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segunda-feira, julho 04, 2016

Curta da Semana: "The Nostalgist" - estamos viciados em nossas ilusões?


Se a vida de um ser humano é uma coleção de memórias, podemos enganar a nós mesmos fingindo algo que nunca aconteceu? Podemos aliviar do peso do passado através do nosso sentimento de nostalgia? Estas são as principais questões levantadas no curta “The Nostalgist” (2014) de Giacomo Cimini baseado no bestseller “Robopocalypse” do engenheiro de robótica e escritor Daniel H. Wilson. Combinando imersões em realidade virtual e realidade aumentada, o curta mostra pai e filho vivendo uma realidade idílica que, aos poucos, demonstra ser apenas uma fina interface sobre um mundo distópico. Assim como os protagonistas do filme, por meio da tecnologia estaríamos também criando falsas memórias de nós mesmos? Estamos também viciados em nossas próprias ilusões?

segunda-feira, março 28, 2016

Em "O Cérebro Que Não Queria Morrer" o pesadelo da ciência tecnognóstica


Um filme que assombrou a infância desse humilde blogueiro. Assistido décadas depois, o filme de terror sci fi “O Cérebro Que Não Queria Morrer” (The Brain That Wouldn’t Die, 1962) comprova ser uma verdadeira cápsula do tempo: mostra uma Hollywood onde a herança cultural europeia ainda estava presente na crítica à ética do progresso científico – a consciência ou “alma” não se localiza exclusivamente no cérebro (ecos da psicologia Gestalt e da Fenomenologia), o que torna a experiência do protagonista (o transplante da cabeça de sua noiva) moralmente abominável. Bem diferente da atualidade, onde a agenda tecnognóstica na Ciência crê numa consciência descorporificada que poderia ser traduzida em bytes e aspirar à eternidade.

sexta-feira, agosto 28, 2015

Por que Hollywood está interessada na mente humana?

Por que Hollywood anda tão interessada na mente humana? De filmes como “Amnésia” (2000) até a atual animação da Pixar “Divertida Mente” (2015) é recorrente o tema da possibilidade representação, mapeamento ou virtualização da mente para que possamos melhor controlá-la ou aumentar suas potencialidades. Sabendo-se que desde a II Guerra Mundial Hollywood tornou-se uma poderosa ferramenta de repercussão das agendas políticas ou econômicas dos EUA, o que representaria essa recorrência temática desse início do século? Esse foi o tema desenvolvido por esse humilde blogueiro na CONACINE 2015, onde procurei expor que nesse momento o cinema estaria repercutindo duas agendas: uma “tecnognóstica” e a outra religiosa, cujo epicentro estaria no Vale do Silício:  a propagação da “religião das máquinas”.

Por que o roteiristas e diretores do cinema andam tão interessados pelo tema da mente humana? É visível a recorrência desse tema na cinematografia desse início de século, desde Amnésia (2000), passando por Vanilla Sky (2001) e Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças (2004) até os recentes Transcendence, Lucy e a animação da Pixar Divertida Mente.

Nesse conjunto de filmes está sempre presente a ambição pela possibilidade de mapeamento, simulacão e controle da mente humana. Por que esse tema é tão recorrente no cinema nesses últimos tempos?

segunda-feira, agosto 17, 2015

Editor do "Cinegnose" participa com palestra no CONACINE 2015

Este humilde blogueiro participará da segunda edição do Congresso Nacional de Cinema (CONACINE), que vai acontecer de 17 a 21 de agosto. Participarei no dia 20 às 13 horas com a palestra on line “Cartografias da Mente Cibernética: o cinema e a virtualização da mente humana”.

O evento é totalmente online. Quem se inscrever terá o direito de assistir às palestras de sua escolha, gravadas em vídeo e exibidas no site do evento em datas e horários específicos. Os interessados podem se inscrever no site do CONACINE. O endereço é www.conacine.org.

domingo, julho 19, 2015

Alucinações pós-digitais no filme "O Congresso Futurista"

Se hoje discutimos o destino do cinema com a era da digitalização, o filme “O Congresso Futurista” (The Congress, 2013) já está bem à frente: em uma era pós-digitalização o cinema tal qual conhecemos deixaria de existir. A indústria do entretenimento apenas forneceria estímulos químicos e eletrônicos e o “espectador” criaria sua própria alucinação, transformando-se na celebridade que quisesse. Em uma espécie de versão feminina do filme “Quero Ser John Malkovich”, a atriz Robin Wright (“House of Cards”) interpreta corajosamente sua própria carreira num híbrido de “live-action” e animação mostrando o destino do ator num futuro onde as pessoas irão querer se exilarem numa espécie de Caverna de Platão produzida por alucinações químicas e solipsistas.

Hollywood produz sonhos e ilusões. Mas nem por isso deixa de viver as mazelas de uma indústria qualquer, com os costumeiros conflitos entre capital e trabalho – no caso do cinema, toda a estrutura que se arma em torno dos atores, a mão-de-obra do negócio: agentes, rompimentos de contratos, drogas, depressão, fracassos, amantes etc.

E se na indústria convencional o capital precisa controlar o trabalho por meio da automação e demissões, na indústria dos sonhos não é diferente: o desenvolvimento tecnológico digital não objetiva outra coisa senão controlar o trabalho dos atores até chegar ao ponto, num futuro bem próximo, em que o próprio ator será um personagem digital (propriedade do estúdio), dispensando o ator real que será despachado para o ostracismo.

segunda-feira, julho 06, 2015

"Divertida Mente" transforma pesquisas de controle da mente em entretenimento


A crítica especializada vem considerando a nova animação da Pixar, “Divertida Mente” (Inside Out, 2015), como a mais criativa e emocionante do estúdio. Certamente comprova como a Pixar é capaz de transformar em entretenimento um conteúdo politicamente sério: as pesquisas do psicólogo Paul Ekman, pioneiro dos estudos das conexões entre as emoções e expressões fisionômicas – estudos iniciados pela CIA e Departamento de Defesa dos EUA para criar modernos detectores de mentira em suspeitos de terrorismo. Dessa maneira, “Divertida Mente” é mais um produto midiático que reflete a atual agenda tecnocientífica: o projeto das cartografias e topografias da mente – criar modelos de simulação baseados nas neurociências, Cibernética e ciências da computação que desvendem o funcionamento da mente e da consciência.  Por trás do entretenimento há um propósito muito mais sério: controle e manipulação da mente, seja pela via fármaco ou pelo controle de massas através de dispositivos como o Neuromarketing.

quinta-feira, junho 04, 2015

Nietzsche se encontra com Inteligência Artificial no filme "Ex Machina"


O roteirista e escritor Alex Garland (autor do livro “The Beach”, com versão cinematográfica em 2000) faz uma sombria estreia como diretor  no filme “Ex Machina” (2015). Sombria porque, ao contrário da tradicional abordagem cinematográfica sobre a Inteligência Artificial (entre a apologia e o apocalipse tecnológico), Garland apresenta uma abordagem verossímil e atual, onde a IA é o resultado de uma singularidade produzida pelo chamado Big Data produzido pelas redes sociais, celulares e dos algoritmos de busca de uma empresa chamada Blue Book – em tudo análoga ao Google. Tão verossímil que se torna assustador: a IA surgirá como um fenômeno pós-humano orientado apenas pela "Vontade de Potência", no sentido atribuído pelo filósofo Nietzsche – um ser unicamente governado pela vontade de realizar-se como potencia em si mesma, para além do Bem e do Mal, tornando o homem uma primitiva ferramenta de linguagem. E esse novo ser é um androide feminino. Filme indicado pelo nosso leitor Felipe Resende.

sexta-feira, maio 29, 2015

Pesquisadores da NASA e Oxford acreditam que Universo é um game de computador

Sempre ouvimos dizer que “a vida é um jogo”. Mas e se essa frase for mais do que uma metáfora e nesse exato momento estivermos todos nós vivendo em um jogo desenhado por alguém que está em algum ponto num futuro distante? Tão velha quanto a história humana, a ideia gnóstica de que a realidade é uma ilusão retorna através das leis da Inteligência Artificial e a evolução dos games de computador: Nick Bostrom, da Universidade de Oxford, e Richard Terrile, da NASA, apontam para evidências de que o Universo seria uma gigantesca simulação de um game de computador cósmico e que o salto qualitativo na capacidade dos nossos computadores nos permitiria repetir a experiência da simulação de mundos, assim como o nosso. Tal hipótese explicaria inconsistências e mistérios que cercam o nosso cosmos, como, por exemplo, a natureza da “matéria escura”. Ciência e gnosticismo mais uma vez se encontram, dessa vez no fascínio atual pelos games de computador. Pauta sugerida pelo nosso leitor André De Paula Eduardo.

De acordo com as teorias de dois pesquisadores também distantes no tempo e espaço, um acadêmico de Oxford (Inglaterra) e um cientista da NASA (EUA), haveria uma certeza matemática que estamos imersos em uma simulação intrincada criada por seres (aliens ou mesmo seres humanos) que existem em algum lugar distante no futuro a partir de 30 anos até cinco milhões de anos. Seríamos como um passa-tempo desses futuros seres, a sua versão de um roler-playing como um World of Warcraft.

Uma ideia alucinante com o velho toque da cosmologia gnóstica da antiguidade (o homem como prisioneiro em um cosmos criado por um demiurgo enlouquecido que se diz Deus), mas em suas defesas esses pesquisadores argumentam que a hipótese não é mais rebuscada do que acreditarmos na religião que nos diz que Deus criou as terras e os céu. Ou de que tudo surgiu de uma enorme explosão que começou a esticar o tecido do espaço como um balão, formando trilhões de galáxias e, por pura sorte, surgiu o ser humano, como nos informa a teoria do Big Bang.

sábado, maio 09, 2015

"Chappie", a consciência e a seringa hipodérmica

Depois do favelão e lixo nos quais o futuro se transformou em “Distrito 9” e “Elysium”, dessa vez com o filme “Chappie” (2015) Neil Blomkamp visita a pedra filosofal do gênero ficção científica: a Inteligência Artificial. O subtexto político dos filmes anteriores continua (África do Sul, Globalização e apartheid), mas dessa vez parece que Blomkamp cedeu ao “product placement” (inserção subliminar de produtos e marcas) e à agenda que orienta as produções do gênero pelos grandes estúdios: o tecnognosticismo - a ambição pós-humana de nos livrarmos da carne e do orgânico através de uma suposta transcendência espiritual possibilitada pelo escaneamento da consciência e a sua conversão em bytes. Ao contrário do filme “AI” (2001), também uma alusão à fábula de Pinóquio (uma máquina que quer se transformar em ser humano), aqui Chappie tenta emular sentimentos humanos, mas dessa vez através de uma consciência que se assemelha à metáfora da “agulha hipodérmica”. Se em “A.I.” a máquina queria acreditar naquilo que não podia ser visto ou sentido, em Chappie a máquina não tem sonhos – ela quer apenas imitar - filme sugerido pelo nosso leitor Joari Carvalho.

Chappie, do diretor Neil Blomkamp (Distrito 9 e Elysium), é um filme dentro de um subgênero do sci fi que os pesquisadores chamam de “ficção científica do Sul”: filmes em estilo realista monckmentary (feitos em estilo documentário mas em tom paródico) com atores e empresas de países considerados periféricos e com temas ligados às mazelas da globalização sócio econômica – privatização, imigrantes ilegais, favelização, exclusão, máfias internacionais etc.

O tom mais marcante desse subgênero é mostrar como a alta tecnologia (robótica, nanotecnologia etc.) convive de forma conflitiva com favelas, deterioração urbana, lixo, precarização do trabalho e sucateamento do Estado. O que torna os filmes desse subgênero potencialmente críticos em relação ao atual status quo da Globalização.

terça-feira, agosto 12, 2014

O pós-humano de "Lucy" e o mito dos 10% do cérebro


“Lucy” (2014), do diretor francês Luc Besson (“O Quinto Elemento”, “Leon: The Professional”), é mais um filme da safra atual com o tema do pós-humano (“Transcendence”, “The Machine”, “Limitless” etc.). Todos se baseiam em um mito que é o pressuposto da filosofia pós-humanista que anima a agenda tecnocientífica atual: o homem seria um ser limitado porque utilizaria tão somente 10% da capacidade cerebral. Sua limitação viria do corpo físico que nos aprisionaria no medo e na dor. Mito desconstruído por neurologistas sérios como Barry Gordon,  da John Hopkins School of Medicine. Por meio de drogas ou tecnologias cibernéticas o homem daria em “upgrade” em si mesmo, acessando 100% o “banco de dados” cerebral. “Lucy” revela uma nova religião onde Deus é substituído pela tecnologia e a alma pela informação.

domingo, julho 20, 2014

"Transcendence" mostra fábula nietzschiana sobre tecnologia e poder

Crítica e público estão massacrando o filme “Transcendence – A Revolução” (2014). Todos esperavam um sci fi clássico com super-heróis e narrativas de ação e terror. Mas o filme nos oferece uma extrapolação do atual discurso autopromocional das neurociências e ciências da computação através do olhar de uma autêntica fábula nietzschiana sobre o Poder: a grande questão da onisciência e onipresença de uma suposta superinteligência digital por trás de corporações como Google e do projeto da Internet das Coisas não é a do Poder vulgar em conquistar mais dinheiro e controle político: é o Poder pelo Poder, como jogo, vontade de potência em transcender os limites da ética e moral humana representado pela superação do próprio corpo.

Nelson Rodrigues dizia que toda unanimidade é burra. Certamente essa máxima pode ser aplicada à forma como a crítica e o público está recebendo o filme Transcendence – A Revolução. Bilheterias decepcionantes nos EUA e Brasil e péssimas críticas tanto aqui como lá.

“Muito conceito e pouca história para contar”, “explicações incessantes”, “elenco estrelado (Johnny Deep, Morgan Freeman e Cillian Murphy e Paul Bettany) que parecem não saber o que fazer trocando frases soltas entre si”, “pretensioso e chato” etc. O que parece criar estranhamento para os críticos são os desempenhos “contidos” ou até “robóticos” do protagonista Deep e um filme que parece investir muito mais nas rimas visuais e em conceitos abstratos do que em uma história dramática.

Crítica e público esperavam um “filme de ficção científica” com super-heróis ou narrativas de ação e terror com um “sabor” de sci-fi, que é o que normalmente Hollywood oferece. Mas o que o diretor Wally Pfister (desde o filme Amnésia diretor de fotografia dos filmes de Christopher Nolan) foi uma verdadeira ficção científica: a partir da agenda tecnologia atual, extrapolar para onde estamos indo e o que isso pode significar para a raça humana, intelectual e espiritualmente.

terça-feira, junho 24, 2014

Curta "BlinkyTM" mostra as obscuras relações humanas com a tecnologia

O curta metragem “BlinkyTM - Bad Robot” (2011) dirigido pelo irlandês Ruairi Robinson segue a trilha temática análoga ao filme premiado pelo Oscar “Ela” de Spike Jonze: a relação mágica e fetichista com os gadgets tecnológicos. Se no filme de Jonze um usuário se apaixona por um sistema operacional, no curta de Robinson uma criança acredita na promessa de um anúncio publicitário de que um robô de estimação será capaz de reunificar a sua família, cujos pais estão em constantes brigas. O curta é uma ótima oportunidade para discutir os efeitos do descompasso entre os modelos de família perfeita apresentados pelo discurso publicitário e as relações reais entre pais e filhos. Curta sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende.

Em um futuro próximo toda casa terá um robô ajudante capaz não só de entreter seu filho como de também fazer o almoço. Mas não se preocupe. É perfeitamente seguro... mas, cuidado com o que você pedir para ele: o robô poderá interpretar ao pé da letra o que você desejar e as consequências podem ser imprevisíveis.

O diretor e animador irlandês Ruairi Robinson (indicado ao Oscar em 2002 com o curta Fifty Percent Grey) com o curta BlinkyTM - Bad Robot nos sugere como pode ser perigosa a combinação dos velhos problemas humanos com a moderna tecnologia, não só incapaz de resolvê-los como ainda podendo ampliá-los. Máquinas e seus programadores são incapazes de inserir julgamentos éticos ou morais entre os O e 1 das codificações. Mas os usuários dos gadgets tecnológicos não veem dessa maneira e passam a ter uma relação fetichista ou mágica, acreditando que aplicativos, programas ou robôs irão misticamente encontrar soluções para nós.

segunda-feira, junho 09, 2014

Conceito "Cinegnose" é agora verbete em nova edição do Dicionário da Comunicação

O conceito criado por esse humilde blogueiro e a razão da existência desse blog – a noção de “cinegnose” – foi transformado em verbete no “Dicionário da Comunicação – segunda edição revista e ampliada”, lançado na semana passada pela Editora Paulus. Juntamente com os verbetes “filme gnóstico” e “adgnose”, também criados nas pesquisas do blog, o "Dicionário da Comunicação" organizado pelo Prof. Dr. Ciro Marcondes Filho abre a oportunidade para que as pesquisas sobre as confluências entre Gnosticismo, Cinema e Comunicação que foram iniciadas pelo “Cinema Secreto: Cinegnose” se fortaleçam e ganhem espaço dentro dos estudos científicos da área. As pesquisas iniciadas por esse blog se juntam, portanto, às pesquisas da chamada Nova Teoria da Comunicação: o estudo do fenômeno comunicacional como acontecimento e transformação pessoal e coletiva. E para o blog, a abertura para fenômenos espirituais como a gnose.

Na semana passada foi lançado em São Paulo o Dicionário da Comunicação - segunda edição revista e ampliada, pela editora Paulus, organizado pelo Prof. Dr. Ciro Marcondes Filho da ECA/USP. Esse humilde blogueiro fez parte dos 80 colaboradores nacionais e internacionais que trouxeram novas correntes de pesquisas e olhares para a comunicação, incluindo diferentes linhas de pensamentos.

Nesta nova edição do dicionário esse blogueiro que escreve essas mal traçadas linhas foi convidado a transformar em verbetes alguns conceitos desenvolvidos por esse blog dentro do nosso projeto de convergência dos conceitos da Teoria da Comunicação e Cinema com o Gnosticismo: “adgnose”, “filme gnóstico”, “cinegnose”, “arquétipos contemporâneos”, “agenda tecnocientífica”, “cinema esquizo”, além de conceitos tradicionais da ciência da comunicação como “agenda setting” e “mitologia” – no sentido dado pelo semiólogo francês Roland Barthes.

segunda-feira, maio 12, 2014

O pós-humano no filme "The Machine"

Do mito do Golem do misticismo judaico, passando pelo robô Maria do clássico “Metrópolis” de 1927 até chegar ao computador HAL 9000 de “2001” de Kubrick, a Inteligência Artificial (IA) é vista como ameaça ou realização máxima do homem, mas nunca sua superação por supostamente faltar nela a essência da humanidade: a consciência ou alma. Mas o filme inglês “The Machine” (2013) insere a discussão da IA em outro patamar, desenvolvido no cinema desde os personagens dos replicantes de “Blade Runner” (1982) de Ridley Scott: o do “pós-humano”. “The Machine” acrescenta a essa novo enfoque da IA um componente místico que estaria motivando a agenda tecnocientífica atual: o tecnognosticismo - a ambição de nos livrarmos da carne e do orgânico através da transcendência espiritual possibilitada pela tecnologia. Encontrar a imortalidade da alma através de upload final para um banco de dados, “nuvem” de bits ou rede eletrônico-neuronal.

A Inteligência Artificial (IA) é um dos grandes arquétipos do imaginário contemporâneo, capaz de alimentar tanto as utopias mais luminosas quanto os maiores pesadelos distópicos da literatura e do cinema.

Herdeiro direto das mitologias do Golem (ser artificial associado ao misticismo judaico da Cabala, trazido à vida através de processos mágicos), dos homunculus da Alquimia e de Frankenstein (a criação da escritora Mary Shelley que materializou a advertência do pintor Goya de que o sono da Razão produz monstros), a evolução da ambição tecnocientífica pela Inteligência Artificial pode ser dividida em três etapas:

Primeira, representada pelo filme Metrópolis de Fritz Lang: através de uma estética cartesiana emblemática da vanguarda artística da primeira metade do século XX apresenta a personagem robótica Maria, comandada pelos malignos propósitos de uma elite que escraviza trabalhadores – mas também o símbolo da necessidade do homem comandar a máquina com o coração para mediar os conflitos entre a classe dominante e dominada. Em si a máquina é benéfica, bastando ao homem buscar não a Razão, mas a sua humanidade para controlá-la de forma sábia.

domingo, março 30, 2014

Neurogadget que promete sonhos lúcidos é sintoma da cultura dos aplicativos

Um aplicativo que promete para o usuário sonhos lúcidos. É o “Aurora”, criado por uma start up californiana e previsto para ser lançado no segundo semestre desse ano, que promete tornar os sonhos tão produtivos e eficientes que farão a terça parte da vida que passamos dormindo valer a pena. O neurogadget Aurora é um sintoma tanto da cultura atual dos aplicativos que cria nos usuários uma falsa ilusão de racionalidade e planejamento de onde nem os sonhos parecem escapar; e de uma agenda tecnognóstica que une neurociências, ciências computacionais e Inteligência Artificial com o propósito de efetuar a cartografia e topografia da mente com objetivos de manipulação e controle social.

Em postagem anterior discutíamos como o cinema parece antecipar uma espécie de agenda tecnocientífica – sobre isso clique aqui. Dessa vez, os diversos filmes que abordaram o tema dos sonhos lúcidos (Vanilla Sky, A Origem, Sonhando Acordado, entre outros) parecem ter se antecipado ou inspiraram um aplicativo criado pela IWinks, uma start up de San Diego, nos EUA: o “Aurora”, aplicativo que promete ao usuário criar sonhos lúcidos a partir de um dispositivo que mede as ondas cerebrais e o movimento dos olhos.

O sonho lúcido ocorre no momento em que o sonhador começa a ter uma relação de estranheza com o fluxo dos acontecimentos oníricos e passa a questionar a própria realidade. Consciente que se encontra num sonho, passa então a interferir na lógica onírica. O aplicativo “Aurora” supostamente promete criar essa situação para o usuário a partir do momento em que o dispositivo percebe os movimentos REM e a alteração das ondas cerebrais, enviando jogos de luzes e sons personalizados para o usuário que, sem despertar, perceberá que está num sonho - veja abaixo o video promocional do aplicativo.  

domingo, março 23, 2014

"Aurora" supera "A Origem" e inova as representações do inconsciente no cinema

É inevitável a comparação entre “Aurora” (Vanishing Waves, 2012) da lituana Kristina Buozyte com “A Origem” (Inception, 2010) de Christopher Nolan: enquanto a produção hollywoodiana abordava o mundo onírico pelo viés das neurociências (jamais a palavra “inconsciente” era citada), a produção lituana aborda o mesmo tema, mas fiel ao ponto de vista freudiano sobre a dinâmica do psiquismo, inovando as representações do inconsciente no cinema através de engenhosos efeitos inspirados em MC Escher e expressionismo alemão. Se Freud considerava o inconsciente como o “Isso” e o “Estranho”, “Aurora” mostra como uma neurociência atual munida de interfaces digitais e mapas neuronais tenta ignorar essa origem de toda atividade humana impossível de ser apreendida pela ciência racionalista.

Em postagem passada quando discutíamos o filme A Origem (Inception, 2010) observamos que a grande deficiência do filme de Nolan era abordar o tema dos estados imersivos de alteração de consciência e o mundo onírico dos sonhos sob um ponto de vista associado à engenharia do espírito das neurociências: embora tudo ocorresse no mundo dos sonhos, nunca se tocava na palavra inconsciente e o psiquismo era abordado pela possibilidade pragmática de manipulação neurocientífica comandada por interesses corporativos.

O que tornou A Origem num filme estéril e assexuado onde a presença feminina tornou-se masculinizada ou, então, um objeto abstrato tal como uma princesa de contos de fadas. Bem diferente é o filme da lituana Kristina Buozyte Aurora (Vanishing Waves) em que a narrativa revisita alguns conceitos das viagens no mundo dos sonhos de A Origem. Porém, em Aurora, o psiquismo do mundo dos sonhos é uma mix de surrealismo e de uma primitiva psicossexualidade que faria Freud ficar corado. Kristina se aproxima muito mais do funcionamento do psiquismo humano do que Nolan ao capturar como a experiência real do sonho pode ser assustadora e desagradável, mesclada com primitivas e incontroláveis fantasias eróticas. O que torna Aurora um filme diferenciado no gênero de ficção científica: uma erótica e surreal viagem mental.

sábado, março 08, 2014

Há um fantasma na máquina no filme "Ela"

No filme “Ela” (Her, 2013 - Oscar de melhor roteiro original), o diretor Spike Jonze retorna ao tema da intimidade e incomunicabilidade das relações humanas abordadas pelo filme “Quero Ser John Malkovich” (1999). Só que dessa vez sem alegorias, mas com a mediação tecnológica de um sistema operacional que parece adquirir inteligência e desenvolver emoções autênticas. Será que o software desenvolve uma verdadeira inteligência ou será que nós estamos rebaixando nossas expectativas sobre a inteligência para as máquinas parecerem mais espertas? Se isso for verdade, isso não prejudicaria também nossas expectativas em relação aos relacionamentos e o amor? Mas para Spike Jonze há um fantasma na máquina que pode subverter as programações algorítmicas e encontrar uma dimensão espiritual no espaço quântico entre o “0” e o “1” da codificação binária.

Em meados da década de 1990 um hacker americano em Berlin e um colega francês colocaram em prática uma curiosa experiência em ciber-sexo: criaram um traje especial para o corpo imergir numa experiência de sexo à distância. Uma perfeita máquina de ciber-sexo que possibilitaria uma relação sexual virtual entre Paris e Berlin. O experimento foi divulgado e atraiu uma multidão nas duas cidades. O que se sucedeu foram pessoas vetorizando seus corpos, supostamente sentindo toques e penetrações de seus parceiros remotos como fossem experiências presenciais.

Mas algo curioso aconteceu. Ao final do segundo dia um ciber-parceiro de Paris mandou uma mensagem dizendo que estava tendo um problema com os códigos: uma falha na programação estava fazendo o programa funcionar em loop, em um feedback fechado. O que significava que em dado momento o usuário não estava mais fazendo sexo com algum parceiro remoto, mas com suas próprias sensações digitalizadas em looping. E os participantes estavam adorando! Em síntese, a experiência europeia de ciber-sexo converteu-se em um evento autístico, uma ciber-masturbação (leia KROKER, Arthur. Hacking the Future. New York: St. Martin Press, 1996).

segunda-feira, fevereiro 17, 2014

Por que somos seduzidos pelo virtual?



“É a verdade... a digitalização da vida real. Você não vai só a uma festa. Vai a uma festa com uma câmera digital. E seus amigos revivem a festa on line.” Essa afirmação de Sean Parker (criador do Napster, interpretado no filme por Justin Timberlake), que aparece solta nas frenéticas linhas de diálogo no filme “A Rede Social” (The Social Network, 2010), é a síntese do “desejo de virtualidade”, essa motivação individual que sustenta todo o projeto tecnognóstico que domina a atual agenda tecnológica e científica. O desejo pela digitalização da vida seria a recorrência de uma milenar aspiração gnóstica pela transcendência da carne e a imortalidade da espécie. Mas essa aspiração por transcendência transforma-se em má consciência ao ser capturada por sistemas econômicos e políticos. Transforma-se em ideologia, como questiona o pesquisador canadense em ciência política, tecnologia e cultura Arthur Kroker.

sexta-feira, dezembro 06, 2013

O aplicativo Lulu e a religião da autoabdicação humana


Processos judiciais, febre entre as mulheres e pânico entre os homens. Por trás desse frisson midiático autopromocional do aplicativo Lulu onde mulheres avaliam homens através de um conjunto de quesitos, estão questões que colocam em xeque a própria cultura dos gadgets tecnológicos que está organizando o nosso lazer e trabalho. O Lulu seria o sintoma de uma verdadeira religião cibertotalitária que estaria motivando a maioria de engenheiros, cientistas e designers digitais do Vale do Silício: a autoabdicação humana – o computador estaria evoluindo para se transformar em uma forma de vida capaz de entender melhor as pessoas do que as próprias pessoas. E quem fala isso não é nenhum tecnofóbico, mas um dos principais nomes do Vale do Silício: o designer de software Jaron Lanier.

Duas cenas em duas épocas distantes entre si no tempo. O que veremos a seguir é que essas duas cenas estão interligadas não só em uma análise sobre o fenômeno do aplicativo Lulu, mas de toda a cultura criada em torno do consumo diário de aplicativos.


Primeira cena: Em meio à euforia da revolução sexual dos anos 1960 desencadeada pela pílula anticoncepcional, a descoberta da sexualidade desatrelada da reprodução e dos papéis familiares e a erotização generalizada da mídia, publicidade e sociedade de consumo, o pensador alemão Herbert Marcuse observava a tudo com desconfiança. Um dos principais nomes da chamada Escola de Frankfurt, Marcuse estava naquele momento no olho do furacão dos movimentos de rebeldia estudantil: professor de filosofia no campus San Diego da Universidade da Califórnia. Para ele, o princípio de realidade contra o qual a revolução se dirigia estava se transformando em algo mais insidioso: o princípio do desempenho, princípio que transformaria toda a revolução sexual e dos costumes muito mais em sucesso de vendas do que em real emancipação.

sexta-feira, outubro 11, 2013

Cultura geek e tecnognosticismo nas animações "Hora de Aventura" e "Apenas um Show"


O non sense, surrealismo e o humor muitas vezes sombrio das animações “Hora de Aventura” e “Apenas um Show” (sugeridas pelo nosso leitor Paulo Massa) causam estranheza nos adultos, embora as crianças as compreendam muito bem. Essas animações são produtos culturais criados por representantes de uma geração que cresceu vendo “Os Simpsons” e jogando "Dungeons and Dragons". Seus criadores Pedleton Ward e J.G. Quintel são os mais acabados representantes de uma cultura geek que conseguiu mesclar a tecnociência com o misticismo e magia – o “tecnognosticismo”. Por isso conseguem dialogar com uma geração de crianças cuja sensibilidade se altera com o entretenimento em plataformas móveis como Ipods, tablets e celulares.

Hits do canal Cartoon Network, as animações “Hora de Aventura” (Adventure Time) e “Apenas um Show” (Regular Show) podem ser considerados produtos culturais criados por uma geração que cresceu vendo “Os Simpsons”, jogando o RPG e game de computador Dungeons and Dragons. E quem afirma isso são os seus próprios idealizadores, respectivamente Pedleton Ward e J.G. Quintel.

São típicos produtos de uma cultura geek que cresceu em contato com tecnologias de convergência e interfaces digitais e muita navegação em ambientes fragmentados por hipertextos. Acostumados que estamos com narrativas tradicionais em três atos, com muitas gags visuais, correria e perseguições ao melhor estilo slapstick dos desenhos animados tradicionais, assistir a esses novos produtos é uma experiência de estranhamento pelo total surrealismo e non sense.

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