domingo, agosto 31, 2014

Marina e as novas bombas semióticas do "Sim!" e do "Storytelling"

O trágico mergulho fatal do Cessna Citation em Santos não só mudou o cenário eleitoral como modernizou o arsenal de bombas semióticas midiáticas. No momento em que a grande mídia esgotava sua estratégia semiótica ainda condicionada pela Guerra Fria (criar a percepção de caos e pré-insurreição ao anabolizar as manifestações de rua), eis que surge Marina Silva com o mix de ambientalismo, fundamentalismo religioso e neoliberalismo potencializado por duas poderosas bombas semióticas saídas diretamente do atual kit linguístico de manipulação do mundo corporativo globalizado: a bomba do “Sim!” e a bomba neuromarketing do “Storytelling”. O problema para os marqueteiros é que Marina Silva não é um candidato à venda, mas uma narrativa sincromística oferecida para pessoas sedentas por histórias que seduzem mais do que os dados frios e duros da realidade.  

Quem não se lembra do personagem Church Lady feito pelo comediante Dana Carvey no quadro chamado Church Chat no programa Saturday Night Live de 1986-1990? Sempre preocupada com as conspirações de Satã nesse mundo, Church Lady sempre soltava um bordão irônico ao perceber satânicas coincidências: “How con-VEEN-ient!” ("Tão conveniente!").


É difícil não perceber a extrema feliz coincidência e conveniência no trágico acidente aéreo de Santos que vitimou o candidato à presidência Eduardo Campos: foi um divisor de águas no cenário eleitoral, substitui um combalido Aécio Neves pelo fator novidade de Marina Silva e, principalmente, renovou de uma hora para outra o arsenal de bombas semióticas justamente a poucos meses das eleições. Exatamente num momento em que se iniciava a propaganda eleitoral na TV com a candidata à reeleição ocupando a maior fatia de tempo para mostrar suas realizações.


Como vimos em uma série de postagens, desde as grandes manifestações de rua de junho do ano passado a grande mídia apostou em um tipo de bomba semiótica que criasse no contínuo midiático uma percepção de caos, desordem e de um país em um estado pré-insurrecional: fusca incendiando com família inteira dentro, índios invadindo Brasília, sinistros black blocs. Tudo acompanhando pelo suposto crescimento endêmico da inadimplência e da disparada do preço do tomate.

A queda do Cessna em Santos foi
a "bala de prata" tão aguardada
pela grande mídia?
O inesperado (para a grande mídia) sucesso da Copa no Brasil, tornou extemporânea uma pretensa escalada de manifestações nas ruas que incendiaria o cenário eleitoral.

Mas o mergulho fatal do jato Cessna Citation em Santos mudou de um só golpe uma eleição que caminhava para uma decisão ainda no primeiro turno. De certa forma, foi a bala de prata que tanto a grande mídia esperava na Copa do Mundo e que saíra pela culatra.

A modernização do arsenal semiótico


Talvez ainda condicionada pelo modus operandi midiático desde os tempos de IPES-IBAD de 1962-64 e de toda estratégia de desestabilização política que resultou na queda de João Goulart e o golpe militar, a grande mídia tentava atualizar as velhas bombas semióticas paranoicas com sabor de Guerra Fria. Era necessária uma modernização radical, que somente poderia vir do arsenal semiótico globalizado e corporativo do pragmático mundo do capital financeiro por trás da candidata Marina Silva.

O mix de ambientalismo, fundamentalismo religioso e neoliberalismo no programa da candidata do PSB vem potencializado por duas poderosas bombas semióticas saídas diretamente do atual kit linguístico de manipulação de multidões: a bomba do “Sim!” e a bomba neuromarketing do “Storytelling” – sobre o conceito de “Kit linguístico de manipulação” clique aqui.

A bomba do “Sim!”


As bombas semióticas da grande mídia
ainda estavam no modus operandi da Guerra Fria
         Quem se aproximou mais dessa constatação foi Ciro Gomes em uma entrevista ao jornalista Kennedy Alencar: “O discurso de Marina é uma tragédia porque é fragmentado, porque ela fala de valores muito caros e com muita decência e honestidade. Por isso é uma tragédia. Ela tem valores corretos: está preocupada com os índios, com os passarinhos, calangos, bagres... mas é um valor fragmentário. Como estadista deveria encontrar um equilíbrio entre meio ambiente e geração de energia. Mas ela é contra tudo”.

Ciro Gomes conseguiu levantar uma das chaves semióticas do discurso de Marina Silva: a bomba do “Sim!”. Essa estratégia linguística surge da tática corporativa da busca dos “temas globais de consenso”: temas de fácil adesão, porque ninguém pode dizer “não!”. Porém, são temas colocados de forma fragmentada, descontextualizada e, principalmente, despolitizada.

A publicidade e o marketing globais se tornaram autoconscientes. Já absorveram a principal crítica que é feita ao mundo das imagens publicitárias: a alienação e a inexistência de consciência social. Críticas como as feitas pelo fotógrafo das campanhas da Benetton Oliviero Toscani, principalmente em seu livro A publicidade é um cadáver que nos sorri, onde acusa o mundo publicitário de alienante e distante dos problemas sociais, são levadas em consideração no cálculo dos choques culturais que determinadas campanhas possam ter no mercado mundial.

Por isso o marketing global incorpora temas como AIDS, pobreza, violência, consciência ecológica, trabalho infantil e associa os mais diversos produtos a estas causas para criar uma imagem de engajamento e preocupação política e social. Como as campanhas globalizadas podem adotar temas tão polêmicos que, potencialmente, podem prejudicar os negócios ao criar críticas e oposições ideológicas? Simples: despolitizam-se estes temas ao serem tratados de forma genérica ou abstrata, produzindo imediata adesão e simpatia nos consumidores de todo o planeta. Ninguém pode ser a favor da destruição da camada de ozônio, da pobreza no terceiro mundo ou do trabalho infantil. São temas que criam consenso instantaneamente.

“Yes, We Can”: o grau zero do signo


A bomba do "Sim!":
o grau zero do signo
Por exemplo, o que dizer de eventos como o Rock in Rio promovido pela América on Line em 2001 cujo slogan era “Por um Mundo Melhor”? O slogan era de fácil adesão: quem pode ser contra esta ideia? Contudo, para a audiência “Um Mundo Melhor” foi apenas mais um outro slogan, engolido pelo mar de logotipos de 15 patrocinadores espalhados por todo o local. COMO fazer um mundo melhor? Isso jamais foi discutido entre um show e outro.

A bandas de rock U2 em 2004 fez uma série de shows em prol do perdão da dívida do Terceiro Mundo como a única forma de acabar com a fome e a pobreza. Mas, em coletivas com a imprensa, o líder da banda Bono Vox nunca propunha COMO poderia ser operacionalizado este perdão das dívidas externas. Tudo permaneceu no plano dos slogans, evitando politizar a questão porque, afinal, a banda U2 tem fãs de diferentes matizes ideológicas. Propostas concretas poderiam gerar polêmicas prejudiciais às metas mercadológicas globais da banda e da gravadora.

Quando Obama na sua campanha presidencial em 2008 bradou o slogan “Yes, We Can!” colocava em prática essa poderosa bomba semiótica: genérica, afirmativa, de fácil adesão porque fragmentada. Tão genérica que nenhuma crítica ideológica consegue confrontá-la. O grau zero do signo. Semioticamente perfeita!

“Storytelling” e Neuromarketing


        Vários estudos ao longos dos anos, e confirmado por pesquisa da Nielsen em uma série de Workshops em 2004, demonstraram que os consumidores querem uma conexão mais “pessoal” com as informações – os nossos cérebros se envolvem muito mais facilmente com narrativas do que com fatos ou números duros e frios – leia “Using Storytelling to Identify Requeriments”.

Através dos mapeamentos neuronais realizados por neurologistas feitos com pessoas diante de peças publicitárias, descobriram que quando lemos histórias, não só as partes linguísticas do cérebro se acendem, mas também também outras partes são sensibilizadas como se estivéssemos realmente experimentando o que estamos lendo.

O que isto significa é que é muito mais fácil para nós lembrar histórias do que os fatos frios e objetivos porque os nossos cérebros fazem pouca distinção entre uma experiência que estamos lendo sobre o que está realmente acontecendo. Além disso, nossos cérebros são incrivelmente ávido de histórias. Passamos cerca de um terço de nossas vidas em devaneios - nossas mentes estão constantemente à procura de distrações.

Para o atual marketing político, o candidato deixou de ser um produto à venda: ele precisa agora de uma narrativa, estar inserido em uma experiência contada por meio de uma história. Como vimos em postagem anterior, após o acidente aéreo de Santos a candidata Marina Silva se inseriu em uma sedutora narrativa sincromística: o destino manifesto, o imponderável, o destino de uma mulher saída do coração da Amazônia com uma pauta de temas de imediata adesão (a bomba do “Sim!”) – sobre isso clique aqui.

A declaração de Caetano Veloso no Facebook para sua adesão à Marina Silva deu a perfeita composição da storytelling arrasa quarteirão que impulsiona a candidatura: o primeiro postulante de pele escura. Com seus elegantes traços, resultado óbvio da mistura de cafusos com mamelucos, Marina, além de vir do coração da Amazônia (onde a lei faz quase desesperados esforços para instalar seu império), da luta ao lado de Chico Mendes, da fase heroica do PT, ela significará a chegada de evidentes fenótipos negros no posto da Presidência da República. 

Assim como a bomba semiótica do “Sim!”, a tática do Storytelling é refratária a qualquer crítica ideológica. Como Ciro Gomes alertou, “é politicamente deseducadora”. O problema é que enquanto os marqueteiros de Dilma Rousseff e Aécio Neves ainda veem os seus clientes como produtos à venda, Marina Silva é impulsionada pelas mais recentes táticas semióticas e de neuromarketing do mundo globalizado corporativo. Marina Silva não é um produto, é a sedutora narrativa do “Sim!”.


O problema é que também as storytelling nos contam que sempre depois da sedução do canto das sereias, vem o naufrágio.

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