O curta dessa semana é de um autor já discutido por esse blogue: o
irlandês Ruairi Robinson. Indicado ao Oscar de melhor curta metragem de
animação em 2002, "Fifty Percent Grey" mostra uma curiosa representação da
existência pós-morte bem diferente daquela que o cinema passou a fazer depois
de “Amor Além da Vida” (1998). Ao invés de encontrarmos grandes revelações para
os mistérios da existência, após a morte poderíamos encontrar ciladas tão
cruéis como na vida. Ao contrário da simplicidade do preto e branco, podemos
encontrar a complexidade dos tons de cinza. Curta sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende.
Conhecido por seus
curtas de ficção científica e animações 3D, em 2002 o irlandês Ruairi Robinson
mereceu uma indicação ao Oscar de melhor Curta metragem de animação com o Fifty Percent Grey - assista ao vídeo abaixo.
Robinson já é
conhecido aqui no Cinegnose pelo seu curta de 2014 Blinky onde nos mostra
como pode ser perigosa a combinação da frieza dos códigos de uma máquina e a
nossa relação mágica com os gadgets tecnológicos – no caso, um robô doméstico
dublê de babá e cozinheiro – sobre o curta clique aqui.
Em Fifty Percent
Grey vemos uma tragicômica representação da vida após a morte. Um soldado acorda sozinho em uma paisagem vazia e silenciosa.
Percebemos que ele está ferido pelas gostas de sangue que caem de seu abdômen.
Mas imediatamente a ferida é cicatrizada. Vê adiante uma TV de tela plana com
um vídeo de boas vindas: “Parabéns, você está morto... bem vindo ao Paraíso.
Terá toda a eternidade para desfrutar da paz, tranquilidade e os mistérios do
universo...”. O vídeo mostra imagens com paisagens paradisíacas.
O soldado olha ao
redor, mas não há nada para ser visto. Ele caminha pela planície vazia e não
encontra nada até, depois de algum tempo, encontrar o mesmo aparelho de TV.
Parece ter andado em ciclos em um lugar sem saída. Desesperado, dá um tiro em
sua própria cabeça, como fosse possível se matar depois de morto.
O militar desperta
novamente e o furo na cabeça rapidamente se cicatriza. E ele se depara com
outro aparelho de TV com outro vídeo: “Parabéns, você está morto... bem vindo
ao PURGATÓRIO... Você está aqui porque fez algo de errado e tem que esperar
para ser julgado...”. E novamente o soldado tenta um suicídio. E assim por
diante.
Desde o filme
“Amor Além da Vida” (1998), as representações do pós-morte no cinema passou a
ser mais “plástica” ou solipsista: os “céus” são criados por projeções
psicológicas dos personagens a partir dos seus sonhos, desejos ou mesmo
pesadelos. Isso acaba criando mundos além da vida maniqueístas – céu e inferno,
bom e mau etc – sobre isso clique aqui.
Ao contrário, o curta
de Ruaiari Robinson nos mostra que lá do outro lado talvez não encontremos respostas
simples e esquemáticas para as questões que formulamos aqui na vida. Ou talvez descobriremos
que fizemos sempre as perguntas erradas.
A vida pode criar
ciladas cruéis para todos nós. Por isso, sempre esperamos que após a morte tudo
seja elucidado, os mistérios sejam explicados e a existência torne-se simples
como o preto no branco. Mas, como sugere o curta Fifty Percent Grey, talvez
depois da morte encontremos mais tons de cinza do que poderíamos imaginar.
E como não poderia
deixar de ser, Robinson dá um sabor gnóstico ao curta ao mostrar que não há
redenção ou escapatória na morte, pelo menos não nesse cosmos. Tanto aqui como
lá continuamos prisioneiros em uma vasta planície cinza. Mas a TV sempre nos
mostrará imagens coloridas para nos consolar.
Ficha Técnica |
Título: Fifty
Percent Grey
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Diretor: Ruairi Robinson
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Roteiro: Ruairi Robinson
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Produção: Zanita Films
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Distribuição: AtomFilms
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Ano: 2001
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País: Irlanda
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