quarta-feira, janeiro 19, 2011
A "Barriga" Jornalística do Cão Caramelo: uma lição sobre a racionalização do Mal na mídia
quarta-feira, janeiro 19, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Mais do que sintoma da espetacularização da notícia, a “barriga” jornalística do cão Caramelo é uma lição de como a mídia busca eliminar o Mal do horizonte da experiência humana. Por trás da urgente busca pela comoção do público está a racionalização e moralização para eliminar dos fatos a sua crueza, estupidez e tragédia.
Podemos aprender muito sobre o funcionamento da indústria do entretenimento em momentos trágicos como os que atravessamos com as enchentes e deslizamentos de terra em Teresópolis, Petrópolis e Nova Friburgo no Estado do Rio de Janeiro.
A chamada “barriga” (gíria jornalística para designar uma grave bobeada de um jornalista que pensa estar publicando um “furo” quando não passa de engano ou má fé do próprio repórter) publicada por diversos veículos de imprensa ao comover a todos com a suposta história do cão Caramelo que guardava o túmulo da dona morta pelos deslizamentos de terra que atingiram as regiões serranas do Rio é um desses casos que denunciam a verdadeira natureza da indústria do entretenimento: ela não apenas produz “infotenimento” (informação + entretenimento) ou espetacularização da notícia, mas também em um nível ontológico, ela tem que produzir scripts para racionalizar a presença do Mal em nossas vidas.
sexta-feira, janeiro 14, 2011
Incomunicabilidade em banda larga no filme “A Rede Social”
sexta-feira, janeiro 14, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
"A Rede Social" é mais do que um filme sobre a história do Facebook: é sobre as consequência da virtualização das relações humanas. O filme explora o paradoxo de como a incomunicabilidade pode definir uma geração que, como nenhuma outra, teve em suas mãos tantas mídias e ferramentas de comunicação.
O diretor David Fincher já havia nos brindado com o filme “O Clube da Luta” nos anos 90 centrado na personalidade dividida de um executivo yuppie, incapaz de se comunicar com o mundo exterior e diluindo sua ansiedade por meio do consumismo e da violência ao arrebentar a cara dos outros no Clube da Luta, irmandade marcial underground do qual aos poucos vai perdendo o controle até se transformar numa gigantesca rede terrorista.
“A Rede Social” (“The Social Network”, 2010) desenvolve um tema muito semelhante.
Um jovem nerd de Havard (Mark Zuckenberg, interpretado por Jesse Eisenberg), gênio em algoritmos e linguagem de programação, com uma grande dificuldade em se comunicar e estabelecer uma rede de relacionamentos, desconta sua ansiedade difamando pessoas em um blog enquanto tem uma ideia divertida, pelo seu ponto de vista: um jogo com as fotos de todas as moças da universidade para que as pessoas possam escolher qual a mais bonita.
Um jovem nerd de Havard (Mark Zuckenberg, interpretado por Jesse Eisenberg), gênio em algoritmos e linguagem de programação, com uma grande dificuldade em se comunicar e estabelecer uma rede de relacionamentos, desconta sua ansiedade difamando pessoas em um blog enquanto tem uma ideia divertida, pelo seu ponto de vista: um jogo com as fotos de todas as moças da universidade para que as pessoas possam escolher qual a mais bonita.
Dessa ideia vai surgir o Facebook que, de rede de relacionamentos de alguns campi universitários nos EUA, cresce até atingir outros continentes. Pela sua incomunicabilidade em relações humanas, perde a noção das tramas de interesses e dos inimigos que vai acumulando ao longo do caminho na medida em que o projeto cresce empresarialmente.
“A Rede Social” é muito mais do que um filme sobre a história do site Facebook e relacionamentos humanos. É sobre a virtualização dos relacionamentos humanos e do perfil da geração desse início de século por trás da idealização de sites de relacionamentos como o Facebook.
terça-feira, janeiro 11, 2011
O Delírio Digital de Nicolelis: o Brasil alinhado à agenda tecnognóstica internacional
terça-feira, janeiro 11, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A entrevista ao jornal "O Estado de São Paulo" concedida pelo internacionalmente prestigiado neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis é um flagrante exemplo das principais características da retórica do "delírio digital" que justifica a agenda tecnognóstica atual: o mix de messianismo, exterminismo e transcendentalismo para racionalizar os esforços das neurociências e ciências cognitivas em virtualizar a consciência.
Definitivamente, a pesquisa científica brasileira se alinha à agenda tecnognóstica desse início de século. Miguel Nicolelis, um dos pesquisadores brasileiros de maior prestígio mundial, na última quarta-feira foi nomeado membro da Pontifícia Academia de Ciências do Vaticano, na qual já foi membro Galileu Galilei e tendo como um dos seus atuais membros o físico inglês Stephen Hawking.
quinta-feira, janeiro 06, 2011
As origens do "Paradigma Disney": arquétipos na comunicação globalizada
quinta-feira, janeiro 06, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O “Paradigma Disney” é um exemplo dessa forma globalizada de explorar os arquétipos, ao mesmo tempo repetitiva e transformadora, ao confinar os símbolos do insconsciente coletivo na ideologia do mundo globalizado e seus valores corporativos: individualismo, empreendedorismo, mobilidade social, inovação e relativismo ético e moral.
Em uma postagem do ano passado falávamos sobre a habilidade das animações norte-americanas, voltadas para o público infantil, de tornar divertidos temas trágicos, pesados e adultos (para ver clique aqui). Para ficarmos nos exemplos das produções dos Estudios Disney, desde Bambi (onde o protagonista perde a mãe de forma cruel) até Wall-E (ficção científica cínica e dark) as animações dos estúdios norte-americanos exercitam essa capacidade de fazer crianças rirem do cruel e do trágico.
segunda-feira, janeiro 03, 2011
"Tron: O Legado": simbologias alquímicas e gnósticas esvaziadas pelos Estúdios Disney
segunda-feira, janeiro 03, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
"Tron: O Legado" (Tron: Legacy, 2010) é mais um exemplo do conservadorismo dos Estúdios Disney. Se em "Tron" de 1982, uma das primeiras representações cinematográficas do mundo digital, tinhamos uma abordagem heróica e contestadora de uma ciberutopia que desafiava as grandes corporações computacionais, nessa continuação temos um enfraquecimento desse ímpeto. Todos os elementos místicos e gnósticos que motivavam essa ciberutopia esboçados há 28 anos com "Tron", são até ressaltados e mais desenvolvidos nessa continuação atual. Porém, são representados de forma esvaziada e submetidos à ideologia que o primeiro "Tron" tanto combatia.
Ao assistirmos a essa continuação do clássico filme de ficção científica "Tron: Uma Odisséia Eletrônica" (1982) temos a sensação de uma atmosfera de final de festa. Comparado com o primeiro Tron de 28 anos atrás (expressão de uma cibercultura emergente em tons épicos e heroicos), “Tron, O Legado” parece ser um réquiem para toda uma ciberutopia. Se na década de 80 o protagonista Flynn lutava pela liberdade do servidor da empresa ENCOM contra a tirania do PCM (Master Control Program – que expressava a luta pela liberdade dos primeiros PCs feitos em garagens contra os gigantescos main frames corporativos), aqui nessa continuação Flynn se confronta contra seu próprio avatar, numa jornada sem mais tons épicos, mas, agora, numa narrativa solipsista e introspectiva.
quarta-feira, dezembro 22, 2010
Primeiro Aniversário do Blog "Cinema Secreto: Cinegnose": Um Guia de Navegação (segunda parte)
quarta-feira, dezembro 22, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Hoje completamos um ano de atividades do Blog “Cinema Secreto: Cinegnose”: foram sete mil visitas (pouco, mas nada mal para um blog com temas tão obscuros!), 15 mil Page views e tempo de permanência médio de cinco minutos. Nesse período participamos da formação de um Grupo de Pesquisas sobre a Religião e o Sagrado no Cinema e Audiovisual na Universidade Anhembi (reportado por esse blog – clique aqui) e dois livros, diretamente ligados aos temas desse blog, foram publicados (“O Caos Semiótico” e “Cinegnose”) e a inserção do verbete “Tecnognose” no Dicionário de Comunicação da editora Paulus. Neste post, a segunda parte do Guia de Navegação para os nossos visitantes e seguidores se orientarem através dos arquivos do Blog “Cinema Secreto: Cinegnose”.
terça-feira, dezembro 21, 2010
Primeiro Aniversário do Blog "Cinema Secreto: Cinegnose": Um Guia de Navegação (primeira parte)
terça-feira, dezembro 21, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Na tarde do dia 22 de dezembro de 2009 ia ao ar o blog “Cinema Secreto: Cinegnose” com a primeira postagem “Filme Gnóstico – Uma Introdução”. Ao longo desse ano, o cinema se tornou o ponto de partida para o Blog empreender uma pesquisa mais ampla envolvendo as expressões não só do Gnosticismo, mas das formas de representações do sagrado e da religiosidade no audiovisual e na cultura pop. Diante do extenso material de postagem nesse período (foram 142 posts), decidimos, para comemorar o aniversário, elaborar um guia que auxilie os nossos fiéis 42 seguidores e visitantes a navegar através dos arquivos desse Blog.
sexta-feira, dezembro 17, 2010
O Dia em que o Sorriso Parou São Paulo: "Minimalismo" e Ad-Gnose na Ação de Marketing da Brastemp
sexta-feira, dezembro 17, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Criativa e tecnicamente perfeita, a ação de marketing da Brastemp apresenta novos aspectos da tendência da Ad-Gnose na linguagem publicitária. Ao querer transformar o consumo em uma oportunidade de experiências "espirituais" e de "auto-conhecimento", a Publicidade (como de resto toda a indústria do entretenimento) deve expressar o arquétipo e, simultaneamente, contê-lo e aprisioná-lo por meio de mecanismos ideológicos e retóricos.
segunda-feira, dezembro 13, 2010
"Poder Além da Vida": Quando a Gnose se transforma em Auto-Ajuda
segunda-feira, dezembro 13, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
"Poder Além da Vida" (Peaceful Warrior, 2006), baseado num best-seller da área de Auto-Ajuda, é uma oportunidade didática para estabelecer as diferenças entre Gnose e Auto-Conhecimento. Se toda ideologia tem o seu momento de verdade, a atitude gnóstica presente em alguns conceitos da Auto-Ajuda (como, por exemplo, a certeza de que tudo que precisamos já está dentro de nós) demonstra o momento de verdade desse ideário, que depois se perde no esforço de adaptar à força o indivíduo à realidade das instituições e corporações.
“Poder Além da Vida” passaria despercebido por este blog se o filme não fosse uma ótima e didática oportunidade de estabelecer uma distinção entre Gnose e Auto-conhecimento. Dos filmes sobre estórias de desafios superados e lições de vida, este filme está acima da média por apresentar, na primeira metade da narrativa, sérios elementos sobre Gnose e Gnosticismo. Porém, da metade até o final a narrativa desmorona para o
segunda-feira, dezembro 06, 2010
No filme "Sr Ninguém" a luta do homem contra a maior falha cósmica: o tempo
segunda-feira, dezembro 06, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O que há em comum entre a Teoria das Cordas da Cosmologia, o Efeito Borboleta da Teoria do Caos, Futuros distópicos, a possibilidade da quase imortalidade, Entropia e a flecha do tempo, a impermanência da memória, morte, amor, segunda chance, missões para Marte e mágoas de um divórcio?Para o diretor belga Jaco Van Dormael são partes de um mesmo contínuo: um protagonista prisioneiro na principal falha cósmica do universo físico (a flecha do tempo) vê sua existência como um gigantesco hipertexto com diversos futuros alternativos resultantes das decisões. Esse é o filme "Sr. Ninguém" (Mr. Nobody, 2009) - filme narra a luta de um homem contra o caos e o aleatório que interferem no livre-arbítrio das decisões.
sexta-feira, dezembro 03, 2010
A Jornada de Alice de Lewis Carroll: ritual de passagem?
sexta-feira, dezembro 03, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A interpretação mais aceita sobre a jornada de "Alice no País das Maravilhas" de Lewis Carroll é a de que a obra representa o rito de passagem da adolescência para o mundo adulto. Porém, essa leitura enfraquece toda a dimensão ocultista (metafórica e alegórica) da obra de Carroll e, o que é pior, reduz obras literárias ao campo dos sintomas e até patologias clínicas.
No debate que se seguiu após a minha apresentação no VI Encontro Científico e de Iniciação Científica da Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo, foi colocada uma questão sobre a minha leitura da Wonderland de Tim Burton (como mais um exemplo da filmografia atual sintonizada com a agenda tecnognóstica) como uma jornada de auto-conhecimento de Alice para, mais tarde, após decepar literalmente a cabeça de seus temores e fantasmas, tornar-se senhora de si e assume os negócios do pai falecido. Afirmei que da viagem onírica de Carroll, Burton traduz a estória de Alice em exemplo de determinação de uma jovem que se tornará empresária empreendedora (estender os negócios até a China).
No debate que se seguiu após a minha apresentação no VI Encontro Científico e de Iniciação Científica da Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo, foi colocada uma questão sobre a minha leitura da Wonderland de Tim Burton (como mais um exemplo da filmografia atual sintonizada com a agenda tecnognóstica) como uma jornada de auto-conhecimento de Alice para, mais tarde, após decepar literalmente a cabeça de seus temores e fantasmas, tornar-se senhora de si e assume os negócios do pai falecido. Afirmei que da viagem onírica de Carroll, Burton traduz a estória de Alice em exemplo de determinação de uma jovem que se tornará empresária empreendedora (estender os negócios até a China).
terça-feira, novembro 30, 2010
Um Método Gnóstico para Preparação de Aulas e Apresentações: Bicicleta e Estados Alterados de Consciência
terça-feira, novembro 30, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Deslocar-me de bicicleta para os locais das minhas atividades como docente (aulas ou apresentações) acabou despertando um interesse especial para um fenômeno: "insights", intuições ou "iluminações" que surgem do nada à mente silenciada pelo movimento repetitivo das pedaladas que, tal como um mantra, parece induzir a um particular estado de suspensão físico e mental.
Rumava de bicicleta para a Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, onde apresentaria o tema “Cartografias e Topografias da Mente” no VI Encontro Científico. Os conteúdos principais da apresentação já estavam prontos, através de uma postagem para esse humilde blog (veja links abaixo). Mas ainda não tinha um “gancho”, um bom início que convidasse os ouvintes à reflexão, e ainda não tinha um “grand finale”, um fechamento ou uma amarração bem clara para os conceitos.
Rumava de bicicleta para a Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, onde apresentaria o tema “Cartografias e Topografias da Mente” no VI Encontro Científico. Os conteúdos principais da apresentação já estavam prontos, através de uma postagem para esse humilde blog (veja links abaixo). Mas ainda não tinha um “gancho”, um bom início que convidasse os ouvintes à reflexão, e ainda não tinha um “grand finale”, um fechamento ou uma amarração bem clara para os conceitos.
domingo, novembro 28, 2010
Cartografias e Topografias da Mente no VI Encontro Científico da Universidade Anhembi Morumbi
domingo, novembro 28, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Abaixo um resumo da apresentação dos resultados iniciais e das primeira hipóteses da pesquisa "Cartografias e Topografias da Mente" dentro do VI Encontro Científico e de Iniciação Científica da Universidade Anhembi Morumbi realizado na última sexta-feira. Se o cinema representa o imaginário social de uma determinada sociedade e de uma determinada época, o cinema atual reflete uma agenda tecnocientífica marcada pelo impacto das Neurociências e Ciências Cognitivas. Essa agenda tecnocientífica perpassa hoje a Internet com o frenesi das pessoas, espontaneamente, quererem registrar sua experiências privadas por meio de "lifestreams", life-trackings" "inner geographies" e toda uma gama de cartografias da vida mental.
Quem acompanha a evolução temática das postagens do Blog "Cinema Secreto: Cinegnose", percebe que, em diversas análises de filmes, identificamos a recorrência de argumentos, ideias e narrativas que refletem o que chamamos de agenda tecnognóstica.
quarta-feira, novembro 24, 2010
Autor do Blog "Cinema Secreto" apresenta pesquisa no VI Encontro Científico da Universidade Anhembi Morumbi
quarta-feira, novembro 24, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Mutações do filme gnóstico no século XXI apontam para um tema recorrente em um conjunto de filmes dessa primeira década: a busca de uma cartografia e topografia da mente. Mente e consciência compostas por regiões dentro dos quais o protagonista encontra-se preso, necessitando de um mapa para poder orientar-se e encontrar uma saída. Esse é o tema da minha apresentação dentro da programação do VI Encontro Científico e de Iniciação Científica da Universidade Anhembi-Morumbi.
Nesta sexta-feira (26/11/2010) apresentarei no VI Encontro Científico e de Iniciação Científica da Universidade Anhembi Morumbi o resultado das minhas recentes pesquisas sobre as conexões entre as novas tecnologias computacionais e o filme gnóstico, pesquisas originadas a partir de discussões e reflexões a partir de postagens desse blog.
quarta-feira, novembro 17, 2010
O "Gênesis" segundo o gnóstico cartunista Robert Crumb: "a Bíblia é totalmente Louca"
quarta-feira, novembro 17, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O que faz um cartunista underground com estilo corrosivo e pornográfico fazer uma versão dos 50 capítulos do livro bíblico do Gênesis de uma forma literal e fiel ao texto original? Para o cultuado Robert Crumb a Bíblia já é louca. Não precia ser satirizada. Admitindo a influência do Gnosticismo na sua obra, após intensa pesquisa de 5 anos Crumb prioriza na sua adpatação o aspecto mais importante da Bíblia: a mitologia.
Quem espera encontrar no “Livro do Gênesis Ilustrado por Robert Crumb” o estilo iconoclasta e underground que, desde os anos 60 desafia o mainstream moral e cultural, certamente vai se decepcionar. Crumb deixa o seu conhecido humor visual para criar uma obra fundamentada em intensa pesquisa sobre os atuais textos bíblicos, a iconografia clássica (da arte até Hollywood) e um imenso material fotográfico da Terra Santa. Ao criar uma adaptação deliberadamente literal do texto bíblico, Crumb conseguiu se situar num ponto equidistante entre o fanatismo religioso e a blasfêmia.
sábado, novembro 13, 2010
Cartografias e Topografias da Mente: de "Vanilla Sky" à "Alice" de Tim Burton
sábado, novembro 13, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Um conjunto de filmes desse início de século que vai de "Vanilla Sky" até a recente versão de Tim Burton para "Alice no País das Maravilhas" demonstra que o cinema atual reflete uma nova agenda tecnocientífica: psicocartografias e psicotopografias. A mobilização das neurociências e ciências cognitivas para o mapeamento da mente e da consciência. Cartografias de mundos imaginários não é uma novidade na história da cultura. Porém, na atualidade, essas alegorias têm uma finalidade mais prática: controle e Engenharia Social.
O que há em comum entre os filmes “Vanilla Sky” (2001), “Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças” (2004), “Sonhando Acordado” (The Good Night, 2007), “Ciência dos Sonhos” (La Sceince Dês Revês, 2006), “Alice no País das Maravilhas” (2010) de Tim Burton, “A Origem” (Inception, 2010) e a série televisiva “O Prisioneiro” (The Prisoner, 2009)? As últimas discussões apresentadas nesse blog sobre esse conjunto de filmes parece apontar para duas tendências do filme gnóstico nesse início de novo século:
sábado, novembro 06, 2010
A Nova Alice de Tim Burton: Empresária Empreendedora
sábado, novembro 06, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A Versão de Alice no País das Maravilhas de Tim Burton tem o claro enquadramento moral e ideológico dos Estúdios Disney: reduz toda a complexidade ocultista e gnóstica (transcendente) do livro de Lewis Carroll a uma viagem psicológica de Alice em suas memórias onde apenas procura a reconciliação com a ordem desse mundo: buscar auto-conhecimento e auto-confiança que ajudem a transformá-la numa empresária empreendendora.
Publicado em 1865 por Lewis Carroll, mais do que uma suposta declaração de amor à garotinha Alice Lidell (então com 10 anos de idade), o livro Alice no País das Maravilhas é uma narrativa episódica, repleta de simbolismos teosóficos, ocultistas e gnósticos (como vimos em postagem anterior – veja links abaixo). Alice é uma protagonista que não se encaixa à sociedade que pertence. Uma estória com diálogos repletos de charadas e jogos de linguagem que levam a lógica, física e matemática ao paroxismo, até o ponto em que toda racionalidade resulta no oposto: o surreal, o non sense e o anárquico.
Uma personagem tão desajustada como Alice seria perfeito para o diretor Tim Burton, um cineasta que frequentemente enfrenta universos fantasiosos e incômodos e narrativas com andamento complexo.
Uma personagem tão desajustada como Alice seria perfeito para o diretor Tim Burton, um cineasta que frequentemente enfrenta universos fantasiosos e incômodos e narrativas com andamento complexo.
Apesar desse casamento aparentemente perfeito, a versão do cineasta desponta com uma narrativa convencional que reduz a complexidade e ambiguidade do texto original.
quinta-feira, novembro 04, 2010
A Experiência Cinematográfica pode ser Transcendente? - 3: Estratégias de neutralização
quinta-feira, novembro 04, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Nessa terceira e última postagem da nossa trilogia sobre a possibilidade de uma experiência transcendente no cinema, vamos mapear as principais estratégias pelas quais a indústria do entretenimento confina, neutraliza ou, simplesmente, impede que a experiência transcendente aconteça no evento cinematográfico.
Encerramos a postagem anterior afirmando que o prazer do espectador envolve um duplo vínculo entre o fascínio pelos conteúdos arcaicos (arquétipos, transcendência etc.) e estruturas narrativas que impedem que experiências potencialmente transcendentes sejam desenvolvidas.
Em termos sócio-políticos, esse duplo vínculo se traduz no drama da quebra-da-ordem-e-retorno-a-ordem: por um lado, o desejo de quebrar a rotina, fugir do tédio do cotidiano em busca de uma experiência arrebatadora; e do outro a necessidade de manter o equilíbrio psíquico necessário para o cumprimento dos deveres e obrigações em um mundo cada vez mais instável e competitivo.
sábado, outubro 30, 2010
A Experiência Cinematográfica pode ser Transcendente? - 2: O Prazer do Espectador
sábado, outubro 30, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Dando continuidade a nossa trilogia de postagens sobre a transcendência e experiência cinematográfica vamos nos deter no duplo vínculo que envolve o prazer cinematográfico: monotonia versus princípio do prazer, profano versus sagrado, tédio versus fascinação, arquétipo versus civilização. A articulação desses dois pólos dentro da narrativa fílmica é uma ritualística que mimetiza o drama da quebra-da-ordem-e-retorno-a-ordem. Por trás do prazer do espectador cinematográfico esconde-se o conflito potencial entre o espírito humano que aspira por transcendência e a ordem social e política que procura o oposto: o controle e a estabilidade.
Toda estrutura da obra de arte busca ultrapassar a si mesma. Vimos na postagem anteriora que o cinema, da mesma forma, contém elementos que buscam transcender o próprio meio. Por ser o cinema, desde o início, uma síntese criativa de diversas artes ou mídias (fotografia, pintura, literatura, música etc.), sua evolução estética e tecnológica força os limites das regras do ambiente perceptivo.
terça-feira, outubro 26, 2010
A Experiência Cinematográfica pode ser Transcendente?
terça-feira, outubro 26, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Aproximar o conceito de “transcendência” de Theodor Adorno (a experiência da alteridade, do “inteiramente outro”) com a experiência de transcendência como evento espiritual ou místico decorrente de um estado alterado de consciência é o desafio para a pesquisa atual sobre as conexões entre o Cinema e o Audiovisual com o Sagrado e Religioso. Se, como em toda obra de arte, o cinema busca ultrapassar a si mesmo ("transcendência"), talvez aí esteja uma explicação para o crescente interesse dos roteiros fílmicos pelo fantástico, o espiritual, o sincrônico, o místico e o gnóstico.
Quando Adorno apontava para a alteridade e transcendência contidas na arte, ele aproximava-se da temática central da Teologia Negativa: a busca do “inteiramente outro”, do “plenamente diferente”, do “diferente por excelência”, ou seja, aquilo que está além da representação. Adorno pensava o conceito de transcendência não no sentido religioso como epifania ou experiência mística de fato, de uma forma positiva.
sábado, outubro 23, 2010
Sophia e a Gnose são derrotados pelo Clichê no filme "Sonhando Acordado"
sábado, outubro 23, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Tom de falso documentário, sonhos como uma realidade paralela, frases com filosofias gnósticas e a personagem mítica de Sophia interpretada por Penélope Cruz nos fazem pensar estarmos diante de um novo Vanilla Sky, ou seja, um filme gnóstico e crítico. Engano! Todos esses elementos de fantasia presentes nesta comédia romântica servem para, além de sintonizar o filme com a agenda tecnognóstica vigente em Hollywood, aprisionar os potenciais elementos transcendentes e críticos no velho clichê da "quebra-da-ordem-e-retorno-à-ordem".
Gary (Martin Freeman) é um músico talentoso, porém frustrado por fazer jingles para campanhas publicitárias. No passado foi músico de rock pop, até a banda acabar e ver seu parceiro de composições de sucesso (Paul - Simon Pegg) se tornar bem sucedido financeiramente no campo da Publicidade, enquanto ele se deprime numa atividade profissional frustrante e sua vida conjugal cada vez pior, vítima da sua melancolia e depressão crescentes.
domingo, outubro 17, 2010
Uma "teologização" do Espiritismo no filme "Nosso Lar"
domingo, outubro 17, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Se aspectos da divisão do trabalho na produção e o meio de distribuição e produção influenciam a estética e conteúdo do filme, então "Nosso Lar" é um bom exemplo. Para adequar o livro original às exigências internacionalizadas de produção e distribuição, "Nosso Lar" teologiza o Espiritismo e o enquadra dentro de um "ecumenismo pós-moderno" da ideologia da nova ordem mundial globalizada.
Muito se discute nos estudos acadêmicos sobre cinema como o meio produtor dos filmes (grupo de autores, técnicos, colaboradores da criação) ou os aspectos socioeconômicos (filme de produção independente ou não, aspectos de distribuição etc.) influenciam ou condicionam os conteúdos das produções.
O que mais vem chamando a atenção na área das pesquisas cinematográficas nas últimas décadas são as consequências da crescente internacionalização e globalização da divisão do trabalho da produção cinematográfica.
sexta-feira, outubro 15, 2010
Ciclismo e Estado Alterado de Consciência: Gnose no Esporte?
sexta-feira, outubro 15, 2010
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Qual a representação do imaginário da bicicleta na cultura pop? Para nossa surpresa encontramos uma conexão entre o estado de consciência que a bicicleta proporciona (pela seu singular design que funde homem e máquina) e o gnosticismo de Basilides: o estado mental de "suspensão" que permite silenciar o ruído da linguagem para que ouçamos o espírito que busca a Gnose.
Basilides, um dos primeiros professores gnósticos em Alexandria, Egito, no século II da Era Cristã, nutria uma radical desconfiança em relação à capacidade da linguagem apreender a realidade. Sua teoria pode ser resumida na ideia da Grande Negação: se a verdade sobre Deus está além do conhecimento humano, a negação do conhecimento e da linguagem é o sagrado caminho.
No seu escrito “Sete Sermões aos Mortos” Basilides afirma que diante da plenitude (Pleroma – a origem de onde tudo foi emanado) “pensamento e existência cessam porque o eterno é desprovido de qualidade”. O mundo criado (o cosmos físico), ao contrário, é regido pelo princípio de “diferenciação” onde aquilo que era uno é cindido em qualidades opostas. Através da linguagem e do conhecimento o homem torna-se obcecado em apreender as qualidades do devir nomeando-as através de conceitos e palavras uma realidade que é difusa, fluída, relativa. Se as qualidades do Pleroma são pares opostos que se anulam mutuamente (a união dinâmica dos opostos: plenitude/vazio, belo/feio, tempo/espaço, energia/matéria etc.), ao contrário, a linguagem humana as diferencia, discrimina, tonando-nos vítimas dos pares de opostos.
O resultado é o Mal: na busca do Belo, o homem produz o feio; na busca da paz acaba produzindo a guerra, na busca do eficaz por meio da tecnologia acaba produzindo a inutilidade, etc. Essa reversão irônica da linguagem (a não transitividade entre linguagem e realidade) acaba tornando o homem prisioneiro dos próprios conceitos e palavras, não conseguindo ouvir, dentro de si, a reminiscência do Uno, do Pleroma, da plenitude original que o uniria a Deus.
“O que não deveis esquecer jamais é que o Pleroma não tem qualidades. Somos nós que criamos essas qualidades através do intelecto. Quando lutamos pela diferenciação ou pela igualdade, ou por outras qualidades, lutamos por pensamentos que fluem para nós a partir do Pleroma, ou seja, pensamentos sobre as qualidades inexistentes do Pleroma. Enquanto perseguis essas idéias, vós vos precipitais novamente no Pleroma, chegando ao mesmo tempo à diferenciação e à igualdade. Não a vossa mente, mas o vosso ser constitui a diferenciação. Eis por que não deveríeis lutar pela diferenciação e pela discriminação como as conheceis, mas sim por VOSSO PRÓPRIO SER. Se de fato assim o fizéssemos, não teríeis necessidade de saber coisa alguma sobre o Pleroma e suas qualidades e, ainda assim, atingiríeis o vosso verdadeiro objetivo, devido à vossa natureza. No entanto, como o raciocínio aliena-vos de vossa real natureza, devo ensinar-vos o conhecimento para que possais manter vosso raciocínio sob controle.”(BASILIDES, “Sete Sermões aos Mortos” disponível em: http://www.gnosisonline.org/teologia-gnostica/sete-sermoes-aos-mortos/)
Por isso Basilides propõe um singular estado de consciência: o silêncio, o estado de “suspensão”, o esvaziamento da mente por meio da suspensão de toda atividade dos mecanismos de abstração da linguagem (diz-se que os discípulos de Basilides eram obrigados, como ritual de iniciação, a ficarem em silêncio por três anos...). Manter o “raciocínio sob controle”, lutar “contra a diferenciação”. Com esses termos Basilides refere-se a um estado de suspensão entre os pares opostos, o “tertium quid”, o terceiro elemento que solde as qualidades.
A Experiência da Bicicleta: estado de "suspensão"
E o que essa longa introdução tem a ver com ciclismo? Se fizermos um sobrevoo nas representações da cultura pop em relação à bicicleta e ciclismo, veremos que essa prática desportiva e meio de transporte ocupa uma posição especial, uma especial confluência entre especiais estados de consciência e esforço físico, corpo e mente.
Um primeiro exemplo é o Kraftwerk (grupo pop alemão considerado os padrinhos da música Techno e industrial), cujos membros são apaixonados pelo ciclismo e que, a partir do mecanismo, ergonomia e design da bicicleta, destilaram o “ethos” da sua proposta musical: a união entre Homem, Máquina e Natureza. Certa vez, um dos integrantes do grupo, Ralf Hütter, fez a seguinte afirmação após a elaboração do clássico single “Tour de France” de 1983: “a bicicleta é mais do que um mero instrumento de lazer, é algo mais próximo da declaração política. Não é para férias, É o homem-máquina. Sou eu, o homem-máquina na bicicleta. Velocidade, equilíbrio, uma certa liberdade de espírito, manter a forma, técnica e perfeição tecnológica, na aerodinâmica”.
Para ele, a bicicleta é em si um instrumento musical: o som ritmado da corrente, engrenagens, a respiração e batimento cardíaco, tendo como fundo o som contínuo “shhhhhh” do contado do pneu no asfalto. Tal como um mantra, confere uma “liberdade ao espírito” ao esvaziar a mente, seja pela repetição de sons e movimento, seja pelo esgotamento físico.
Aqui podemos fazer uma surpreendente conexão entre Basilides e a bicicleta: o estado de consciência de suspensão na bicicleta é, ao mesmo tempo, simbólico e literal. Montar na bicicleta e se deslocar velozmente como se estivesse suspenso e, ao mesmo tempo, o som ritmado do corpo e do mecanismo anulando o trabalho mental.
Por experiência própria, é surpreendente os “insights” ou ideias que, paradoxalmente, advém desse vazio mental. A união dos opostos. Assim como na criação por brainstorming onde um estado caótico de ideias desconexas produz, ao longo do tempo, uma massa crítica que, de repente, produz um salto qualitativo: do nada, do caos, surge repentinamente a ordem, uma ideia.
É como se o barulho da atividade mental racional e cotidiana não nos deixasse ouvir as camadas mais profundas do nosso interior. É necessário silenciar a mente, nem que seja por meios violentos como no filme “O Clube da Luta”: a luta tem um aspecto de disciplina, ascese, tal qual um mantra onde os pensamentos e a racionalidade são subjugados à disciplina da repetição até que se convertam no oposto: o estado de suspensão de sentido para a libertação da consciência.
Músicas como “Bicycle Race” do Queen apontam para esse silêncio da racionalidade.
Você diz preto eu digo branco
Você diz barca eu digo picada
Você diz tubarão eu digo ei, cara
Tubarão nunca foi minha cena
E não gosto de “Guerra nas Estrelas”
Você diz Deus dê-me uma escolha
Você diz Deus eu digo Cristo
Eu não acredito em Peter Pan, Frankenstein ou Super Homem
Tudo o que quero fazer é
Bicicleta, Bicicleta, Bicicleta
Eu quero montar na minha bicicleta
Conceitos, escolhas, palavras são como ruídos que impedem a liberdade do espírito ouvir a si mesmo, suas reminiscências que o faça se conectar de volta à plenitude.
Esvaziamento da mente e liberdade de espírito alcança o estado alterado de consciência que chega à catarse e transcendência que altera a maneira como enxergamos a relidade, como na música “Bicycle, Bicycle, You are my Bicycle” da banda "Be Your Own Pet":
Vamos mudar a cor dos olhos
De cada senhora
Somos rápidos, nós somos rápidos
Somos rápidos, estamos explodindo
Tudo porque
Estamos sobre duas rodas, garota
Estamos sobre duas rodas, garota
Mude as cores da sua maquiagem
Todos os dorminhocos vão acordar
Tudo porque todos, porque todos, porque
Porque, porque ...
Sem engrenagens, sem freios
Nada real, nem falso
Transcender ao ponto das engrenagens e freios da bicicleta desaparecerem. Tal liberdade conduz à suspensão: nada real e nem falso, a busca de uma experiência que supere o dilema dos pares opostos, da armadilha que a linguagem e o conhecimento não conseguem se libertar. Ir além das engrenagens e freios (razão e linguagem).
A arquetípica figura em contra-luz de um ser extraterrestre montado em uma bike BMX no pôster do filme ET de Spielberg é uma síntese das representações pop em torno do imaginário da bicicleta: suspenso no ar tendo a Lua como fundo. A representação icônica de todo um imaginário gnóstico que envolve a bicicleta: suspensão como um estado alterado de consciência que possibilite o silêncio que nos faça ouvir a voz íntima da gnose.
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