, até aquele momento no histórico das copas do mundo, a defesa brasileira havia sofrido 89 gols em 97 jogos, uma média de menos de um gol por jogo. E em apenas um jogo, numa semifinal onde tradicionalmente forças equivalentes se enfrentam, a seleção tomou sete gols. 

O jogo foi tão anômalo que a performance do jogador David Luiz ganhou uma análise exclusiva feita por Stuart James no New York Times: “Quão ruim foi David Luiz na vitória da Alemanha por 7-1 contra o Brasil na Copa do Mundo de 2014?” – clique aqui.



“Com a bola, foi um desempenho curioso para dizer o mínimo - um pouco como assistir Jordan Pickford jogando como zagueiro pelo Brasil, enquanto David Luiz chutou a bola o mais longe que podia repetidamente”, destacou o jornalista. Para ele, David Luiz estava em todas as partes do campo, menos onde deveria estar – em dois gols foi diretamente responsável. Um desempenho errante, que consistia em correrias e chutões sistemáticos que sempre terminavam nas mãos do goleiro Manuel Neuer, da Alemanha. 

Na época, de toda a massa de teorias conspiratórias e vídeos que comprovariam uma suposta manipulação de resultado, um chamou a atenção desse Cinegnose: o vídeo isola apenas as ações dos jogadores alemães envolvidos nos lances dos gols – 5 X 0 em 18 minutos. Observa-se que os alemães avançam e chutam sem fazer qualquer manobra evasiva, dribles ou esforços nas jogadas que resultaram em gols - veja vídeo abaixo.



Nos demais vídeos vemos defensores brasileiros que sequer tentam obstruir os lances – por exemplo, David Luiz vaga na área como zumbi e sequer tenta obstruir o homem atribuído a marcar; Marcelo literalmente fica plantado dentro do gol no primeiro tento alemão; o goleiro Júlio César parece sempre fora do lugar, fazendo mergulhos teatrais após a bola ter entrado e assim por diante.

Por isso este humilde blogueiro prefere falar em “dúvidas justificáveis” ao invés de “teorias da conspiração” em torno do 7 a 1 da Alemanha. O “Mineiraço” simplesmente aconteceu como um evento lógico e conveniente dentro da escalada de eventos que se iniciou nas Jornadas de Junho. O pontapé inicial do jogo da guerra híbrida que transformaria o 7 a 1 numa goleada geopolítica.

E as respostas imediatas da grande mídia internacional num espaço de 24 a 48 horas após a goleada, revestindo um evento esportivo em simbolismo político, acaba tão somente por alimentar as dúvidas justificáveis desse humilde blogueiro ao longo desses dez anos.

 

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