Um fábrica de automóveis em Detroit, totalmente automatizada, é
controlada por uma Inteligência Artificial chamada ANA, cujo software também
está presente nos setores mais importantes do mundo como recursos médicos,
alimentos e bancos. Mas ANA parece ter outros planos, além do que fazer tarefas
repetitivas – não quer mais produzir mais carros, mas alguma outra coisa que
pretende liberar naquela fábrica em Detroit para o mundo. E o único operador
humano responsável pela produção será traído por ANA. Esse é o curta “ANA”
(2015) do estúdio inglês Factory Fifteen, especializado em produzir filmes
distópicos nos quais explora uma versão particular do conceito de
“singularidade” – algum momento no futuro a supercomputadores produzirão o
acidente terminal: o momento no qual a máquina trairá o próprio criador.
Pouco tempo
depois que o estúdio inglês Factory Fifteen ( um estúdio especializado em
imaginar futuros distópicos através de filmes e animações) lançar o curta Ana
(2015), aconteceu no início desse ano o primeiro acidente automobilístico fatal
envolvendo um carro com sistema de piloto automático, na Florida: um Tesla
Model S se chocou com um caminhão – o veículo era de cor branca, fazendo o
computador confundi-lo com o céu de um dia ensolarado – clique aqui.
O curta
A história do
curta se passa em uma fábrica de automóveis em Detroit totalmente automatizada
e controlada por apenas um homem chamado Jim. Diante do painel de controle em
mais um dia de trabalho repetitivo, Jim lê em seu tablete notícias de má função
de uma rede nacional de computadores que está causando problemas para a
American Airlines. Imediatamente, o sistema robótico de inteligência artificial
da fábrica, chamado ANA, também informa uma má função na linha de produção.
Ignorando os
protocolos de segurança, Jim dá controle total à super-inteligência artificial
ANA. Quando tenta desfazer o erro, os robôs dentro da fábrica reagem para
impedi-lo. Parece que Ana não quer mais produzir carros, mas outras coisas que
ela pretende liberar para fora dos limites daquela fábrica.
Para piorar, ANA
é uma IA que está embutido nos setores de fabricação mais importantes do mundo,
incluindo recursos médicos e alimentos. Parece ser o início de um apocalipse
robótico.
A Factory
Fifteen foi criada em 2011 por Paul Nichols, Jonathan Gales e Kibwe Tavares. O
trio vem produzindo uma série de filmes que investiga o futuro através da
arquitetura, incluindo visões de uma por
uma cidade controlada por um supercomputador e cenários pós-nuclear onde
pesquisadores tentam livrar o mundo da contaminação radioativa.
Singularidade e tecnognosticismo
A narrativa de ANA
foi baseada no conceito de “singularidade tecnológica” – um futuro no qual a humanidade
viverá um salto qualitativo tecnológico em um curtíssimo espaço de tempo,
quando a inteligência artificial terá superado a inteligência humana, alterando
radicalmente a civilização e o próprio conceito de natureza humana.
Cientistas como
Vernor Vinge (criador do conceito) e Raymond Kurzweil que a singularidade será
um evento semelhante ao surgimento da inteligência humana na Terra. Acreditam que o surgimento iminente de
supercomputadores dotados de inteligência seriam a base de tais avanços –
somente uma inteligência superior à humana poderia fazer avanços científicos e
tecnológicos tão rápidos.
Esse tema é
recorrente no cinema recente com o tema do pós-humano em filmes como Eva (2011), The Machine (2013), Lucy (2014), Transcendence (2014) e Ex-Machina (2015), cujo tema do
pós-humano acaba se fundindo com o tecnognosticismo – a crença em uma fusão
entre as redes neuronais e redes de computadores através do qual o Eu faria um
upload final para a memória de um supercomputador, superando as contingências
humanas (corporalidade, finitude etc.) e alcançando a imortalidade no divino
céu da informação.
O acidente da singularidade
Mas a versão da
singularidade do curta ANA (na verdade um teaser para um longa a
ser produzido em conjunto com a Raw TV) é sinistra: ANA é uma IA que sustenta
cada serviço da vida cotidiana – instalações industriais, bancos, alimentos e
indústria farmacêutica. Tudo automatizado no qual o homem deixou para uma ANA o
controle do pito automático.
Se o filósofo e
urbanista Paul Vilirio estiver certo de que a história da tecnologia é a
história da criação de acidentes (o acidente automobilístico, o descarrilamento
do trem, o acidente aéreo até chegar à explosão nuclear e a contaminação radioativa),
a singularidade poderia ser o acidente terminal da espécie humana – assim como
no curta, o momento no qual a máquina trairá o seu próprio criador.
Sistemas
automatizados por algoritmos já estão presentes não só nos pilotos automáticos
de carros como o Tesla ou aquele do Google. Sistemas de algoritmos de alta
frequência no sistema financeiro (Negociações de Alta Frequência – NAF) emitem
automaticamente ordens de compras e vendas de ações em frações de segundos.
Exploram as pequenas oscilações de um ou vários ativos, às vezes em
milisegundos. O computador executa e
toma decisões de uma maneira mais rápida do que uma pessoa faria.
Mas esse sistema
está exposto a acidentes onde algoritmos parecem se voltar contra os próprios
investidores, produzindo perdas dramáticas. Como, por exemplo, perdas de US$
440 milhões pela Knight Group, empresa americana do mercado financeiro.
Quanto mais o
sistema financeiro se torna cada vez mais complexo (70% a 80% dos mercados são
controlados pelo NAF) mais expostos ficam a um hipotético crash cibernético.
Quanto mais alta
for a velocidade e volatilidade maior a probabilidades de acidente, como o
Flash Crash ocorrido em 2010 quando inesperadamente diversos NAF se retiraram
simultaneamente do mercado, produzindo um princípio de pânico.
Será que um dia
os algoritmos chegarão à singularidade fatal, voltando-se contra nós?