sábado, março 11, 2017

A fronteira final: neoliberalismo vai ao espaço com Elon Musk


“O Espaço, a fronteira final...”. Os leitores devem conhecer a introdução dos episódios da série Jornada nas Estrelas. Mas dessa vez, não teremos o Capitão Kirk ou o Sr. Spock. Mas o jovem empresário Elon Musk que promete com a empresa SpaceX levar turistas para dar volta na Lua e colonos para Marte e além. Cientistas e operadores de Wall Street o qualificam como alguma coisa entre “fraude” e “máquina de queimar dinheiro”, embolsando verbas públicas enquanto faz intrincadas manobras societárias com suas empresas como a Tesla Motors e a SolarCity. Em muitos aspectos lembra a trajetória do ex-oitavo homem mais rico do planeta, Eike Batista. Mas a retórica de Musk enche os olhos da grande mídia: é o “Tony Stark da vida real”, pronto para provar como os velhos valores do capitalismo (competição e mercado) podem ser combinados com economia sustentável e “tecnologias limpas” do século XXI. Ele promete levar o neoliberalismo à última fronteira. Mais do que ninguém, Elon Musk sabe como são voláteis as fronteiras entre a especulação do mundo das finanças e da mídia.

quinta-feira, março 09, 2017

O suicídio ao vivo de uma estrangeira em "Christine"


Em 15 de julho de 1974, ao vivo, no Canal 40 de Sarasota, Flórida, a jornalista investigativa Christine Chubbuck leu uma breve nota. Sacou um revólver, colocou atrás da orelha e puxou o gatilho. O filme "Christine" (2016) busca o porquê esse histórico suicídio diante das câmeras procurando fugir dos tradicionais clichês: depressão, solidão, frustração profissional diante das pressões do sensacionalismo televisivo, machismo e misoginia que dominavam as redações nos anos 1970 etc. “Christine” se desvia dessas armadilhas narrativas ao privilegiar uma abordagem mais existencial e gnóstica: há uma constante e insuperável sensação de deslocamento e alienação de uma personagem que não encontra lugar nesse mundo, muito além de ideologias, profissão e vida pessoal. Christine sempre foi uma Estrangeira mesmo nos ambientes mais familiares porque sempre pressentiu que estava em um jogo cujo propósito ela nunca entendeu. Filme sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende.

terça-feira, março 07, 2017

Curta da Semana: "Night Mayor" - Aurora Boreal, Nikola Tesla e a energia livre


Quando pensamos em Modernidade o que lembramos? Tecnologia, velocidade, capitalismo, urbanidade, eletricidade, o cinema. Um verdadeiro turbilhão para onde somos transportados quando assistimos ao curta “Night Mayor” (2008) do canadense Guy Maddin. Misturando o atual estilo do falso documentário (mockumentary) com a linguagem e fotografia do cinema mudo, Maddin nos conta a história de um inventor bósnio que em 1939 descobriu no Canadá que a Aurora Boreal é na verdade constituída por melodias e imagens. E que poderiam ser transmitidas livremente pelas linhas telefônicas através do “Telemelodium”. Mas o governo não vai gostar muito dessa invenção... O curta é uma pequena obra-prima claramente inspirado no inventor croata Nikola Tesla que pagou com a própria vida uma descoberta feita em 1899 que poderia colocar em risco o Capitalismo: a energia livre.

segunda-feira, março 06, 2017

O Barão de Munchausen, reforma da Previdência e a lógica do refém


O material de propaganda do PMDB cujo slogan é “Se Reforma da previdência não sair, tchau Bolsa Família, adeus Fies, sem novas estradas, acabam programas sociais”, mais do que desespero de um governo que corre contra o relógio (Lava Jato e Eleições 2018) revela a natureza do Estado contemporâneo: o terrorismo e a lógica do refém. Se antes o terrorismo era restrito a territórios como aeroportos e embaixadas, agora tornou-se prática de governo: todos nós somos reféns sob a estratégia da chantagem dos rombos e dívidas que se transforma na nova função do Estado. Lógica que se sustenta em um mito, assim como aquele que o Barão de Munchausen, no filme clássico de Terry Gilliam de 1988, destruiu: não existem exércitos turcos por trás dos muros que mantém a cidade submissa pelo medo e a ignorância.

sábado, março 04, 2017

"Terminus": o sci-fi que anteviu Era Trump


O EUA empreendem o Projeto Terminus de ocupação permanente do Irã por tropas americanas. O que só faz aumentar a tesão diplomática com Rússia e China, disparando a contagem regressiva para uma guerra nuclear. Enquanto isso um estranho meteorito cai em uma cidadezinha no interior dos EUA, onde vivem desempregados e veteranos da guerra no Irã, amputados e paralíticos, que lutam para sobreviver em meio a depressão econômica. Este é o sci-fi australiano “Terminus” (2015) sobre um futuro próximo que poderia muito bem ser o presente. Um filme que representa mais um sintoma do crescente sentimento anti-Globalização – a percepção de que enquanto sofremos no dia-a-dia para conseguir tocar as nossas vidas, lá em cima os poderosos tramam a nossa própria destruição em seus jogos de guerras e das altas finanças. Em 2015, “Terminus” antecipou o mal-estar que criaria muitos subprodutos, assim como a atual Era Trump.

quinta-feira, março 02, 2017

O homem se tornará irrelevante diante de algoritmos e aplicativos?


Em uma entrevista para a "Wired Magazine", o historiador e escritor Yuval Harari alertou para o perigo da humanidade em pouco tempo se tornar “irrelevante” e “redundante” diante dos avanços da Inteligência Artificial. Dessa vez, não mais através das distopias como a do computador HAL 9000 que tenta matar a tripulação de uma nave no filme “2001” ou por replicantes que perseguem um policial no filme “Blade Runner”. Mas agora por meio dos aplicativos e algoritmos que “compreendem melhor nossos desejos e sentimentos do que nós mesmos”. Porém, o discurso de Harari atira no que vê e acerta no que não vê – só podemos achar que os algoritmos são realmente inteligentes se o próprio homem rebaixar ou tornar mais flexível o conceito de “inteligência”. A fala de Harari faz parte de uma nova narrativa publicitária das corporações tecnológicas: projetar para o futuro distopias que sempre fascinaram a humanidade por toda a História: ver a si própria substituída por duplos tecnológicos como reflexos em espelhos, fotografias, frankensteins, golens, robôs, replicantes e, agora, aplicativos.

terça-feira, fevereiro 28, 2017

"Envelopegate": por que "La La Land" não ganhou o Oscar de Melhor Filme?


O que há por trás do chamado “Envelopegate”, a histórica gafe da troca dos envelopes de premiação do Melhor Filme no Oscar 2017? Certamente, “La La Land” era o favorito da crítica especializada, consciente da lógica da premiação da Academia de Cinema na última década da Era Obama. O seu anúncio foi um “ato falho” cometido por uma empresa (a PricewaterhouseCoopers - PwC) cujo auditor minutos antes postava fotos dos bastidores da cerimônia no Twitter. Ironicamente, uma das empresas responsabilizadas em 2008 pela crise financeira por ter sido “desconcertadamente negligente”. Se Hillary Clinton tivesse ganho as eleições, e junto com ela o “neoliberalismo progressista”, assistiríamos à vitória de “La La Land”. Mas “Moonlight: Sob a Luz do Luar” foi a premiação “the last minute rescue” que serviu de bala para o canhão apontado diretamente na cara de Donald Trump. E o pior é que, ao contrário dos roteiro de filmes hollywoodianos, nessa história não há fronteiras que separem os mocinhos dos bandidos.

domingo, fevereiro 26, 2017

História do beijo do Kama Sutra a Hollywood


O cinema não inventou o beijo. Apenas o tornou mais icônico nas relações dos amantes. Porém, Hollywood deu continuidade a uma, por assim dizer, ocupação semiótica da boca e do beijo atribuindo a eles novas representações simbólicas de velhos significados: distinção de classes, de gêneros e substituto do ato sexual. Da mesma forma, o hindu “Kama Sutra” não inventou o beijo, mas atribuiu a ele a comunhão erótica que o Ocidente fez questão de reprimir e controlar desde os persas e romanos, submetendo-o à ordem do Poder. No cinema, o beijo transformou-se na alienação do desejo ao submetê-lo ao espectador voyeur que, com a boca aberta, também espera o beijo. Porém, a pipoca sublima a compulsão enquanto nos filmes atuais ou o beijo se submete à performance e eficácia ou à reconciliação dos casais diante do apocalipse nos filmes-catástrofe.

sábado, fevereiro 25, 2017

Uma jornada espiritual felina em "Virei um Gato"


Apesar de contar com dois vencedores do Oscar (Kevin Spacey e Christopher Walken) a comédia romântica familiar “Virei um Gato” (Nine Lives, 2016) foi destruída pela crítica: o que esses atores consagrados estão fazendo nessa catástrofe? Eles devem ter contas pesadas para pagar! Mas para o Cinegnose esse filme é um trunfo que confirma uma tese: desde que o Gnosticismo deixou de ser uma exclusividade de filmes cults e foi adotada pelos filmes populares a partir dos anos 1990, os elementos gnósticos deixaram de figurar apenas em sci-fis e dramas cerebrais, para também incursionar em comédias, thrillers e outros gêneros. Por trás de camadas de clichês de uma comédia popular, “Virei um Gato” nos conta a narrativa gnóstica de transformação íntima através da jornada espiritual no corpo de um gato e, principalmente, por um “salto de fé” ao mesmo tempo literal e simbólico, a exemplo de filmes gnósticos mais sérios como “Vidas em Jogo” (1997) e Vanilla Sky (2001).

quinta-feira, fevereiro 23, 2017

Fissuras no monopólio da Globo: Atletiba, blocos de rua e impeachment no Corinthians


O muro do monopólio da Rede Globo está trincando. Nos últimos dias, uma série de fissuras começaram a surgir: o histórico cancelamento do clássico Atletiba como reação ao monopólio das transmissões esportivas da emissora; o impeachment mal sucedido no Corinthians, no ápice de recorrente pauta negativa da emissora envolvendo a arena do Itaquerão; e o crescimento exponencial do carnaval de blocos, atraindo verbas publicitárias que migram do sambódromo para as ruas, ameaçando um dos principais produtos oferecidos pela emissora ao mercado. Por trás dessas fissuras estão tecnologias de convergência, mídias sociais, empreendedorismo e competição. Tudo aquilo que o telejornalismo e colunistas globais raivosamente defendem como o futuro ético para o País. Mas que, na prática, o monopólio tautista da Globo foge, assim como o diabo foge da cruz. 

terça-feira, fevereiro 21, 2017

Comercial vende carro e ética na política detonando bomba semiótica


Bombas semióticas 2, A Missão! O Império Contra-ataca! Após as recentes pesquisas revelarem que Lula está mais vivo do que nunca, liderando com folga todos os cenários eleitorais para 2018, e que ainda seus principais adversários estão se desgastando com a evaporação do mar de rosas que, acreditava-se, seria o País pós-impeachment, o complexo jurídico-midiático reage. Depois de novos vazamentos seletivos e busca de mais espécimes assustadores do “Brasil profundo” para figurar na capa de revistas semanais, retiram mais uma vez do paiol midiático a artilharia pesada das bombas semióticas. Dessa vez, em um comercial para TV da GM Brasil no qual se posiciona sobre temas como “ética” e “política” para vender o novo Chevrolet Cruze.  Mais uma vez, a tática de engenharia de percepção – por meio de gestalt, cores e a palavras metonimicamente contaminadas, bombas semióticas criam um pano de fundo para tornar mais crível o cenário político do momento. Reforçam subliminarmente pautas, slogans e clichês disseminados liminarmente pela grande mídia. Um exemplo de como a criação publicitária torna volátil a fronteira entre consumo e cidadania.

domingo, fevereiro 19, 2017

Curta da Semana: "The Crossing" - os subterrâneos do terror


Uma mulher tenta desesperadamente ligar para seu namorado, sentindo-se culpada por um desentendimento que poderá colocar fim na relação. É tarde da noite, e ela desce as escadarias de uma passagem subterrânea para, lá dentro, encontrar o Mal. Ou a si mesma. Esse é o curta russo “The Crossing” (2016) que explora um dos temas preferidos do terror: os subterrâneos. Porões, metrôs, garagens subterrâneas, tuneis etc., ao mesmo tempo que nos fascinam, também nos apavoram. O medo que pode ser tanto interpretado como um arquétipo gnóstico (a metáfora da condição humana prisioneira nesse mundo), como compreendido pelo viés psicanalítico: nos subterrâneos está o nosso inconsciente – culpas e traumas dos quais queremos nos livrar. Mas o reprimido sempre retorna, transformado em monstros e pesadelos.

sábado, fevereiro 18, 2017

Por que o mundo tem que acabar?


Diariamente o mundo acaba diante dos nossos olhos, seja no cinema na atual safra de filmes-catástrofe, em séries de TV sobre Nostradamus, previsões “científicas” de algum tipo de futura catástrofe ambiental ou em algum “hoax” descrevendo cometas, asteroides ou planetas errantes que cairão sobre a Terra. A última, foi sobre um pedaço do Planeta X que supostamente cairia no último dia 16. Por que o mundo tem que ser destruído? No passado, todas religiões possuíam uma Escatologia: alguma narrativa sobre o fim dos tempos onde os maus seriam punidos e os bons salvos. Mas essas religiões se tornaram “líquidas”: sob os escombros das antigas religiões salvacionistas viraram pastiches que se rendem ao utilitarismo das necessidades do presente: “teologia da prosperidade”, “cabala do dinheiro” ou o islamismo dos homens-bomba. Esqueceram-se do futuro. Por isso, essa nova religião “líquida” e ecumênica precisa criar uma nova Escatologia, uma narrativa midiática sobre o “fim dos tempos” que junte convicções eco-ambientais, geofísica e astrofísica. A “Neoapocalíptica” como estratégia de marketing.

quinta-feira, fevereiro 16, 2017

Abelhas, ocultismo e TV em "Wax or The Discovery of Television Among The Bees"


O primeiro filme feito para a Internet que estava apenas começando e produzido numa inédita ilha de edição não-linear. No longínquo ano de 1991 o diretor David Blair produziu “Wax or The Discovery of Television Among The Bees” um estranho filme  para cinéfilos corajosos o suficiente para se aventurar em bizarrices hipertextuais sobre abelhas da Mesopotâmia, ocultismo esotérico, histórias da Bíblia, Guerra do Iraque e simuladores de voo militar da NASA. Esse filme independente é um documento histórico da motivação tecnognóstica e esotérica que sempre esteve por trás do desenvolvimento da ciência computacional, ciberespaço e cibercultura. Em tom de documentário, Blair conta a história do neto de um entusiasta de uma sociedade dedicada à comunicação com os mortos, engenheiro de software na base de mísseis de Los Alamos, EUA, que cria uma conexão mística com abelhas (através da “BeeTV”). Para depois ser transportando para uma dimensão mística (o ciberespaço?) na qual verá a Guerra do Iraque sob o ponto de vista do carma e reencarnação... e receberá uma importante missão.

terça-feira, fevereiro 14, 2017

A celebração da troca do desejável pelo possível em "La La Land"


Por que “La La Land - Cantando Estações” é o grande favorito ao Oscar? Porque está sintonizado com o espírito do tempo desse início de século: nostálgico, vintage, metalinguístico e com um amargo realismo. O filme capta a essência do gênero musical clássico, levando o clichê de “quebra e retorno a ordem” (pessoas que dançam, cantam e sonham, mas que depois voltam à realidade como se nada tivesse acontecido) ao limite. A nostalgia pela era de ouro de Hollywood e do jazz são o consolo para um casal que vê seus sonhos desapontados. Misturando alusões a filmes musicais clássicos, “La La Land” é uma fábula de como o amor nos dá força para realizar o possível. Mas, ao mesmo tempo, pode entrar na contabilização dos sacrifícios de termos perdido tudo aquilo que era desejável.

domingo, fevereiro 12, 2017

Sete filmes que anteviram a crise da segurança no Espírito Santo


O cinema e o audiovisual parecem ter o estranho poder de prever cenários futuros: a eleição de Donald Trump, o atentado ao WTC em 2001, o atentado na Maratona de Boston em 2013, a hegemonia econômica da China etc. em filmes e séries como “”Os Simpsons, “Americathon” ou “Lone Gunmen”. No auge do neoliberalismo de Reagan e Thatcher nos anos 1980, filmes como “Robocop” e “Max Headroom” apresentavam futuros distópicos, efeitos colaterais das políticas de austeridade e privatizações que agora acompanhamos ao vivo nas ruas do Estado do Espírito Santo – no vazio do poder público sucateado, as ruas são dominadas por crimes, saques e assassinatos. O Exército chegou para ocupar as ruas. Mas será que o próximo passo, seguindo a cartilha neoliberal, é a privatização das forças de segurança, assim como a OCP (“RoboCop”), MNU (“Distrito 9”), Tetravaal (“Chappie”) ou a NYPC (“From The Future With Love”)? Acompanhe a lista de sete filmes que anteviram cenários futuros nos quais o Brasil está entrando.

sábado, fevereiro 11, 2017

Em "Black Mirror" a tecnologia é espelho sombrio de nós mesmos


A narrativa corporativa e publicitária sobre as tecnologias da informação sempre foi a da “estrada para o futuro”, uma estrada que supostamente nos conduzirá ao paraíso da comodidade, no qual todo conhecimento  que necessitarmos estará ao alcance de um clique ou de um toque na tela. Mas a série britânica Black Mirror (2011- ) vai na contra mão: sem ser tecnofóbica, mostra futuros próximos, mas estranhamente atuais, onde paradoxalmente a tecnologia evoluiu tanto que atingiu um ponto de inutilidade e disfuncionalidade. Os seis episódios da terceira temporada de 2016 mostram o “vanish point” de gadgets como mídias sociais, realidade aumentada, dispositivos móveis e games: o ponto de viragem tecnológico no qual a racionalidade se converteu em mal estar psíquico, crime, ódio e anomia. A expansão das redes de informação foi muita mais rápida que a produção de conteúdo (conhecimento). E a lacuna foi preenchida por espelhos sombrios de nós mesmos.

quarta-feira, fevereiro 08, 2017

Os mortos da escravidão ainda assombram o Brasil em "O Diabo Mora Aqui"


“O Diabo Mora Aqui” (2015), de Dante Vescio e Rodrigo Gasparini, filia-se a uma nova safra de filmes de terror brasileiros como “Quando Eu Era Vivo”, “Trabalhar Cansa” e “Mar Negro” – produções nacionais que procuram uma terceira via entre a paródia e o “filme de arte”: filmes com “cara de cinema” por seguirem as convenções do gênero, porém com uma abordagem brasileira com folclore, religiosidade e lendas urbanas nacionais. Filmes que revelam a essência do gênero do terror, principalmente o “exploitation”: um atalho para o inconsciente coletivo de um país e de uma cultura. No caso de “O Diabo Mora Aqui”, com a clássica narrativa de jovens em uma fazenda num lugar remoto no interior de São Paulo que sem querer libertam o Mal, revela como o Brasil supostamente moderno e globalizado ainda é assombrado pelos fantasmas do seu inconsciente coletivo: o passado escravocrata que não consegue ser redimido condenando-nos ao ciclo vicioso de ódio e autodestruição.

segunda-feira, fevereiro 06, 2017

"Medo e Delírio em Las Vegas" faz acerto de contas com a utopia psicodélica


"Medo e Delírio em Las Vegas” (Fear and Loathing in Las Vegas, 1998) foi o início do acerto de contas do diretor Terry Gilliam com a sua geração (a utopia psicodélica de que as drogas abririam as portas da percepção nos libertando de realidades opressivas), encerrado com o filme “Contraponto” (Tinderland) em 2006. O filme baseou-se no livro homônimo  de Hunter Thompson, o marco do chamado “Jornalismo Gonzo” no qual a ficção seria mais poderosa do qualquer tipo de reportagem objetiva. Mas parece que toda uma geração esqueceu do alerta do escritor maldito Charles Bukowski: atualmente a realidade supera qualquer imaginação literária. Como centro espiritual de uma cultura planetária, Las Vegas incorporou (através da tecnologia) todos os delírios lisérgicos, não mais para libertar, mas agora para fazer as pessoas consumirem e perder dinheiro em mesas de jogos. Mais tarde, toda a indústria do entretenimento colocaria em prática a distopia de Las Vegas. Os heróis lisérgicos dos anos 1960-70 acabaram se transformando em nostálgicos freaks, impotentes diante dos delírios de LSD emulados pelas casas noturnas e raves.

domingo, fevereiro 05, 2017

Curta da Semana: "Being Batman" - o homem que acredita ser o próprio Cavaleiro das Trevas


No começo esse humilde blogueiro achava que o curta “Being Batman” (2016), de Ryan Freeman, fosse mais uma sátira sobre o super-herói. Até perceber que o curta é um documentário com um personagem real que vive na cidade de Brampton, em Ontário, Canadá. Um homem que acredita ser o próprio Batman e que os acontecimentos trágicos da sua vida fizeram-no se conectar sincronicamente ao personagem fictício de Bruce Wayne. Todas as noites Stephen Lawrence sai da sua “batcaverna” a bordo de uma réplica do batmóvel do filme de 1989 de Tim Burton para vigiar as ruas da cidade. No curta “Being Batman” Lawrence dá depoimentos sobre a sua vida como Batman. Mostra sua casa transformada em batcaverna, suas armas e a rotina noturna. Isso não é cosplay: Lawrence diz ser o próprio Batman!

sábado, fevereiro 04, 2017

Para tautismo da Globo Marisa Letícia supostamente morreu


O tautismo (autismo + tautologia) crônico da TV Globo chegou a um nível bizarro e surreal com a “morte” de Dona Marisa Letícia. Enquanto a emissora mostrava imagens de pesar e condolências (minuto de silencio no Congresso e os pêsames de FHC a Lula), a Globo se apegava ao “protocolo de morte encefálica” para adiar em 18 horas o anúncio do falecimento e a palavra “morte”. Uma cobertura, no mínimo, anômala: em se tratando de políticos, celebridades e artistas o "modus operandi" da grande imprensa diante da morte sempre foi o sensacionalismo, ilações e especulações. Por que esse inesperado comedimento, como se repórteres e apresentadores usassem luvas de pelica enquanto pisavam em ovos? No dia 02 de fevereiro, Dona Marisa Letícia estava supostamente morta. Para no dia seguinte a palavra “morte” ser anunciada de forma protocolar. Para quê serviu esse pesar tautista da Globo? Algumas hipóteses: (a) AVC político, (b) Lula vai ser preso, (c) Sebastianismo e Eleições 2018, (d) Tática do diversionismo, (e) Corrente de Esperança.

quinta-feira, fevereiro 02, 2017

Realidade é esquecimento consensual no filme "Os Esquecidos"


Desculpe, caro leitor, o trocadilho involuntário mas o filme “Os Esquecidos” (The Forgotten, 2004) acabou sendo esquecido pela crítica e público. E com razão! Foi um filme que explorou elementos clássicos do gnosticismo pop hollywoodiano. Mas naquele momento, a safra de filmes gnósticos revelava filmes muito mais memoráveis como as sequências de “Matrix”, “A Passagem”, “Vanilla Sky” ou “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”. O filme conta com um argumento poderoso (a mãe que lembra do filho morto em um acidente, mas todos ao redor insistem em dizer que a criança jamais existiu), mas o roteiro é inverossímil sem conseguir definir o tom narrativo – alguma coisa entre sci fi, mistério e thriller policial. Apesar disso, “Os Esquecidos” é uma filme didático: mostra como os temas do esquecimento, paranoia e conspirações são articulados dentro de uma narrativa gnóstica. Ecoando filmes clássicos como “Dark City” e “Amnésia” de Christopher Nolan, mostra que a chamada “realidade” pode ser o produto de um esquecimento consensual.

quarta-feira, fevereiro 01, 2017

Eike Batista: Efeito Heisenberg e lixo midiático reciclado


A política brasileira parece estar sendo dirigida pelos misteriosos desígnios das “coincidências”. Os exemplos mais recentes: a morte do ministro do STF Teori Zavascki no Triângulo das Bermudas da política em Paraty e a prisão do pobre homem rico “foragido” Eike Batista, repletos das sempre recorrentes “coincidências” e timings oportunos envolvendo a onipresente TV Globo. Qualquer tentativa de explicar essas “coincidências” (rapidamente definidas pela narrativa midiática como “fatalidades” das “trapaças da sorte”) é logo rotulada como “teoria conspiratória”. Mas o show midiático da “caça” ao “foragido” Eike Batista acrescenta alguns ingredientes a mais: o chamado Efeito Heisenberg, no qual a mídia cobre um evento criado por ela mesma; e o linchamento midiático: depois dos petistas agora são as celebridades, subprodutos da própria mídia. Linchamento que combina entretenimento e expiação da dor e introjeção da culpa pelo fracasso profissional e pessoal de milhões de brasileiros no naufrágio da crise econômica. Mesmo no seu fim, Eike Batista se tornou útil como um lixo midiático reciclável no bode expiatório da vez.

segunda-feira, janeiro 30, 2017

I Ching, Cinema e mundos quânticos na série "The Man in The High Castle"


Qual a relação entre o milenar livro-oráculo "I Ching", o Cinema no século XX e a hipótese dos Múltiplos Mundos da Física Quântica? A busca dessas conexões é o desafio para o espectador que assiste à série da Amazon Studios “The Man In The High Castle” (2015 - ) livremente inspirado no livro do escritor sci-fi gnóstico Philip K. Dick de 1962. Um mundo invertido no qual os países do Eixo (Alemanha, Japão e Itália)  ganharam a Segunda Guerra Mundial e os EUA, destruídos pela Grande Depressão, foram conquistados pelo Reich e o Império do rei Hirohito. Porém, a posse de estranhos rolos de filmes de procedência misteriosa passa a ser politicamente importante tanto para Resistência como para Hitler: neles, outros mundos são revelados. Tal como no I Ching, devemos encontrar o imutável em mundos fugazes e em constante mutação. Mas pode tornar-se uma arma política: o controle do Tempo, passado e futuro de toda a humanidade.

quinta-feira, janeiro 26, 2017

O filósofo Kierkegaard vai a Hollywood no filme "Passageiros"


Por que diante do precipício ao mesmo tempo em que temos medo, também sentimos o impulso de saltar para o fundo do abismo? Em 1844 o filósofo S∅ren Kierkegaard disse que isso deriva da ansiedade da descoberta de sermos livres para saltar ou não saltar. E sempre temos medo daquilo que mais desejamos. “Passageiros” (Passengers, 2016) retoma essas ideias do filósofo dinamarquês, inclusive com a referencia do abismo: só, no espaço sideral, diante do vazio do Universo, o homem teme por descobrir que é livre, como se retornasse ao mito do Paraíso, antes de Adão e Eva terem descoberto a árvore do conhecimento. “Passageiros” é mais uma amostra da recente guinada metafísica de Hollywood sob camadas de entretenimento e efeitos digitais. Assim como a animação “WALL-E” (2008), também faz uma releitura gnóstica do Gênesis bíblico: como o homem, prisioneiro numa gigantesca espaçonave-resort que ruma para a destruição, pode conquistar a liberdade e autoconhecimento.

terça-feira, janeiro 24, 2017

Globo virou black bloc

A Globo ainda tinha a tênue esperança de que delegados dissidentes do Colégio Eleitoral não ratificassem a vitória de Trump. Mas a cerimônia da posse e o discurso “porrada” do presidente arrasaram qualquer sonho dos ainda incrédulos correspondentes da emissora nos EUA. Mais eis que os esquecidos black blocs voltam a ação nas manifestações anti-Trump em Washington, tirando os analistas da emissora da depressão. Entusiasmada, a Globo News até reprisou o documentário sobre os black blocs exibido na época das manifestações de rua em 2013 no Brasil. Agora a Globo assume uma espécie de anarcotautismo: entrar na onda de turbinar as manifestações contra Trump, assim como fez nas manifestações anti-Dilma. Mas o tautismo crônico da sua bolha virtual não consegue perceber os movimentos do “deserto do real” que Trump representa: a crise do “neoliberalismo progressista” que sustenta a ordem da Globalização: o alinhamento perverso entre correntes dos movimentos sociais (feminismo, LGBT, antirracismo, multiculturalismo, entre outros), o setor de negócios baseados em serviços simbólicos e tecnológicos (Vale do Silício e Hollywood) e o capitalismo cognitivo representado por Wall Street e a financeirização.

segunda-feira, janeiro 23, 2017

Curta da Semana: "Help Us" - medo e culpa no altruísmo moderno


Caro leitor, chegou o momento de abrir o seu coração e esvaziar sua carteira para ajudar a curar alguma coisa que está errada com as pessoas desse curta-metragem. “Help Us” (2016), de Joel Cares, lembra aqueles vídeos institucionais de ONGs como Médicos Sem Fronteiras, Save The Children etc. Mas ao invés de vermos flagelados de algum lugar remoto e sem esperança, vemos uma família de classe média pedindo ajuda e o nosso dinheiro. O que há de errado com eles? Um curta que aplica  dissonância cognitiva e o método de comutação para fazer o espectador refletir sobre o destino da velha caridade e humanitarismo que hoje se transformou em “voluntariado” e “ativismo”. Qual a recompensa psíquica que encontramos na velha filantropia profissionalizada pelas ONGs? Qual a relação entre essa recompensa e os rostos "psychos" dos personagens do curta que ao invés de inspirarem altruísmo dão medo. 

sábado, janeiro 21, 2017

Paraty é o Triângulo das Bermudas da política brasileira?


Nesses momentos de tragédias que abrem possibilidades de inesperadas mudanças no cenário político (Quem perderá? Quem ganhará?) é sempre interessante ver as reações reflexas da grande mídia pega de surpresa. Ela parece sempre ter uma “narrativa reflexa”, pronta, que se manifesta como um ato falho: descrever um mundo onde os eventos são sempre aleatórios, fora de contextos, desconectados e sempre sujeitos a “trapaças da sorte”. A morte do Ministro do STF Teori Zavascki no acidente aéreo em Paraty rapidamente foi enquadrada em uma narrativa protocolar como se a grande mídia já tivesse o resultado antes mesmo das investigações: foi tudo uma fatalidade! Não importa a existência de estranhas anomalias, depoimentos contraditórios, sincronismos e o oportuno timing dos acontecimentos. Será que a grande mídia quer impor à sociedade uma “narrativa reflexa” para criar um fato consumado? Criar uma atmosfera de pressão política nas investigações oficiais que ora se iniciam? Ou será que, desde o desaparecimento de Ulysses Guimarães em 1992, a região de Paraty se transformou numa espécie de Triângulo das Bermudas brasileiro onde impasses políticos são resolvidos de forma drástica?

sexta-feira, janeiro 20, 2017

Um fim do mundo gnóstico e budista em "O Livro do Apocalipse"


Os filmes-catástrofes hollywoodianos sempre tiveram um papel bem freudiano: criar o objeto fóbico de medo para oferecer um bode expiatório capaz de espiar o mal estar da sociedade. Para quê? Para manter as pessoas na linha esquecendo dos seus problemas de obediência e disciplina com as obrigações que a sociedade cobra. Como fazer uma releitura dos clichês hollywoodianos desse subgênero? O filme sul-coreano “O Livro do Apocalipse” (“In-yu-myeol-mang-bo-go-seo, 2012) nos oferece uma surpreendente abordagem alternativa de zumbis, ameaça de robôs e meteoros que caem na Terra, temas tradicionais dos filmes apocalípticos ocidentais. Humor negro, “non sense”, Budismo e Gnosticismo se combinam em três contos onde o objeto fóbico é invertido: zumbis, robôs e alienígenas transformam-se em oportunidades para as pessoas repensarem a si mesmas e a sociedade.

terça-feira, janeiro 17, 2017

Algo engraçado aconteceu a caminho da Lua


Se no passado falar que o homem jamais pousou na Lua era coisa de velhos e iletrados incapazes de acompanhar a marcha do Progresso, hoje acabou se transformando em um verdadeiro subgênero audiovisual com filmes, documentários e minisséries para TV e cinema. Dessas dezenas de produções, uma se destaca: A Funny Thing Happened on the Way to the Moon (Algo Engraçado Aconteceu a Caminho da Lua, 2001) do jornalista investigativo Bart Sibrel – ele até chegou a levar um soco de Buzz Aldrin ao tentar fazê-lo jurar sobre a Bíblia que havia caminhado na Lua. O documentário foge dos temas clichês - anomalias nas fotos da Nasa e o “hoax” do diretor Stanley Kubrick envolvido na conspiração. Sibrel destaca o contexto da corrida espacial nos anos 1960, a flagrante vantagem tecnológica da URSS sobre os EUA naquele momento e algumas questões: como, depois de uma década de fracassos envolvendo explosões, incêndios e astronautas carbonizados na plataforma de lançamento, de repente a NASA empreende uma ousada e bilionária missão que, de cara, consegue colocar homens caminhando na Lua? Por que acreditamos? Só porque vimos na TV? Mas, e se tudo foi encenado sem a TV saber? Siebrel supostamente comprova a farsa com imagens de um vídeo da Nasa não editado no qual vemos astronautas da Apollo 11 simulando, na órbita da Terra, estarem a meio caminho da Lua enquanto ouvem a transmissão da direção da filmagem.

segunda-feira, janeiro 16, 2017

Inteligência Artificial como novo espelho individualista em "HyperNormalisation"


Certo dia um cientista do MIT criou um “computador terapeuta” chamado Eliza. Na verdade uma brincadeira, uma parodia sobre as tentativas frustradas em fazer uma Inteligência Artificial. As pessoas digitavam o que estavam sentindo e Eliza repetia a última frase, reformulando como fosse uma pergunta. Os “pacientes” começaram a levar à sério, passando horas diante de Eliza digitando seus problemas, desejos e motivações mais íntimas. Uma brincadeira que, sem querer, criou o paradigma que reformularia toda o conceito de Inteligência Artificial e abriria o campo dos algoritmos que controlam as atuais redes sociais e mecanismos de busca na Internet. Essa é uma das histórias do documentário “HyperNormalisation” (2016) de Adam Curtis. Analisado pelo “Cinegnose” em postagem anterior, vamos agora destacar como a fuga das pessoas para o ciberespaço, para escapar das complexidadse do mundo real, criou um outro aspecto da “HiperNormalização”: a Inteligência Artificial como um espelho individualista feito para criar a falsa sensação de estabilidade e segurança. Mas, às vezes, aspectos do “deserto do real” invadem essa bolha virtual.

sexta-feira, janeiro 13, 2017

O tautismo politicamente correto da Globeleza vestida



“Mudança de pensamento”. “Reflexo das pressões feministas e das discussões sobre diversidade”. Alguns mais eloquentes falam em “vitória da sociedade”. São as repercussões de primeira hora da nova vinheta do carnaval da TV Globo na qual vemos uma nova Globeleza vestida, decretando o fim da tradicional nudez maquiada por camadas de tintas coloridas e adereços metálicos imortalizados pela estética retro-futurista do designer digital Hans Donner. Esse suposto avanço deve ser colocado na perspectiva de uma emissora pós-impeachment que vive a tensão de ter que aparentar ser imparcial e progressista. Mas o tautismo (autismo + tautologia) crônico da emissora transforma qualquer demanda da sociedade em um signo vazio no interior de um sistema linguístico autônomo sem qualquer referencia no mundo real. A vinheta é binária e circular. Não consegue superar o simbolismo da Globeleza que sempre foi expressão de um projeto nacional secreto no qual a Globo teria um papel decisivo - criar uma embalagem supostamente moderna para o único produto que o Brasil teria a oferecer para o mundo: suas belezas naturais e hiperssexualizadas, desfrutáveis para todo o planeta a um preço módico pela diferença cambial.

quinta-feira, janeiro 12, 2017

A ficção contaminou a Política no documentário "HyperNormalisation"



Era uma vez o colapso econômico da antiga União Soviética. Diante da inevitável decadência do modelo comunista de Estado, seus dirigentes partiram para uma inédita tática de “gestão da percepção”: manter a aparência de normalidade através de narrativas ficcionais que minavam a percepção das pessoas, criando aversão à política fazendo-as tocarem a vida como se nada estivesse acontecendo. Isso chama-se “HiperNormalização”, tática copiada pelo Ocidente desde Ronald Reagan nos anos 1980 – levar conceitos do teatro de vanguarda e dos roteiros hollywoodianos para o centro da Política a tal ponto que a diferença entre realidade e mentira passa a ser desprezada pelas pessoas e pelo próprio jornalismo. Dessa maneira, Trump “surpreendentemente” chegou a poder nos EUA. Esse é o tema do documentário da BBC “HyperNormalisation” (2016), realizado pelo britânico Adam Curtis. A história de como a política foi derrotada pela ilusão enquanto as pessoas apolíticas desistiram de mudar o mundo, refugiando-se no ciberespaço. Enquanto isso, corporações e o sistema financeiro administram tranquilamente o deserto do real.

terça-feira, janeiro 10, 2017

David Bowie: a morte mais bem encenada do rock


David Bowie fez parte de uma elite para a qual o futuro não existe: na verdade ele é feito como “Psico-História” – o futuro é vendido como “previsão” ou antecipação de “cenários futuros” (por isso Bowie era chamado de “camaleão”, como um artista que estaria sempre “à frente do seu tempo”), mas já foi decidido e escrito no presente por uma elite de artistas e empresários como Tony DeFries, Brian Eno ou Robert Fripp . Certa vez John Lennon chamou essa elite de “artesãos” que, segundo ele em entrevistas, estiveram por trás dos Beatles. Lennon os confrontou e, dizem, pagou com a própria vida. Já o gnóstico pop David Bowie decidiu partir para uma estratégia irônica: combater a simulação com a própria simulação – decidiu encenar a própria morte como uma suposta profecia contida de forma cifrada na letras e vídeos do álbum “Blackstar”. Um timing tão irônico que dois dias antes do aniversário da sua morte, é lançado o vídeo póstumo “No Plan” no qual Bowie parece relatar suas experiências pós-morte. Encenação suficiente para criar o “hoax” de que David Bowie ainda está vivo...

segunda-feira, janeiro 09, 2017

Curta da Semana: "Reset" - nada é o que parece


No curta sueco “Reset” (2013) nada é o que parece. Uma amorosa mãe lê rotineiramente para a filha cartas de um pai ausente que promete retornar em breve ao lar. Uma fazenda remota e isolada do resto do mundo guarda um mistério que, para ser resolvido, dependerá que a menina compreenda o sentido de estranhos códigos numéricos. Um surpreendente drama alusivo às mitologias gnósticas sintetizado em 16 minutos – a mitologia do retorno de Sophia à Plenitude, a função consoladora e ilusória das religiões para nos manter esperançosos dentro de uma prisão e a diversidade de mundos simulados.

domingo, janeiro 08, 2017

Em "Don't Blink" podemos ser apagados como fotogramas em um filme


À primeira vista, “Don’t Blink” (2014) é mais um filme sobre um grupo de jovens que se hospeda em uma cabana em algum lugar remoto para serem punidos por seus vícios e pecados, por algum serial killer. Mas estamos no terreno do horror independente e nada é o que parece: sem explicações um a um começa a desaparecer assim que o grupo tem a atenção desviada ou simplesmente fecha os olhos. Mais um filme inspirado no misterioso desaparecimento, sem deixar qualquer rastro, de uma colônia inteira no início da colonização dos EUA em 1587. Filmes como “O Mistério da Rua 7” e adaptações de Stephen King como “A Tempestade do Século” e “A Fenda no Tempo” (“The Langoliers”) também exploraram esse misterioso acontecimento, cada um com sua própria interpretação. “Don’t Blink” discute as consequências morais (o que você faria, sabendo que desapareceria nas próximas horas?) e deixa uma série de pistas narrativas para o espectador montar sua própria explicação. De uma hora para outra poderíamos ser arbitrariamente apagados como se a realidade fosse um conjunto de fotogramas, assim como o cinema? Filme sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende.

sexta-feira, janeiro 06, 2017

Os 10 filmes mais estranhos de 2016


Esqueça os filmes oscarizáveis e assista a uma lista de filmes com “estranhas” narrativas: um cadáver flatulento que evita o suicídio de um náufrago, a filha de Deus que hackeia o computador divino para se vingar do Pai, uma mulher grávida de um vírus fetal e dois filmes sobre salsichas sencientes: um sobre homens-salsicha nazis que invadem uma cidadezinha no Canadá para serem enfrentados por protagonistas que utilizam o poder da Yoga; e outro sobre salsichas em um supermercado que questionam a religião que esconde o terrível destino – no “Grande Além” serão comidas pelos próprios deuses que veneram. São os chamados “filmes estranhos” (“weird movies”) que exploram o duplo sentido da palavra “weird”: “destino” e “surreal, estranho”. Muitos deles aproximam-se da noção de “filme gnóstico” pela forma como desconstrói conceitos religiosos, morais e a própria percepção daquilo que chamamos de “realidade”. Para o leitor, uma lista do “Cinegnose” com os 10 melhores Filmes Estranhos de 2016.

quarta-feira, janeiro 04, 2017

Tautismo fonoaudiológico da Globo quer legitimar capitalismo de desastre



Depois de entrar em metástase e, a partir das “hardnews” dos telejornais, contaminar o jornalismo esportivo, teledramaturgia e entretenimento, encontramos uma das origens da doença do tautismo (autismo + tautologia) da TV Globo: o método fonoaudiológico responsável há décadas pela fala dos atores, repórteres, radialistas e âncoras da emissora. É o chamado “Método do Espaço Direcional” cujas estratégias vocais reforçam subliminarmente a descrição que a Globo faz de si mesma - a crença de um destino manifesto que na fase metastática atual assume um delirante messianismo religioso: tons de voz graves, ressonância e ritmo da fala cada vez mais lúgubres e patibulares dos âncoras como se a Globo testemunhasse algo que já foi profeticamente gravado a ferro e fogo nas pedras da História desde tempos imemoriais:  “Vejam, já estava escrito!”. Cânone do “Método”, é sintomático que Cid Moreira tenha virado um apóstolo bíblico que decidiu levar o Evangelho “até os últimos dias”. Afinal, esse é o subtexto diário das inflexões de voz dos apresentadores globais que procuram conformar os telespectadores ao atual “capitalismo de desastre” implantado no País.

terça-feira, janeiro 03, 2017

O Gnosticismo politicamente incorreto em "Festa da Salsicha"


Uma das teses do Cinegnose é que as animações atuais cada vez mais exploram temas gnósticos de desconstrução da realidade. Afinal, em relação aos filmes live action, as animações são meta-ilusões dos movimentos reais criadas pela ilusão do desenho e computação gráfica. “Festa da Salsicha” (“Sausage Party”, 2016) leva essa tendência às últimas consequências. Alimentos antropomorfizados em gôndolas de um supermercado estão imersos em uma religião na qual acreditam que serão escolhidos por “deuses” (os clientes do supermercado) e levados para o “Grande Além”. Lá viverão na paz e amor, em comunhão com os “deuses”. Mas a religião esconde um destino cruel: os deuses são monstros insaciáveis que comem alimentos para ficarem fortes. Uma comédia politicamente incorreta e desbocada na qual o espectador cria forte empatia com o drama das salsichas – será que vivemos também em um gigantesco supermercado? Como elas, também partilhamos de ilusões religiosas apenas porque nos tornam felizes e otimistas?

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