Desde o primeiro dia, toda semana, incansavelmente, o governo Bolsonaro e o PMiG (Partido Militar Golpista) inventam uma crise. Uma operação psicológica chamada “guerra criptografada de Informações” com um objetivo geral de “aloprar” o cenário político do momento, aproveitando-se da perigosa ingenuidade dos jornalistas e do fígado sempre reativo da esquerda. Apagar as digitais do PMiG e ocultar os fundamentos neoliberais do governo são algumas das metas dessa psyOp. Depois que a guerra na Ucrânia perdeu a audiência na grande mídia, o PMiG voltou com tudo: crise na Petrobrás e no ministério da Educação. E, nessa semana, a compra milionária de viagra e próteses penianas para a caserna. Em todo esse embaralhamento de informações, está passando despercebido o porquê do súbito interesse “cívico” do TSE no primeiro título de eleitor do jovem – a natureza do voto dessa faixa etária será um prato cheio para o ardil semiótico alt-right.
O governo Bolsonaro chega ao último ano e parece que tanto a esquerda, quanto a oportuna ingenuidade dos jornalistas da grande mídia, ainda não conseguiu entender o modus operandi da guerra criptografada alt-right do PMiG – o Partido Militar Golpista.
Por exemplo, foi curioso acompanhar a “bugada” na cabeça da “colonista” Natuza Nery, da Globo News, diante da confusa indicação do empresário Adriano Pires para a presidência da Petrobrás – seu nome não passou no teste de governança da estatal pelo evidente conflito de interesses que representou a indicação. A leitura que os “colonistas” corporativos da imprensa fazeram era que, em ano eleitoral, Bolsonaro estava tirando o general Silva e Luna da presidência da estatal para intervir na política de preços dos combustíveis – o Preço de Paridade de Importação (PPI).
Porém, indicou não só um nome “técnico” francamente favorável à manutenção da PPI, como também uma das principais informações de pauta da grande mídia. Ora, por que o chefe do executivo trocou seis por meia dúzia? Por que o presidente deu tantas voltas, “indignado” pelos os aumentos dos combustíveis, para terminar no mesmo lugar? Natuza Nery não conseguia entender, e admitiu ao vivo... e voltou ao seu estoico esforço hermenêutico diário para “apurar” fontes e documentos.
Enquanto o outro colonista, Fernando Gabeira”, dizia não conseguir entender como um “técnico” como Adriano Pires não conhecia as regras de conformidade (compliance) aprovada pelo Congresso na esteira do escândalo do chamado “Petrolão”. Por que, desde o início, Pires não recusou a indicação?
Sempre o objetivo geral de uma guerra criptografada é aloprar o cenário político com informações caóticas, desencontradas, cujas relações de causalidade sempre são aparentemente irracionais.
O ardil do não-acontecimento da suposta interferência de Bolsonaro no PPI (e o cenário de “crise” para os analistas do mercado) foi revelado ao final pela declaração do Presidente da Câmara, Arthur Lira: “Ela [Petrobras] é uma empresa estatal. Se ela não tem nenhum benefício para o Estado nem para o povo brasileiro, que vive reclamando todo dia do preço dos combustíveis, que seja privatizada e que a gente trate isso com a seriedade necessária”.
Essa foi a moral da estória: deliberadamente criar mais um quadro caótico envolvendo a estatal para, subliminarmente, normalizar na opinião pública a agenda da privatização – até mais do que privatização: livrar-se daquilo que atrapalha o nosso cotidiano.
Vazamento e “Agrojornalismo”
Nesse modus operandi destacam-se as duas estratégias para criptografar as informações: o vazamento e o “agrojornalismo”, plantar notas em colunistas do jornalismo corporativo, verdadeiras correias de transmissão do processo – por isso, são “colonistas”.
É o exemplo do vazamento de um áudio para o jornal Folha de São Paulo, atribuído ao ministro da Educação, Milton Ribeiro, em que comprovaria a aprovação de verbas para prefeituras cuja negociação foi mediada por pastores evangélicos. Na verdade, um segredo de polichinelo: desde que o pastor presbiteriano Milton Ribeiro assumiu o MEC, tudo isso era evidente.
Quem ganha com um vazamento de informações? Essa é a pergunta que nunca é feita por jornalistas, convertidos em meras caixas de ressonância. Outra “crise”, dessa vez para negativar a percepção da educação pública para o distinto público. Crise na educação e na estatal do petróleo. Educação e energia, nas mesmas semanas não-acontecimentos destinados a desgastar na percepção pública duas áreas que envolvem soberania nacional.
A fala do homem mais rico do Brasil, o dono da Ambev, Paulo Lemann, revela bem o tipo de educação que se pretende para o País pela agenda neoliberal, facilitada por essas crises criptografadas: "A principal coisa que estou tentando é melhorar a educação em termos de tornar as pessoas capazes de participar da economia das startups ou mesmo ser competitivos no mundo" – clique aqui.
Além dos vazamentos, o “agrojornalismo”. Como, por exemplo, a “plantação” de informação para a “colonista” Bela Megale, de O Globo, dando conta de que as Forças Armadas aprovaram a compra de 35 mil unidades de Sildenafila, medicamento da composição do Viagra, utilizado para tratar disfunção erétil. Dado que está disponível no Portal da Transparência do Governo. A plantação perfeita: com informação disponível para o jornalista “apurar”.
Não satisfeito, surge imediatamente uma nova plantação, dessa vez na coluna de Guilherme Amado, do site Metrópoles: as Forças Armadas também compraram 60 próteses penianas infláveis no valor estratosférico total de 3,5 milhões de reais.
O curioso é que esses dados são públicos, estão lá no Portal da Transparência, colocado pelas próprias Forças Armadas. Evidentemente há um ardil nisso. Ora, viagra e próteses penianas milionárias são matéria-prima perfeita para memes, trocadilhos e piadas de toda a sorte. A piada pronta!
E a grande mídia avalia da seguinte maneira: mais uma vez, Bolsonaro, o golpista, está achincalhando a integridade moral das Forças Armadas...
Desde o primeiro dia da verdadeira ocupação militar do Estado que representou o governo Bolsonaro, não passa uma semana sem que seja criada algum tipo de “crise” que envolva ou o chefe do executivo em pessoa ou algum ministro ou declaração de algum general que esteja ocupando a Casa Civil, Segurança Institucional etc.
Do escândalo do “golden shower” no carnaval do primeiro ano de governo, passando pelas provocações nas redes sociais entre o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e Bolsonaro, até chegar à verdadeira “Operação Sete de Setembro”, no ano passado, sob a ameaça de Brasília ficar sitiada num golpe de Estado em plena madrugada...
“Caneladas” do vice Mourão no presidente, vazamentos que provocam crises em ministérios e inquéritos e investigações semanais dos filhos de Bolsonaro (feitas pela... Polícia Federal sob rédea curta do presidente), são lances rotineiros dessa guerra criptografada de informação que almeja aloprar o cenário político com cinco objetivos:
(a) Simular um suposto isolamento político de Bolsonaro, como se tudo o que fizesse ou dissesse não passasse de imposturas de um golpista ressentido contra as própria Forças Armadas, desde que foi expulso do Exército, há 35 anos, por ter planejado um atentado a bomba em quartéis do Rio de Janeiro pela “situação crítica no que se refere aos vencimentos” – como assinou em artigo da Veja em 1986;
(b) Com essa simulação de impostura, apagar as digitais do PMiG nessa verdadeira conquista militar da máquina do Estado;
(c) Apelar para o fígado da esquerda: fazê-la sempre reagir indignada para deixá-la sempre à reboque reativamente à pauta imposta pelo PMiG. E, convenhamos, a piada pronta da demanda da caserna por viagra e próteses penianas infláveis é a isca perfeita para a esquerda se esbaldar nas redes sociais...
(d) Afastar o debate público do campo da economia política. “Há corrupção no governo Bolsonaro!”, grita histericamente a esquerda e oposições. Sempre a pauta da corrupção, discurso moralizante que protege o PMiG do seu calcanhar de aquiles: os fundamentos econômicos neoliberais, pacto das Forças Armadas com o Consenso de Washington. E ainda tudo melhora quando a grande mídia toma a crise da pandemia global ou a guerra na Ucrânia como álibis para justificar o desastre sócio-econômico.
(e) E... que as instituições, afinal, estão funcionando: Congresso faz CPIs, PF interroga etc.
Bora Votar!
Mas o que espanta é que em meio a tudo isso, é que o TSE (tutelado pelo PMiG), através da sua Secretaria de Comunicação, lançou uma massiva campanha nas emissoras de rádio, TV e Internet em todo o País para estimular jovens que completam 16 anos a tirar o seu título eleitoral. “Bora Votar!”, exorta a campanha.
Diz a campanha que “o objetivo da ação é estimular o interesse dessa faixa etária em participar da vida política e conscientizá-los sobre o potencial que o voto tem de mudar a realidade do país. A campanha transmite a mensagem de que o Brasil pertence a toda a população brasileira e que os jovens podem fazer a diferença por meio do voto.
Uma campanha massiva que nem a vacinação contra a Covid-19 mereceu tamanha energia e dinheiro! Por que, de repente, esse súbito interesse cívico no voto do jovem?
O álibi é estatístico: para o TSE, preocupada com o enfrentamento à desinformação, o número de adolescentes de 16 e 17 anos que solicitaram o primeiro título de eleitor caiu 82% em uma década.
Mas, como diria o psicanalista Lacan, a verdade sempre está numa outra cena. Mais precisamente, em outros números. Desta vez, da pesquisa do Datafolha que estudou o perfil dessa faixa que representa 17% do eleitorado.
A pesquisa mostrou que a polarização política nessa faixa é maior do que a da média do eleitorado – 73% dos jovens contra 69% da média do eleitorado.
Enquanto essa faixa é ainda a mais incerta em relação ao voto (50% contra 67% da média do eleitorado). E quanto a possibilidade de mudar a intenção do voto, é igualmente mais alta do que a média do eleitorado – 50% contra 32%.
Em síntese, o voto jovem é se caracteriza muito mais pela rejeição do que pela opinião. Portanto, não é por menos que o PMiG está tão civicamente interessado no voto jovem: polarização, indecisão e decisão política por rejeição é a matéria-prima das estratégias comunicacionais alt-right.
Numa eleição que promete ser a mais apertada da história eleitoral brasileira (com o núcleo duro do bolsonarismo entre 25 e 30% garantindo um segundo turno), esses 17% do eleitorado serão o grande alvo dos conhecidos (e os inéditos que ainda surgirão) ardis da conhecida guerra semiótica da direita alternativa.