sexta-feira, agosto 02, 2013

Em Observação: "Planeta Fantástico" (1973)


Os anos 1970 foram uma década onde a indústria do entrenimento ainda permitia estranhas experimentações temáticas e visuais. Nessa época temos o crescimento de filmes com temática gnóstica com um tratamento "cult" ou "de arte", bem antes do atual gnosticismo pop cujo filme "Matrix" é o paradigma. A animação francesa "Planeta Fantástico" se insere nessa tendência dos anos 70 onde aliens e misticismo estavam em alta, porém com um tratamento bem mais sombrio e gnóstico que o fez ser comparado ao filme "Planeta dos Macacos" de 1968.



Planeta Fantástico (La Planèt Sauvage, 1973)

Diretor: René Laloux

Plot: Hipnotizante e psicodélico filme de animação que ganhou o Grand Prix de Cannes de 1973 e que é um marco na animação europeia. Baseado no livro de ficção científica “Oms Em Serie” de Stefan Wul, a animação tornou-se uma obra-prima original. Lançado na França sob o título “La Planèt Sauvage” e nos EUA como “Fantastic Planet” foi imediatamente comparado com “As Viagens de Gulliver” de Jonathan Swift e “Planeta dos Macacos” (tanto o filme de 1968 quanto o livro de Boulle). Hoje o filme por de ser visto como a prefiguração de animações como “A Viagem de Chihiro” e “A Princesa Mononoke” de Hayao Miyazaki no Studio Ghibli.

“Planeta Fantástico” conta a história dos Oms, criaturas semelhantes a humanos, mantidos como animais domesticados por uma raça alienígena de gigantes azuis chamados Traags. Acompanhamos a trajetória de um Om chamado Terr, desde a infância até a vida adulta. Ele consegue escapar da escravidão a partir de um dispositivo de apredizagem Traag e começa a organizar uma revolta.

Por que está “Em Observação”?: Os anos 1970 são marcantes pela fase Cult dos filmes gnósticos. Antes da atual fase pop que se iniciou com “Blade Runner” em 1982, mas que ganhou força com “Show de Truman” e “Matrix” na década de 1990, os anos 70 são notabilizados pelo gnosticismo no cinema caracterizado pelo experimentalismo dos filmes “de diretor” ou “de arte”. Filmes como “Zardoz” (1974) e “O Homem Que Caiu na Terra” (1976), “Matadouro 5” (1972) e “Planeta Fantástico” estão sintonizados com uma época onde o misticismo e esoterismo “New Age” estavam em ascensão. Porém, esses filmes gnósticos cults exploravam o lado sombrio de todo esse imaginário: aliens com inteligência e tecnologia superioras, porém destituídos de ética e moral; mundos, planetas ou o próprio cosmos que se transformam em perversas prisões; classes dominantes que se transformam em demiurgos que mantém o poder por meio do medo e ignorância etc.

“Planeta Fantástico” é mais um exemplar dessa fascinante fase Cult dos filmes gnósticos, onde a indústria do entretenimento abria espaço para estranhas e bizarras experimentações, muitas vezes sem o appeal do gnosticismo pop atual com heróis de óculos escuros, overcoats pretos brilhantes e realísticos efeitos especiais. Por isso merece estar “Em Observação”: estudar mais um filme de uma década que deve ser melhor analisada em seu conjunto pela ousadia de filmes não apenas gnósticos, mas que envolviam outros gêneros – como não lembrar do experimentalismo e ousadia de perturbadores filmes como “Laranja Mecânica” (1971), “Network” (1976), “Taxi Driver” (1976), “O Franco Atirador” (1978), “Apocalypse Now” (1979).

O que esperar?:  comparado com o estilo de animação atual, o filme é no mínimo intrigante: sem muitos recursos tecnológicos, é de uma “frieza naturalista” como afirmam os críticos. O que torna a animação de uma técnica única. O tema pode ser pesado (os Oms, quando educados, ao invés de buscarem uma solução pacífica, rebelam-se da forma mais primitiva, deixando o sentimento da vingança falar mais alto e obscurecendo a razão), mas a animação em estilo onírico e surreal cria no espectador uma relação de distância e frieza. A trilha sonora com um sinistro rock progressivo e o design de áudio completam a atmosfera hipnótica e experimental.

Com certeza, depois de o leitor assistir ao filme “Planeta Fantástico” jamais pisará em uma formiguinha ou atentará contra a vida de um inseto sem pensar: “e se fosse eu?”  

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