sábado, dezembro 27, 2014

Em Observação: "Êxodo: Deuses e Reis" (2014) - Deus é o vilão?

“Êxodo: Deuses e Reis” é mais um filme da tendência atual de produções hollywoodianas de temas bíblicos. Os produtores escolheram o diretor certo: Ridley Scott, cujos filmes parecem ter um tema recorrente – a morte dos deuses. Assim como no filme “Noé” de Aronofsky, o Deus do Velho Testamento bíblico é apresentado de forma gnóstica como um Demiurgo – ciumento, rancoroso e vingativo. O filme desperta protestos de teólogos e cristãos sobre essa visão tão sombria de Deus: “Como um Moisés horrorizado pode acompanhar o Senhor?”.


Título: Êxodo: Deuses e Reis

Diretor: Ridley Scott

Plot: A história de Moisés já ganhou as telas em diversas oportunidades, do clássico Os Dez Mandamentos de Cecil B. De Mille com Charlston Heston em 1956 até a animação O Príncipe do Egito da Dreamworks em 1998. A histórica e bíblica jornada do profeta Moisés, o mais importante do judaísmo, responsável pela libertação do povo hebreu do regime de escravidão no Antigo Egito, governado pelo Faraó Ramsés. Moisés guiou seu povo através de um êxodo que cruzou desertos e o Mar Vermelho e, segundo a Bíblia, recebeu do próprio Deus  no alto do Monte Senai as Tábuas da Lei, contendo os Dez Mandamentos.

Por que está “Em Observação” – A crítica especializada, e principalmente críticos de cinema com um viés teológico, tem chamado a atenção para a representação de Deus no filme Êxodos: ao lado dos reis, o Deus de Abraão, Isaac e Jacob é o verdadeiro vilão! Ao contrário de Noé (2014) de Aronofsky que aborda a figura de Deus com “perspicácia hermenêutica” e “discernimento sutil”, o Deus “Yahweh” dos judeus é personificado na figura de um menino de 11 anos (Malak) antipático, sem sorrisos, um adolescente impertinente, sanguinário, vingativo e pirralho.


Essencialmente, todos no filme  parecem horrorizados com o Senhor. E isso inclui o próprio Moisés. Enquanto Moisés tenta libertar o povo hebreu com táticas de estratégia militar de insurgência, Deus literalmente zomba de seus esforços – o mais eficiente é o autêntico terrorismo. E por isso, Deus desencadeia pragas que culminam na morte de todos primogênitos egípcios, sejam plebeus ou nobres. Tudo parece fugir do controle das mão de Moisés.

“Que tipo de Deus faz isso? Que tipo de fanático segue esse Deus?”, protesta o faraó. Para muitos críticos, essa é a própria voz do diretor que, como no filme Prometheus (2012), desenvolveu toda uma narrativa sobre a jornada de cientistas que vão ao mais distante planeta para encontrar os criadores da espécie humana – para descobrir que nada mais são como deuses que enlouqueceram, tal qual demiurgos psicopatas.

Ridley Scott é ateu? Os melhores filmes religiosos na história do cinema foram feitos por diretores ateus ou, no mínimo, céticos em relação à religiosidade. Mas nesse filme pode haver algo mais.

Ao longo do filme as funções proféticas de Moisés parecem que são diminuídas: os eventos sugerem sempre uma justificativa plausível naturalista – Moisés encontra Malak (Deus) após um golpe na cabeça (alucinação?); a abertura do Mar Vermelho é contabilizado como a dramática drenagem do mar causada pela proximidade de um tsunami que permitiria a passagem do povo hebreu e mataria posteriormente o exército egípcio logo atrás; as pragas do Egito poderiam ter relações de causa e efeito – se o rio Nilo se transformou em sangue, os peixes morreram e as rãs naturalmente foram expulsas para a terra. Depois moscas, gado doente e peste podem ser plausivelmente conectados.

Para o Gnosticismo, o Deus do Velho Testamento é o Demiurgo, um deus inebriado de poder, rancoroso, ciumento e vingativo. Isso parece ser reforçado pelas opiniões dos analistas que veem no filme uma relação tensa e conflituosa entre Deus e Moisés: “Tenho notado que você nem sempre concorda comigo... mas ainda assim estamos aqui conversando”, diz Malak a Moisés enquanto os Dez Mandamentos são esculpidos na pedra.

“Como um Moisés horrorizado pode acompanhar o Senhor?”, indaga o teólogo Brian Mattson em seu blog,  numa análise fílmica misturada com exegese do livro bíblico do Êxodos.

O fato é que o blog Cinegnose passou a se interessar por esse filme para análise mais aprofundada por dois motivos: além da recorrência de elementos gnósticos nas produções hollywoodianas, observa-se em filmes como Noé, Êxodo e ainda os que serão lançados proximamente (Gods and Kings de Ang Lee, The Redemption of Caim e Mary, Mother of God com Ben Kingsley) uma tendência de produções que fazem releitura da própria Bíblia por um ponto de vista gnóstico; e a o tema recorrente em Ridley Scott: por assim dizer, morte dos deuses - Blade Runner (o criador dos replicantes que não podia resolver o problema da mortalidade), Alien (a empresa demiurga que trai a tripulação) e Prometheus (a descoberta de que nossos criadores não passam de deuses enlouquecidos).

O que esperar - Este é o primeiro retrato de Deus que eu já vi em que parece que Ele merece uma boa palmada”. (Christopher Orr, do The Atlantic).

Como uma interpretação ficcional, de grande orçamento, em 3D, da jornada de Moisés,Êxodo: Deuses e Reis é espetacular”. (Richard Roeper, do Chicago Sun-Times).

Espetacular e surpreendente como seria de se esperar de Scott. Sua incerteza espiritual - e falta de triunfalismo - talvez negue uma conclusão catártica e satisfatória à obra, mas também contribui para construir uma obra bíblica verdadeiramente moderna”. (Nev Pierce, da Empire).

Scott dirige em uma escala adequadamente bíblica e fundamenta seu espetáculo nas ótimas interpretações de Bale e Edgerton”. (Jamie Graham, da Total Film).


É possível acompanhar um filme, catalogando mentalmente seus absurdos, e ainda sair deslumbrado da sessão? Porque isso resume muito bem a minha experiência de assistir ao espetáculo visual de Ridley Scott Êxodo: Deuses e Reis, um épico exagerado do Velho Testamento, que é, essencialmente, Gladiador com Deus”. (Chris Nashawaty, da Entertainment Weekly).

Leia a análise completa do filme: A Humanidade está no fogo cruzado entre deuses e reis no filme "Êxodo"

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