quinta-feira, outubro 31, 2019

Operação Psicológica: Globo e Bolsonaro querem criar a conspiração perfeita


O timing de uma sequência narrativa análoga às ficcionais: a perfeita marcação de cena dos atores, um teaser, o thriller, a live action e, no final, a “escada” perfeita do ator coadjuvante para o sucesso final do esquete... Estamos falando do timing da sequência desses eventos: o vídeo das hienas inimigas simbólicas do Rei Leão Bolsonaro seguida pelo depoimento-bomba do porteiro do condomínio do presidente no JN da Globo, a live action paródia de Bruno Ganz no filme “A Queda” perpetrada por um presidente indignado na Arábia, finalizado pelo rabo entre as pernas da Globo em respostas protocolares.  A denúncia-escada do JN não passou de um conjunto de ilações, a participação numa operação psicológica ao estilo de uma “false flag” típica das agências de inteligência – “Operação bandeira falsa” ou “inside job”, espécie de auto-terrorismo onde atentados são criados pelo próprio Estado para justificar uma agenda política. Típica operação militar de guerra híbrida para criar a Conspiração Perfeita: protestos no Chile, virada à esquerda argentina, Lula solto, Globo sacaneando, "PSL traindo", ecoterrorismo de ONGs no Nordeste. Códigos para a criação do cenário perfeito para um golpe dentro do golpe.
O chamado “escada” é aquele ator que auxilia o seu parceiro de cena a atingir um sentido inesperado na interação. Embora muitas vezes visto como “sem graça”, esse ator é fundamental para a construção do risível nos esquetes de humor. Nesse sentido relacional, o humor é uma questão de timing, o tempo certo para a “deixa” para, através dela, a “punch line” da piada dar certa.
Acompanhamos nesses últimos dias os desdobramentos de um cenário político com a perfeita marcação de cena dos atores, teaserlive action e, no final, o “escada” perfeito para o sucesso final do esquete, no caso de humor negro – o papel de “escada” desempenhado pelo personagem mais sem graça e odiado por todos os lados: a TV Globo.
Óleo invadindo as praias do Nordeste; manifestações e protestos violentos explodindo no Equador e Santiago; a vitória eleitoral das esquerdas na Argentina; crise na Bolívia com a vitória de Evo Morales no  primeiro turno; Bolsonaro vagando perdido pela Ásia e Arábia entre a gafe de não ter levado um tradutor; franqueando para turistas entrada no Brasil sem vistos e promessas e acordos genéricos de negócios. Tudo sob o mantra: “o Brasil é um país de oportunidades”, como fosse um feirante desesperado na xepa.



                  
                   Até o momento em que Carlos Bolsonaro tuitou no perfil do pai um vídeo toscamente editado e metaforicamente primário sobre um Leão assediado por hienas simbolizando os inimigos que tentam derrubar Bolsonaro - PT, STF, PSL e por ai vai... 


Globo: escada para Bolsonaro?

Globo é o “escada”

Foi o teaser para a entrada de cena do “escada” perfeito: a TV Globo e a câmara de eco do Jornal Nacional - a denúncia de que o assassino de Marielle esteve no condomínio de Bolsonaro na Barra da Tijuca/RJ no dia do crime. E interfonado para a casa do presidente pedindo autorização para entrada.
JN levantou a bola para Bolsonaro dar a cortada final: uma live na Internet em plena madrugada na Arábia numa performance paródia da clássica sequência do ator Bruno Ganz no filme A Queda: cólera e descontrole bem controlados que, por sua vez, ofereceram ganchos para a contemporização cínica da Globo na edição seguinte do telejornal. 
Praticamente, a explosão de Bolsonaro foi uma espécie de live action do teaser-pastiche anterior com ares de National Geographic. 
Foram lances de uma guerra criptografada (e dessa vez bem coreografada e complexa) numa articulação perfeita de elementos cênicos: o contexto (o suposto contra-ataque do Foro de São Paulo na América Latina somado ao ecoterrorismo de ONGs como o Green Peace), o trailer-teaser de Carluxo, a “escada” da “denúncia” da Globo (que apenas retro-alimentou o plot do leão encurralado por hienas) e o thriller do desfecho (a paródia de Bruno Ganz), com direito a uma espécie de making of da própria Globo tentando justificar como a matéria do JN foi jornalisticamente “equilibrada”  e “séria”. 
                  A denúncia-escada do JN não passou de um conjunto de ilações, uma operação psicológica ao estilo de uma “false flag” típica das agências de inteligência – “Operação bandeira falsa” ou “inside job”, espécie de auto-terrorismo onde atentados são criados pelo próprio Estado para justificar uma agenda política.


Bolsonaro rouba o discurso anti-Globo da esquerda

Objetivos da Psyop

Uma operação psicológica (psyop) com três objetivos bem definidos:
(a) A performance à la Bruno Ganz de Bolsonaro tenta se conectar ao nacionalismo do suicídio de Getúlio Vargas e o imaginário de um presidente morto supostamente por interesses anti-patrióticos;
(b) Roubar das esquerdas a pauta anti-Globo. Mesmo sabendo-se que essa matéria do JN foi apenas um estalo perto das denúncias feitas, em um passado recente, diariamente contra Lula, tendo ao fundo dos apresentadores do telejornal a indefectível imagem do oleoduto jorrando dinheiro;
(c) Reação às eleições argentinas e comprometedores protestos anti-neoliberalismo no Chile e Equador. Enquanto o capital estrangeiro começa a fugir do País no momento em que a ficha cai diante da real conjuntura, a Globo News tenta criar uma bolha de euforia nos mercados financeiros que supostamente contaminaria indústria, comércio, empreendedores, startups etc. O mercado estaria eufórico com as “reformas”. 
Portanto, nada melhor que uma vasta psyop para o País virar às costas para o Mercosul. 
Como fenômeno de bolha, deverá durar poucos meses. Bolsonaro e seu clã sabem disso. E sabem também que só estão no poder para criarem a terra arrasada perfeita para a implementação a fórceps da agenda neoliberal – é a conhecida “tática vidraça quebrada” – clique aqui.
Por isso, o próximo e mais sombrio objetivo;
(d) A criação da conspiração perfeita! Com essa psyop de larga escala, criar a sensação crescente de alguma bomba prestes a explodir, um sentimento que todos os vetores do cenário estão acelerando para algum tipo de caos. “O cabaré está pegando fogo!”, é o que mais ouço no atual cinismo esclarecido ou autoconsciente das pessoas no cotidiano. Basta uma faísca, como no Chile.
                  Daí o sentido da críptica frase de Bolsonaro sobre a crise chilena: “eles estavam preparados...”, num elogio à repressão policial e militar daquele país. 



Tática do vazamento na Guerra Híbrida

Delírio conspiratório? 
Para responder essa pergunta, devemos entender que estamos diante de um governo militar que põe em prática táticas de guerra por meios não convencionais – a chamada guerra híbrida. Vazamentos propositais como a desse porteiro sem nome e sem rosto, prontamente desmentida pelo Mistério Público do Rio de Janeiro (cuja informação cinicamente a Globo diz que somente teve após o fechamento da matéria do JN), é típico modus operandi militar das psyops de uma guerra híbrida. A Globo supostamente cometeu o “erro” de não checar a informação com a própria figura misteriosa do “porteiro”.
Divulgou uma reportagem sem mostrar nada, a não ser dizer que naquele horário Bolsonaro estava em Brasília. Na verdade, a Globo criou uma ilação, uma simulação de denúncia sensacional.

O diálogo Bolsonaro/Globo

live da Arábia do presidente apenas criou deixas oportunas para a Globo responder no dia seguinte em rede nacional.          
Se o velho Leonel Brizola dizia, com todas as letras, que “a partir do primeiro dia, da primeira hora como presidente acabarei com o monopólio da Globo”, a indignação estudada do ex-capitão foi muitos tons abaixo disso: “O processo de concessão não será perseguição, mas o processo tem que tá enxuto, legal, não vai ter jeitinho pra vocês”.
Ao que o editorial lido por William Bonner no dia seguinte respondeu: “é o que esperamos, sem perseguição e legal porque a Globo nunca deixou de honrar seus compromissos...”.
E quanto ao jornalismo de “CA-NA-LHICE” acusado por Bolsonaro, foi a deixa para o JN dar a costumeira resposta protocolar sobre “jornalismo sério, profissional, responsável...”, seguido pelos mantras de liberdade da imprensa na Democracia. 
                  E visível que na “live” notívaga, Bolsonaro seguiu algum script: ele pega os óculos diversas vezes para ler algo fora do campo da câmera – cólera e indignação numa performance roteirizada e calculada.


A Conspiração: vira à esquerda na América do Sul

A Conspiração Perfeita!

 Toda essa pantomima semioticamente criptografada resultou em quatro resultados positivos imediatos, além do caminho aberto para a criação da conspiração perfeita:
(a) A esquerda kantiana e carente (porque o povo não está nas ruas e fica à espera de um Deus ex Machina – ONU, vergonha alheia internacional etc.) embarcou de cabeça nessa suposta ruptura entre Bolsonaro e Globo: gritam por impeachment (por obstrução da Justiça por colocar Moro em campo), jornalistas experientes comemoram que a Globo “tem mais munição”, e, the last but not least, e que “será feita uma consulta ao STF sobre o presidente”...
Acham que a Globo está com medo de perder a renovação da concessão e, somente por conta disso, acabou recuando. Parece que ainda a esquerda não entendeu que por trás desse inimigo que aparenta tosquice, ignorância e provincianismo de um miliciano de aldeia está em ação uma sofisticada psyop militar.
A vitória nesse primeiro momento foi tirar definitivamente da agenda das esquerdas a pauta anti-grande mídia. Bolsonaro trouxe a pauta para si, deslocando o conflito a esquerda para o eixo Grande Mídia versus Direita.
(b) Como o próprio jornalista Luís Nassif admitiu, mantida até aqui a acovardada (e para esse humilde blogueiro, reação esperada) postura que a Globo demonstrou na edição de ontem do JN, “os Bolsonaros não só saem incólumes como se fortalecem”. E ainda mais após o desmentido do Ministério Público do RJ;           
(c) Basta ver as imagens do carro do presidente do STF, Dias Toffoli, cercado por bolsonaristas ensandecidos e trajados de verde e amarelo em Brasília, batendo na lataria do veículo e gritando histéricos “Hiena do STF!” para entender um dos objetivos dessa operação psicológica: incitar e elevar o moral daqueles 30% da opinião pública que compõem o chamado "núcleo duro" do bolsonarismo - principalmente a parte armada desse núcleo: milícias, ruralistas, clubes de tiros, baixo clero das Forças Armadas e Polícia Militar. Isso prepara o terreno para o próximo item...
(d) A CONSPIRAÇÃO PERFEITA – o antropólogo e professor da Universidade de São Carlos/SP, além de estudioso das estratégias militares, Piero Lanier, alerta em seu perfil no Facebook:
Militares e Bolsonaro têm soltado, aqui e ali, versões dessa ideia do contra-ataque do Foro de SP, conectando isso à imprensa, etc. Vídeos e discursos de generais exaltados estão pipocando esses dias, na mesma proporção que se fazia à época do impeachment. (...) Eles vão precisar mobilizar essa base. Aí entra tudo nesse timing: Chile, Lula solto, Globo sacaneando, "PSL traindo", Witzel e Doria cobiçando, "Adélio protegido", e por aí vai. Tudo prontinho para montar uma perfeita conspiração. Falta o que? Uma faísca. Pode vir de qualquer canto. Para mim, todas essas coisas viriam mais cedo ou mais tarde. O Chile precipitou. Como Bolsonaro disse, eles estão preparados. Acho bom a gente levar isso a sério.
Por tudo isso, enquanto a esquerda não compreender a centralidade da mídia nos processos políticos híbridos atuais, ela vai permanecer na superfície e na literalidade dos acontecimentos.
Revoluções e impeachments não são televisionados – a não ser aqueles “híbridos”, isto é, voltados para as ondas concêntricas da TV. Não há e nunca haverá qualquer tipo de ruptura televisionada ao vivo e em rede como muitos ainda acreditam que testemunharam no JN. 
Está na hora da esquerda ler menos luminares da Ciência Política e da Filosofia e ler mais Guy Debord, Jean Baudrillard, Neal Gabler sobre as convergências entre a Política, simulação e ficção e Andrew Korybko para entender o que são as guerras híbridas                       

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