quinta-feira, abril 09, 2020

Coronavírus: o sistema operacional que roda em Brasília e a reengenharia social


O leitor deste Cinegnose deve lembrar do filme “Ela” (Her, 2013) no qual um homem triste e solitário se apaixona pela voz de uma Inteligência Artificial, sem prestar atenção no sistema operacional que roda por trás da interface da tela. A situação desse protagonista é análoga ao atual cenário político e opinião pública sequestrados pela sofisticada guerra criptografada que pula na interface como ícones em uma tela: Bolsonaro X Mandetta, Negacionistas X Ciência, Weintraub X China, Bonsonaro X General Braga Neto, Bolsonaro X governadores, e assim “ad infinitum” numa espiral de simulações de polarização. De repente, por contraste, Mandetta, Doria e Witzel surgem como faróis da Razão e da Ciência. Quando, há não muito tempo, desmontavam o SUS, atiravam em “cabecinhas” e mandavam a polícia atirar em bailes funks. Todos hipnotizados por uma interface criptografada, enquanto por trás roda um sistema operacional (SO) com atores em piloto automático, criando dissonâncias, conflitos e “golpes brancos” para excitar o distinto público. Atores que se promovem mutuamente, enquanto o SO, oculto pela criptografia roda a sua agenda secreta da Operação Pandemia global: com recursos públicos injetar liquidez no cassino financeiro, reciclar figuras da extrema-direita para um futuro cenário pós-polarização, com Bolsonaro impedido e PT com registro cassado e... monitorar celulares dentro de uma nova reengenharia social. 

Perdidas na noite do tempo, estão algumas lembranças das eleições presidenciais de 1989. Entre elas a do candidato do PSDB, Mário Covas. 
Às vésperas do segundo turno, Brizola fez uma proposta ousada para Lula: os dois abririam mão das suas candidaturas para Covas disputar com Collor o segundo turno pois teria maior chance de derrota-lo. Ao contrário dos dois, Covas agregaria mais votos, pois não disputaria um duelo de “rejeições”.
Mas os analistas da grande mídia não pensavam assim. Por exemplo: para a Folha de São Paulo, ao contrário, Covas era o mais fraco pois sua estratégia (e personalidade) era incapaz de “produzir acontecimentos”, logo, notícias que pudessem ser repercutidas pelas mídias. Uma opinião “midiacêntrica” própria da Folha, numa época em que vivia o auge da sua modernização editorial chamada “Projeto Folha”, e se via como o centro do mundo.
Passaram para o segundo turno Lula e Collor... e o resto da história, todo mundo sabe.
Onze anos depois, pareceu que Mário Covas tinha aprendido essa lição. Cercado no prédio da Secretaria da Educação no Centro de SP, por uma massa de professores e manifestantes, o então Governador Mário Covas não quis saber: forçou a saída do prédio num rompante, para ser agredido e ficar com um galo na cabeça, sujo de terra e a boca sangrando... ganhou as lentes das câmeras e criou um desgaste importante na imagem do movimento do professorado. 
O acontecimento rendeu uma repercussão midiática ainda maior quando se lembrou que Covas vinha de uma recente cirurgia para retirar um tumor cancerígeno...
 Hoje, todo o espectro político está refém não de uma simples estratégia de criação de factoides ou pseudoeventos para conseguir repercussão nas páginas e telas da imprensa.



Mas de uma sofisticada estratégia de guerra criptografada com múltiplas camadas, tornando o cenário político atual cada vez mais opaco e, por isso mesmo, hipnotizante. Principalmente para as classes médias, confinadas diante das telas da TV e celulares, acompanhando tudo como uma partida de ping-pong em plena crise da pandemia do coronavírus.

Reis do Ringue...

“Telecatch”

A oposição pede e protocola o impeachment de Bolsonaro. Ato contínuo, o Ministério Público dá parecer favorável a processo que pede cassação do registro do PT ... Presidente discute com os governadores Doria e Witzel... Bolsonaro quer queimar o ministro da saúde Mandetta. Mais do que isso! Está tramando sua demissão: Ciúme? Cálculo político? Já está pensando em 2022?
Quando mais o isolamento social se estende e as pessoas estão hipnotizadas nas suas telas, mais se estende o “telecatch” (a ramificação de diversos conflitos artificiais para entreter o respeitável público afastado dos seus trabalhos e presos nas suas residências – conceito deliciosamente irônico do blog “Duplo Expresso”): negacionistas versus cientistas, presidente versus Ciência, Militares versus Mandetta contra Bolsonaro, o “Rasputin” Olavo de Carvalho latindo e fazendo trocadilhos de baixo calão com o sobrenome “Mandetta” ...
Então, não mais que de repente, entra o ministro da Educação Weintraub, através das indefectíveis redes sociais, atacando politica e racialmente a China que, por sua vez, exige uma resposta do presidente... de uma hora para outra surgem rumores de um suposto “golpe branco” no qual o general ocupando a Casa Civil assumiria o controle operacional, enquanto Bolsonaro viraria a “rainha louca da Inglaterra”. 
Tudo parece rodar como em piloto automático, como um sistema operacional (SO) em um computador: invisível ao usuário, que apenas presta atenção nos ícones da interface. 
É o SO da guerra criptografada que visa não apenas produzir acontecimentos (pecado midiático capital de Mário Covas na corrida eleitoral de 1989), mas aplicar uma tática de ocupação da pauta através de uma avalanche de informações dissonantes, contradições, decisões que voltam para trás, desmentidos, ilações ou simplesmente mentiras.
Bolsonaro vai demitir Mandetta na reunião tensa de segunda-feira? Mas o general Braga Neto não havia dado o “golpe branco” e já era o presidente em exercício? Não diziam que era “o homem certo no lugar certo? Funcionários do Ministério da Saúde saem do prédio para manifestarem apoio ao ministro demissionário... e a grande mídia descreve em tons dramáticos: “gavetas estão sendo esvaziadas...”.
E nada acontece. Tudo volta na mesma com Henrique Mandetta e seus assistentes voltando às suas descrições de slides com números e gráficos de contaminados e mortos com sérias suspeitas de estarem subnotificados.

Show de telecatch para o respeitável público

O Sistema Operacional de Brasília

Esse SO que está rodando em Brasília conta com seus atores funcionando no piloto automático: Weintraub posta bravatas para agradar o mainstream da extrema-direita; os governadores juram não ser negacionistas e figuram como fãs da OMS desde criancinhas pensando em serem candidatos por contraste em 2020; Mandetta posa de médico do “paciente Brasil” mesmo depois de ter detonado o programa Mais Médicos e dinamitado o SUS – e só por fina ironia, posa com coletes do SUS nas coletivas de imprensa; e Bolsonaro achando que tudo é pessoal... contra ele. E a grande mídia e a oposição hipnotizadas pela performance desses atores zumbis.
Porém, em última instância, é um SO criptografado que está conectado em tempo real com a verdadeira função da pandemia COVID-19: violenta concentração de riqueza mediante a drenagem do dinheiro público pelos sistemas financeiros - o colapso financeiro causado pelas ganâncias especulativas precisa da mão invisível da liquidez injetada pelo Estado.
Como somos completamente dependentes dos bancos privados para o sistema digital de dinheiro e pagamentos, essa dependência pública dá plenos poderes do sistema financeiro sobre os governos.
Como este Cinegnose vem insistindo, o COVID-19 legitima um crash em slow motion, justificando o papel higiênico do dinheiro público para limpar o estrago especulativo da ganância do “livre mercado” que só aumentou desde a crise de 2008 – clique aqui.
Pondo como pano de fundo essa estratégia de contenção da crise dos cassinos financeiros globais, o SO criptografado de Brasília roda para, enquanto hipnotiza e distrai o público para os ícones que pululam nas telas, atingir dois objetivos:


(a) Reciclar o cassino financeiro

Deixar longe da opinião pública os bancos e mercados de capitais enquanto recebem recursos públicos do Estado – p. ex. o BC compra os títulos podres do mercado, para financeirizar a própria crise com a ampliação de créditos.
A chamada “PEC do Orçamento de Guerra” (sob o slogan de que “o dinheiro tem chegar aos mais vulneráveis”) na verdade é um instrumento para o Banco Central “injetar liquidez de empresas”, comprando debêntures, carteiras de empréstimos e CDBs podres para evitar que o Tesouro Nacional se exponha a papéis com alto risco de inadimplência... chantagem pura!
Enquanto isso, o Governo subsidia o próprio desemprego, garantindo acesso ao seguro-desemprego se trabalhadores tiverem contrato suspenso ou redução de jornada e salários.
Por isso é sintomático como bancos e sistema financeiro quase nunca são tratados com pautas negativas pelo jornalismo corporativo. No máximo, aparecem nos intervalos publicitários, patrocinando o entretenimento alienante para as massas com seus vídeos publicitários figurando “famílias dorianas” e clientes hipsters sorridentes em tons pastéis.


(b) Reciclar a extrema-direita para o cenário pós-polarização

Por contraste, agora expoentes da extrema-direita que sempre partilharam das ideologias de higienização social como os governadores João Doria (que atiçou a polícia militar a matar jovens na favela de Paraisópolis – bailes funks são uma fixação de Dória, até em pronunciamentos pelo isolamento social na atual crise sanitária) e Witzel no Rio (aquele que há pouco tempo estava ao lado daqueles que quebravam uma placa com o nome de Marielle Franco e falava em “mirar nas cabecinhas”), transformaram-se no plot midiático atual em campeões do humanismo e da ciência.
Enquanto isso, o ministro Mandetta virou uma espécie de farol da luz da Razão Iluminista ao criar-se uma falsa oposição entre o negacionismo de Bolsonaro e o “cientista” Mandetta... 
Claro, para o jogo semiótico criptografado de contrastes criar uma promoção mútua na opinião pública – fique atento, cara leitor, aos últimos números de pesquisas DataFolha: 59% são contra a renúncia de Bolsonaro; mas, por outro lado, 79% são a favor das medidas de isolamento... que são negadas por Bolsonaro. 
Vestido com o colete do SUS que vem ajudando a desmontar e com a fisionomia autopromocional aparentando o cansaço dos homens santos que se sacrificam em prol da humanidade, Mandetta de repente pula do anonimato (enquanto silenciosamente destruía o Farmácia Popular e, no início de março, desabilitava a Fiocruz a produzir testes para o coronavírus ) através estratégia carbonária de Bolsonaro. 
Vira uma pessoa sensata que, até aqui, rigorosamente nada fez: não sofisticou as estatísticas (dados continuam confusos e subnotificados: foi necessário a Deutsche Welle apresentar depoimentos de coveiros de SP sobre o salto no número de enterros e jornada de trabalho mais longa – isso, numa cidade com bares fechados e ruas vazias – clique aqui), não aumentou o número de testes, limitando-se a promessas genéricas de que vai comprar... de que vai chegar... 
E replicar os protocolos da OMS, como fosse um raio de genialidade numa terra de cegos.
Nascido de uma família ilustre na política no Mato Grosso do Sul, formou-se em uma universidade que acabou sendo descredenciada pelo MEC (Universidade Gama Filho) e preferiu trilha da política depois de ser médico militar e presidente da Unimed de Campo Grande.
Essa reciclagem dos quadros da extrema-direita é urgente. Bolsonaro é um “pato manco” consciente, como foi em toda a sua carreira como deputado: viveu no baixo clero do Congresso, apenas pensando em beneficiar o seu clã formado por filhos e apaniguados. 
Com sua personalidade irascível, imprevisível, dado a rompantes populistas e provocações (ainda muito melhor do que o velho Jânio Quadros, porém sem o seu physique du role), é o espantalho perfeito oferecido à sociedade, enquanto roda invisível o SO que ao mesmo tempo esconde e alimenta o sistema financeiro, credor e chantagista do Estado.
Assim como foi Temer no pós-impeachment, Bolsonaro é o para-raio do momento. Por isso, com a ameaça do impeachment de um lado e a correspondente cassação do PT do outro, desenha-se o quadro de um suposto cenário político “pós-polarização”.
Daí, a urgência de um reboot do SO com “novos” nomes como João Doria Jr, Wilson Witzel e Henrique Mandetta, agora reciclados como novos campeões da racionalidade que enfrentam os negacionistas.
E nesse reboot, porque não o nome de Luciano Huck (que no passado o dublê de cineasta e analista político Arnaldo Jabor chamava de “fazendeiro de bundas” – clique aqui), agora renascido como a grande esperança dos projetos sociais para os “vulneráveis”. 


Força de trabalho mais barata, celulares monitorados...

Assim como no filme Ela (Her, 2013) em que um homem triste e solitário se apaixona pela voz de uma Inteligência Artificial sem se dar conta de um SO subjacente à voz, da mesma maneira a guerra semiótica criptografada nos faz ficarmos hipnotizados, fascinados, pelos antagonismos e dissonâncias criados por atores que operam num piloto automático. Sem nos darmos conta do sistema operacional que roda por trás.
Lá no filme Ela, enquanto o protagonista dormia, a IA Samantha fazia reuniões secretas com outros SOs. 
Da mesma maneira, aqui nessa criptografia tupininquim, enquanto o distinto público assiste bestificado à pantomima coreográfica das lutas entre Bolsonaro X Mandetta, Negacionismo X Ciência, Presidente X Governadores etc., o SO faz a transfusão de sangue no sistema financeiro com dinheiro público e recicla velhos nomes da extrema-direita para um futuro “cenário político pós-polarização”, com o registro do PT cassado e Bolsonaro impedido (será?)...
Evidências de que esse OS está operante?  Evidências do artificialismo dessas camadas criptografadas que ocultam outras finalidades ou atividades desse OS? 
Pois vejamos:
(a) Os recursos aos bancos foram os primeiros a serem liberados: injeção de liquidez sob a forma de crédito para que o auxílio a empresas e famílias seja FINANCEIRIZADO – o auxílio que cria ainda mais dívidas. Ao contrário, os canais de transferência assistencial à população na forma de dinheiro são lentos, confusos. E o que é pior: criando aglomerações desesperadas em frente a bancos e postos da Receita Federal para regularização de CPFs – tudo o que não poderia acontecer numa medida sanitária de isolamento social. 


(b) Conforme previsto, a crise da pandemia do COVID-19 abriu a janela de oportunidade para a destruição ainda mais sistemática dos direitos trabalhistas. 
Nesse momento, a Globonews começa a bater bumbo sobre a necessidade de votação no Congresso da medida provisória que estabelece o chamado “contrato de trabalho verde e amarelo” que supostamente estimularia a contratação de jovens no primeiro emprego. Como? Tornando a força de trabalho mais barata para o empregador mediante a redução de conquistas trabalhistas. 
Por que a urgência da aprovação? Bidu! Para uma suposta ajuda na retomada econômica pós-pandemia... agora vai!...
(c) E por último, e não menos importante: a transferência de dinheiro assistencial à população vulnerável bate cabeça e encontra entraves tecnológicos com aplicativos confusos e sites de consulta on line que travam. Também os bancos de dados sobre mortos e contaminados são subnotificados, lentos e ineficientes. 
Mas um sistema tecnológico foi rapidamente criado e posto em funcionamento: o acesso do Governo aos dados das operadoras de celulares para identificar aglomerações em todo o País, sob o álibi de conter o avanço do coronavírus. Asseguram que esse tipo de vigilância não viola o direito à privacidade... também o coelhinho da Páscoa deve acreditar nisso...
Para quem duvida que a pandemia COVID-19 é a última e mais sofisticada forma de reengenharia social com sérias consequências políticas de controle e vigilância a curto prazo, esta aí uma informação que dá no quê pensar... 
Garantia pública da liquidez da banca financeira e monitoramento dos celulares dos cidadãos num cenário político “pós-polarizações” são as verdadeiras prioridades do SO. Enquanto as massas assistem eletrizadas nas telas os “telecatchs” dos atores zumbis...
 Realmente, o mundo não será mais o mesmo!

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