segunda-feira, fevereiro 01, 2016
Três evidências de que o zika vírus é uma "Operação Pandemia" midiática
sábado, setembro 26, 2015
Muito além da exploração da fé no documentário "O Capital da Fé"
sábado, outubro 11, 2014
"Jogo de Cena" embaralha cartas da ficção e do real
sábado, agosto 23, 2014
A linguagem da sedução do nazismo em "Hitler's Hit Parade"
quarta-feira, março 26, 2014
Revisitando o documentário "Muito Além do Cidadão Kane"
quinta-feira, março 20, 2014
Documentário "O Abraço Corporativo": o jornalismo está nu
quinta-feira, janeiro 30, 2014
Crianças chiliquentas e pais frágeis no documentário "Crianças Consumidoras"
domingo, setembro 29, 2013
De Hitler aos Hippies: a Kombi no cinema em dez filmes
terça-feira, julho 09, 2013
O documentário "Pax Americana" e o caso Edward Snowden
quinta-feira, maio 30, 2013
"Argo" e "Ghost Army": a simulação uniu Guerra e Cinema
sexta-feira, abril 05, 2013
A arquitetura subliminar de Victor Gruen no documentário "Gruen Effect"
sábado, fevereiro 23, 2013
O evangelho do capitalismo tardio no filme "Rede de Intrigas"
sábado, janeiro 07, 2012
Filme "Margin Call" despolitiza Crise Financeira
quinta-feira, março 24, 2011
Documentário "Trabalho Interno" faz Crítica Moralista Sobre os Fatores que Desencadearam a Crise Financeira Global de 2008
“Trabalho Interno” de Charles Ferguson segue uma tendência pós-atentados de 11 de setembro de filmes críticos em relação aos fatos políticos e econômicos ocorridos nos EUA desde então. "Syriana" (2005), "O Senhor das Armas" (2005) e "Fahrenheit 11 de Setembro" (2004) de Michel Moore são alguns exemplos. Ao ganhar o Oscar de melhor documentário, Hollywood premia essa tendência que, ao longo dos anos finais do governo Bush, serviu para a preparação de terreno para os novos tempos de governo democrata que estava por vir, agora iniciado com a eleição de Barack Obama.
segunda-feira, março 07, 2011
Documentário “O Século do Ego”: cartografias da mente de um sujeito fractal
quinta-feira, fevereiro 04, 2010
"Somos Todos Um": o totalitarismo por trás do humanismo New Age
“Se o sentido da vida existisse não estaríamos formulando essa pergunta”(T. Adorno)“Às 6:45 A.M. em 13 de Abril de 2002 um pai de meia idade de três filhos do centro-oeste dos Estados Unidos desperta de um sono profundo com uma estranha idéia de fazer um filme independente explorando a questão do sentido da vida”. Assim inicia o documentário “Somos Todos Um”. Com o apoio da esposa Diane e a e a participação de alguns amigos, Ward Powers organizou um questionário com "as maiores perguntas relativas à vida, a todo tipo de pessoas" (perguntas como “para onde vamos quando morremos?”, Por que estamos aqui? etc.) com o grandioso objetivo de demonstrar a "unicidade da humanidade".
O que começou como brincadeira logo ganhou força, com a participação de líderes religiosos, arquitetos sociais, místicos, monges, ateus, nobres e filósofos, representando uma gama completa de tradições espirituais, num amálgama de opiniões que se fundiam às do povo nas ruas. Todos receberam 20 perguntas sobre questões profundas como o sentido da vida, o conceito de Deus, o motivo do sofrimento e a justificativa da guerra.
A questão que inicia e sustenta todo o documentário (qual o sentido da vida) lembra a fala de Theodor Adorno: “Se o sentido da vida existisse não estaríamos formulando essa pergunta”. Essa resposta de Adorno no seu livro Dialética Negativa é mais do que uma afirmação irônica ou retórica. Há um sério pressuposto crítico nessa afirmação: a imanência desse discurso que pretende se perguntar sobre o sentido da existência. Isto é, essa pergunta não é “desinteressada” ou neutra, mas parte de uma ideologia historicamente determinada. A pergunta já contém em si a resposta que procura.
A questão sobre o sentido da vida parte do pressuposto de todos os discursos totalizantes e totalitários: quem formula a questão ignora o sentido da vida. Sua ignorância decorre do fato de o emissor ser um simples indivíduo, sendo que a verdade lhe escapa, pois está no TODO. Desgraçadamente pelo fato do indivíduo ser uma pequena parte, nunca apreenderá a verdade pois ela está além do particular, está na totalidade. Portanto, essa questão reproduz as velhas dualidades da Teologia, matriz tanto da Religião quando da Ciência: parte/todo, particular/universal, matéria/espírito e assim por diante.
Se a Verdade está no Todo (Absoluto, Espírito, Infinito etc.) o indivíduo só pode ser ignorante por não conseguir apreender as conexões em torno dele. O documentário “Somos Todos Um” bate exaustivamente nessa mesma tecla: a experiência individual é a fonte dos erros e conflitos (medo, egoísmo, materialismo) que impedem a paz mundial e a revelação da Unidade. O pressuposto teológico é que essa insuficiência individual decorre ou pela imersão do espírito na matéria (pecado) ou pela ignorância das conexões do todo, somente esclarecidas por um discurso “técnico” (espiritualista ou científico).
O desprezo pelo indivíduo e o potencial perigosamente totalitário pode ser percebido em frases do documentário como essa: “Qual o sentido da vida? Você começa a lembrar e começa a ver...as nebulosas do pensamento, moléculas e átomos nascendo...essa teia dourada da vida. É silencioso, é eterno, é cintilante. Você e eu não passamos de uma tapeçaria de sonhos.”
Nessas afirmações parece haver o esforço de construir um novo paradigma de união entre Religião e Ciência que acabaria com todos os dualismos (afinal, o discurso utiliza termos científicos como “nebulosas”, “moléculas” e “átomos” ao lado de termos místicos como “eterno”, “cintilante”), mas o problema é falso. Ciência e Religião secretamente já estão unidas há muito tempo a partir da mesma matriz teológica que liquida a experiência individual como fonte de erro, insuficiência ou pecado.
O momento de verdade
Mas, parafraseando Adorno, em toda ideologia há um momento de verdade. Essa angústia pelo sentido da vida é real. Se a pergunta é formulada é porque a percepção de um sentido desapareceu ou nunca existiu. Tal angústia é um sintoma da dor e do sofrimento que essa totalidade (social, histórica ou espiritual) impõe ao indivíduo, e não o contrário – pelo anseio por uma transcendência à totalidade.
O mal-estar do indivíduo nesse mundo é desprezado por esse discurso espiritualista (na verdade uma teologia secularizada) como medos que limitam o potencial espiritual. É a mensagem de todos os vídeos de auto-ajuda ou espiritualistas: liberte-se de si mesmo e venha para o TODO. Dessa forma é descrito como se inicia uma jornada espiritual pelo padre Thomas Keating, líder do Movimento Interdenominacional para revitalizar a prática contemplativa cristã:
“O início da jornada espiritual é o reconhecimento...não apenas a informação, mas a real convicção interior..de que há uma força superior, ou Deus. Ou, para facilitar ao máximo para todos...de que há um Outro, com "O" maiúsculo. Segundo passo: tentar se tornar o Outro. Ainda com "O" maiúsculo. E finalmente, o reconhecimento de que não há Outro. Você e o Outro são um só. Sempre foram. Sempre serão.Você simplesmente acha que não é.”
À dor e sofrimento concretos nesse mundo, esse discurso oferece a racionalização e o desprezo pela percepção individual: você com sua dor não existem! Venha para o Todo e esqueça seus problemas mesquinhos!
Porém esse todo não é algo tão rarefeito ou metafísico. Tem uma identidade bem concreta: é o meio corporativo por trás da Globalização política e financeira, os principais consumidores interessados por esses tipos de vídeo, para aplicar em estratégias motivacionais em grupos de dirigentes a vendas. Tal como Deepak Chopra (entrevistado em “Somos Todos Um”): de místico e filósofo a um dos principais palestrantes motivacionais em organizações nos EUA.
Somente uma Dialética ou Teologia negativas podem se contrapor a essa teologia secularizada: fazer justiça à verdade da dor e sofrimento do indivíduo ao conseguir inverter o sentido da transcendência – não é do todo para a parte. Ao contrário, é a carne, a parte, o singular que aspiram à transcendência. Ou, como conclui emblematicamente Adorno, “ O que há de doloroso na dialética é a dor em relação a este mundo, elevada ao âmbito do conceito"
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domingo, dezembro 13, 2009
Pesquisa da Pós em Cinema da UAM apresenta religiosidade no cinema documental
Participei neste último sábado (12/12) de uma banca examinadora do trabalho de conclusão da pós lato sensu em cinema da Universidade Anhembi Morumbi. O trabalho era de Vivian Cristina Cardozo com o tema “Da Tragédia Moderna ao Jogo de Representação no Documentário Jogo de Cena de Eduardo Coutinho”. A apresentação oral de Vivian apenas confirmou-me o que senti na leitura do trabalho: uma potencial discussão sobre a presença da religiosidade e do sagrado no audiovisual.
Vivian inicia fazendo um histórico das transformações do conceito de tragédia na arte dramática: das trajetórias dos personagens míticos da antiguidade, passando pelas tragédias medievais e elizabetanas (momento de transição do herói coletivo para o herói indivíduo) até chegar a tragédia na Modernidade. Temos, então, um novo modelo estético ficalizado na angústia, sofrimentos e dilemas individuais. A Justiça é algo abstrata, restando ao homem isolado no mundo apegar-se à “religiosidade” para fazer frente à experiência da morte e da perda.
Vivian vai localizar este componente no documentário de Eduardo Coutinho Jogo de Cena, onde 23 mulheres relatam seus acontecimentos trágicos, “pequenas tragédias pessoais de mulheres comuns, que tentaram resgatar suas próprias histórias por meio da experiência audiovisual.”
O interessante é a aproximação que autora faz entre o foco trágico de Coutinho com elementos narrativos auto-reflexivos: atrizes que interpretam as protagonistas reais e que, mais tarde, falam para a câmera a dificuldade que tiveram para interpretar o papel, narrativa que incorpora elementos cênicos típicos do teatro etc. O jogo de representação de Coutinho (atrizes, cenários, visão frontal do espectador e personagens reais) cria situações ambíguas: ao entrar uma pessoa em cena, o espectador não sabe se é uma entrevistada ou atriz. O objetivo é produzir distanciamento, reflexão sobre as histórias contadas.
O resultado da pesquisa de Vivian foi a produção de um pequeno documentário dirigido pela autora, Aquarius, onde em aproximadamente 10 minutos vemos o depoimento de duas atrizes sobre experiências de perda e morte (também experimentados na vida pessoal da autora). Temos aqui o apego à “religiosidade”: sonhos que o papel volta para se despedir, a gravidez de uma das atrizes contrapondo-se com a morte (morte/renascimento) etc.
Cena de "Aquarius"
Que experiência “religiosa” é essa? Com certeza não uma religiosidade cristã tradicional, mas uma experiência muito mais mística do que propriamente religiosa. Faz parte da tragédia na Modernidade: isolado em um mundo aparentemente sem sentido, dominado por uma percepção de Justiça fria, distante e abstrata, o indivíduo apega-se a fragmentos de religiosidade como verdadeiras bóias para enfrentar a corrente. O resultado é uma percepção muito mais mística do que religiosa. Estamos nos aproximando de um espírito gnóstico de percepção do sagrado. É o componente central da Tragédia na Modernidade.
Tal qual a literatura Romântica dos séculos XVIII e XIX que experimentou a insuficiência da linguagem em representar esta natureza trágica da Modernidade, temos no pequeno documentário Aquarius de Vivian e em Jogo de Cena de Coutinho o recurso da IRONIA como forma de refletir esses limites da representação. Isto é, a única forma de representar através de um documentário esta natureza trágica do indivíduo e o seu apego a um misticismo gnóstico é através de uma narrativa irônica: assim como a realidade é uma ilusão ou, no mínimo, carece de um sentido imanente, da mesma forma a narrativa fílmica é ilusão e ambiguidade, exigindo do espectador distanciamento para desvelar os véus do ilusionismo cinematográfico.