Este Cinegnose vem insistindo no perfeito sincronismo entre a agenda do Grande Reset Global, do Fórum Econômico Mundial, e a crise da pandemia global do Covid-19. Além de mitigar o violento crash financeiro que ocorreria em 2020 (clique aqui), acelerou o processo de reconfiguração do capitalismo que especialistas definem genericamente como “Quarta Revolução Industrial” – melhoria da eficiência e produtividade de processos por meio de “fábricas inteligentes” cujo efeito social é a exclusão: crescente contingente da força de trabalho que nem mais para ser explorada servirá.
O que vem sendo confirmado por pesquisas, sendo a mais recente a da organização Oxfam Brasil cujos resultados apontam que 26 bilionários por hora apareceram no mundo desde o início da pandemia. Por outro lado, entre março de 2020 e novembro de 2021, a renda de 99% das pessoas do planeta caiu.
“A atual estrutura econômica do mundo concentra riqueza, empobrece e mata milhões de pessoas, destrói o planeta e coloca em risco o futuro da existência humana no planeta”, destaca a pesquisa Oxfam – clique aqui.
Historicamente, em momentos como esse de saltos do capitalismo para dar conta das suas próprias contradições, as guinadas políticas para o extremismo de direita sempre acontecem como o the last minute rescue do sistema econômico. Foi assim com a ascensão do nazi-fascismo pós-crash de 1929. E no século XXI, após sucessivos crashs e derretimentos de mercados financeiros que apontaram para o esgotamento do modelo da Globalização, a escalada da “direita alternativa” por todo o planeta sustentada pelas estratégias de guerra híbrida.
No concerto mundial do Reset Global do Capitalismo, as eleições no Brasil passam a se revestir de importância estratégica nesse violento processo de reconfiguração – violento porque essa reconfiguração necessariamente deve ser acompanhada por forte engenharia social: por meio da crise estendida da pandemia e das “mudanças climáticas” transmitir uma percepção de “neutralidade” nas transformações sociais e, com o auxílio luxuoso dos mecanismo cognitivos de guerra híbrida, sumir com a pauta dos temas de economia política (luta de classes) e canalizar os conflitos políticos para a “guerra cultural” e a pauta da luta contra a corrupção.
Mesmo os “colonistas” da grande mídia concordam que os temas econômicos serão decisivos para as eleições desse ano: recessão, inflação, desemprego, desalento, juros estratosféricos e uma política econômica monetarista renitente que parece flertar com a volta da velha hiperinflação.
Porém, é tudo o que a grande mídia não quer – significaria colocar em discussão princípios basilares do neoliberalismo periférico e fundamentalista para o qual todo o esforço do jornalismo de guerra foi mobilizado: reformas, privatizações e fiscalismo para liberar o butim para acionistas privados de estatais e credores do mercado financeiro.
Não pode mais falar de Economia... |
Modo “reprodução” e “modo alarme”
Eleições, tudo bem! Mas desde que não mexam na política econômica pela qual tudo foi feito, da guerra híbrida ao golpe de 2016: a perpetuação do neocolonialismo high-tech, o capitalismo de plataforma que é o destino que o Capitalismo reserva à periferia nessa nova reconfiguração do século XXI.
O sumiço da pauta econômica da grande mídia é tão evidente que, por exemplo, os “colonistas” da área econômica Miriam Leitão e Carlos Sardenberg da Globo abandonaram sua editoria na qual se notabilizaram: a primeira, virou uma comentarista sobre políticas ambientais; quanto ao segundo, o caso é mais dramático. É escalado para falar de qualquer coisa, até para fazer obituário da carreira de Elza Soares...
No modo “reprodução” (a gestão e vigilância cotidiana da implementação e continuidade daqueles princípios neoliberais) a grande mídia cumpre diligentemente seu papel: no dia a dia do jornalismo corporativo, os grandes vilões da “recessão técnica” seriam a pandemia (o País começava a retomada, mas... veio a Ômicron) e as mudanças climáticas (fica quente demais... ou chove demais... ou não chove nos lugares certos... efeito “La Niña... por isso represas secam e termoelétricas são ligadas...).
Porém, não é o suficiente. Por isso, nessa semana, acompanhamos evidências de que a grande mídia começa a funcionar no modo “alarme”, prevendo um ano eleitoral difícil no qual o simples modo “reprodução” não dará conta – é preciso uma pesada artilharia de bombas semióticas diversionistas. Para os “colonistas” fugirem dos temas econômicos assim como o vampiro foge das réstias de alho.
A semana começou com a manchete de O Globo: “Sob pressão, Bolsonaro ‘recicla’ estratégia de 2018, centra ataques em Lula e reforça aceno a conservadores”.
Um dia antes, domingo, 16/01, o jornal Folha de São Paulo pública o artigo de opinião “Racismo de negros contra brancos ganha força com identitarismo”, do antropólogo Antonio Risério.
Claro, a Folha fomenta falsas controvérsias para ganhar clickbaits nas redes sociais que, como era de se esperar, reagem de forma reativa no atoleiro do identitarismo – personalidades inundaram as redes de críticas caindo como uma luva na cultura do cancelamento. Assim como os próprios jornalistas da casa, numa “carta aberta de jornalistas da Folha à direção do jornal”. Enquanto os jornalistas acusam a Folha de relativizar o problema do racismo e discriminação, o diretor de redação, Sérgio Dávila, a crítica é “parcial” e, lugar comum naqueles que são acusados de racismo: a Folha também contrata profissionais negros...
Teoria do Piloto Automático na guerra híbrida: com os lançadores dispare a bolinha no fliperama e, dada as condições iniciais, elas rebaterão ali e aqui de forma previsível.
O Globo tinha razão: começa a ser reciclada a estratégia de 2018: do lado de Bolsonaro, é pela falta de opção; e do lado da grande mídia, tática diversionista par fugir dos espinhosos temas econômicos.
Mas por que esse humilde blogueiro está usando essas expressões “atoleiro do identitarismo” e “tática diversionista”? Risério fala no artigo que “ninguém precisa ter poder para ser racista”. Esse é o cerne do identitarismo como bomba semiótica da guerra híbrida: o racismo como um defeito de conduta individual colocado na pauta de discussão de valores, costumes, crenças e práticas. E não como fenômeno de uma estrutura que não discrimina, mas exclui (luta de classes), relegando ao contingente daqueles que nem para serem explorados servem. Fora da economia política, a discussão do racismo cai no relativismo e na pós-verdade: objetivo final da estratégia da “guerra cultural” alt-right.
Não por acaso, na segunda-feira (17/01) começou o “Big Brother Brasil 2022” apostando mais uma vez na polarização que alimenta a guerra cultural – terreno semiótico no qual a alt-right nada de braçadas. E já começou a polarizar as redes entre lulistas e bolsonaristas.
Sabemos que a estratégia da produção comandada por José Bonifácio Brasil de Oliveira (o Boninho) estabelece previamente perfis de integrantes que garantam o desenrolar de uma narrativa pré-determinada.
Nessa edição é visível que a narrativa está direcionada para conflitos políticos que podem caracterizar uma prévia para as eleições. Por exemplo, a cantora Naiara Azevedo (que já gravou vídeos debochando da ausência de um dedo de Lula), que, ao lado do sertanejo Sorocaba, jantou com o presidente Bolsonaro. E do outro lado, participantes que ostentam bandeiras de esquerda como a cantora Linn da Quebrada, militante LGBT, que já publicou nas redes fotos ao lado de Lula.
Pelo que especulam os vigilantes nas redes sociais, haveria oito bolsomínios, desde já futuros alvos de campanhas para eliminação.
Globoplay e revista Veja
Esse é o início do modo “alarme” para, como cripticamente enuncia na manchete de segunda-feira no jornal O Globo, reciclar a estratégia da guerra cultural de 2018.
Porém, esse modo alarme de funcionamento midiático não poderia deixar de tirar do armário um indefectível esqueleto, revivido a cada eleição: o caso Celso Daniel – o caso do assassinato do ex-prefeito de Santo André, em 2002, cujas investigações da Polícia Civil concluíram que foi crime comum, após sequestro.
Pois não é que a Globoplay lançou nessa semana a minissérie “O Caso Celso Daniel”?!?! Com entrevistas com Fernando Henrique Cardoso, José Dirceu, Gilberto Carvalho e Eduardo Suplicy.
A missão não será fácil: requentar um caso de exatamente 20 anos atrás. Mas, claro, essa é apenas uma levantada de bola na rede.
E a cortada veio. Nessa semana, Bolsonaro já manifestou sinais de que tentará ligar, através do chamado “gabinete do ódio”, a suposto atentado a faca de 2018 com o caso Celso Daniel. E martelar a imagem de que o PT é uma organização criminosa que não viria limites em impor o seu projeto de poder – clique aqui.
Em outras palavras, a guerra semiótica eleitoral tenta também requentar o tema da corrupção como tática diversionista do “não-há-nada-para-se-ver-aqui” das notícias econômicas.
E por último, e não menos importante, a semana termina com a “notícia-bomba”, só que de Polichinelo, da revista Veja: “Ex-assessor de Bolsonaro confirma rachadinha na família do presidente” – um amigo próximo do chefe do Executivo, Waldir Ferraz, diz que o mandatário comandou o esquema nos gabinetes dos filhos.
São necessárias mais provas para o presidente que mais produziu provas contra si mesmo? Onde está a “bomba” dessa revelação como a grande mídia está querendo tratar?
Essa verdade de polichinelo, que nada mais acrescenta à oposição, na verdade é um “apito de cachorro” para a sua base eleitoral – lembrar para seu núcleo duro que a grande mídia “comunista” que dar rasteira no seu Mito com uma notícia oportunista em ano eleitoral.
De um lado, a ressurreição do esqueleto Celso Daniel... e do outro a “denúncia” da revista Veja. Acontecimentos simétricos para, junto com a cultura do cancelamento que o BBB22 vai incendiar, alimentar a polarização diversionista. E articulado com a Operação Ômicrom, reduzir o peso da pauta da economia em ano eleitoral.
Não tenham dúvidas, caros leitores. Bolsonaro ainda continua em stand by como uma espécie de “Plano B”, caso sua versão mais “limpinha”, Sérgio Moro, continuar insosso e anódino.