sábado, agosto 23, 2014

A linguagem da sedução do nazismo em "Hitler's Hit Parade"

Quando assistimos ao documentário “Hitler’s Hit Parade” (2005) somos assombrados por uma estranha sensação de atualidade: uma sucessão de imagens de alta qualidade das décadas de 1930-40 de clipes de filmes de propaganda, desenhos animados, filmes musicais e vídeos caseiros que demonstram como a estratégia de comunicação Nazi criou as bases da moderna Publicidade e da indústria do entretenimento. Sem fazer comentários e apresentando apenas as imagens da época, o documentário mostra como o mal foi banalizado através de uma estética kitsch repleta de estereótipos de felicidade (mais tarde imitados pela sociedade de consumo dos EUA e irradiado para todo o mundo), a estetização e erotização da política por meio de celebridades, modelos sensuais e a fetichização dos uniformes. O documentário sugere que o nazismo não morreu - se transfigurou na moderna linguagem midiática.

Quando pensamos em documentários sobre o nazismo, vem a nossas mentes imagens impactantes do holocausto, trilhas musicais marciais, soldados em marcha e a figura de Hitler como um orador enlouquecido nos congressos do Partido Nacional Socialista.

Bem diferente, durante pouco mais de uma hora, Oliver Axer e Suzanne Benzer nos apresenta no documentário Hitler’s Hit Parade uma surpreendente visão do fenômeno nazi, uma catástrofe política que parece se originar de uma cultura pop, de um universo paralelo estranhamente reconhecível, cujo aspecto assustador é a sua alegre normalidade – artistas cantando em shows exuberantes, enérgicos números de dança, coristas sensuais sapateando e namorados em jogos amorosos surpreendentemente avançados para os costumes da época.

quinta-feira, agosto 21, 2014

Bonner e Poeta expõem o desespero tautista da TV Globo

A verborragia estudada e simulada de William Bonner e Patrícia Poeta (perguntas quilométricas e fisionomias treinadas em longos anos de experiência olhando para “teleprompters” nos estúdios de TV) na suposta entrevista com a candidata Dilma Roussef não quis dizer apenas que a TV Globo “não gosta dela”. A dupla de apresentadores do Jornal Nacional involuntariamente expôs a dramática situação atual da emissora: o desespero “tautista” (tautologia + autismo) – ter que ao mesmo tempo assumir o papel de oposição política servindo de câmara de eco da pauta da grande mídia e institutos de pesquisa e ter que demonstrar histericamente que ela é imparcial para tentar recuperar uma audiência em queda pela perda de credibilidade e relevância.  A resposta da emissora para seu dilema existencial não poderia ser mais autista quando utiliza a técnica de dissociação psíquica na entrevista, velha tática do Manual Kubark de Interrogatório e Contra-inteligência” da CIA.

Em 1985, no último bloco de debate dos candidatos à Prefeitura de São Paulo, o jornalista Boris Casoy disparou uma pergunta a Fernando Henrique Cardoso: “Senador, o sr. acredita em Deus? A reposta dessa pergunta simples e direta fez ele perder uma eleição que parecia ganha.

Um ano depois, durante a Copa do Mundo no México, o dublê de ator e jornalista Marcelo Tas, na pele do personagem cínico Ernesto Varela, conseguiu invadir a concentração da seleção brasileira para dar de cara com o cartola Nabi Chedid, então chefe da delegação. Varela foi direto: “depois da Copa, qual será a sua próxima jogada?”. Transtornado com a pergunta maliciosa, Nabi expulsou ele e o câmera Toniko Melo da concentração.

sexta-feira, agosto 15, 2014

Acidente aéreo em Santos prepara bomba semiótica sincromística

O trágico acidente aéreo em Santos que vitimou o candidato à presidência da República Eduardo Campos reacende por caminhos mórbidos a esperança da grande mídia, com a pressão uníssona de que Marina Silva assuma a candidatura. O timing da tragédia foi perfeito, num momento em que já estava esgotado o arsenal de bombas semióticas midiáticas – a última foi a irrelevância da não-notícia da “fraude da Wikipédia”. Mais do que que levantar teorias conspiratórias, as sincronias e coincidências que cercaram o acidente, somado a uma espécie de discurso do “destino manifesto”, do “imponderável” e do “destino”, estão ajudando a preparar a talvez derradeira bomba semiótica, dessa vez sincromística porque utiliza como matéria-prima a simbologia arquetípica do “Mágico”, baseado em estratégia do mundo do Marketing e da Publicidade que manipula arquétipos do inconsciente coletivo para a criação da imagem de marcas, produtos e serviços.

Teorias da conspiração não surgem por acaso. É por ser a realidade estranhamente sincrônica que acaba sugerindo a suspeita de eventos milimetricamente maquinados, como no caso da trágica morte do candidato à presidência da República Eduardo Campos em um acidente aéreo na cidade de Santos-SP no último dia 13.

Logo após o incidente, redes sociais e grande mídia se apressaram a fazer um mórbido inventário de “coincidências”: Eduardo Campos morreu no mesmo dia que o seu avô Miguel Arraes; o DDD de Santos é o mesmo do dia da tragédia (13) que, por sua vez, é o mesmo número que identifica o PT nas eleições; a soma das letras do candidato morto soma 13; o acidente aéreo ocorre pouco tempo depois da denúncia envolvendo o candidato Aécio Neves sobre um aeroporto construído com dinheiro público ao lado de fazenda da sua família; em 2006, também no período de eleições presidenciais, ocorreu o acidente aéreo do choque do Boeing da Gol com um jato Legacy matando 154 pessoas; o acidente aéreo de Santos se soma a uma sequência de acidentes como o desaparecimento do Boeing da Malaysian Airlines no Oceano Pacífico (ou teria sido no Índico?), a queda de outro Malaysian na Ucrânia e uma mais recente de um Boeing na África...

terça-feira, agosto 12, 2014

O pós-humano de "Lucy" e o mito dos 10% do cérebro


“Lucy” (2014), do diretor francês Luc Besson (“O Quinto Elemento”, “Leon: The Professional”), é mais um filme da safra atual com o tema do pós-humano (“Transcendence”, “The Machine”, “Limitless” etc.). Todos se baseiam em um mito que é o pressuposto da filosofia pós-humanista que anima a agenda tecnocientífica atual: o homem seria um ser limitado porque utilizaria tão somente 10% da capacidade cerebral. Sua limitação viria do corpo físico que nos aprisionaria no medo e na dor. Mito desconstruído por neurologistas sérios como Barry Gordon,  da John Hopkins School of Medicine. Por meio de drogas ou tecnologias cibernéticas o homem daria em “upgrade” em si mesmo, acessando 100% o “banco de dados” cerebral. “Lucy” revela uma nova religião onde Deus é substituído pela tecnologia e a alma pela informação.

segunda-feira, agosto 11, 2014

Editor do Cinegnose dá curso sobre linguagem das mercadorias na pós em Comunicação e Semiótica

O humilde editor desse blog inicia no dia 18 de agosto o curso “A Linguagem das Mercadorias” na pós-graduação em Comunicação e Semiótica da Universidade Anhembi Morumbi em São Paulo. Um curso com proposta, por assim dizer, “maquiavélica”: ao mesmo tempo em que oferecerá ferramentas práticas derivadas da semiótica e psicanálise para profissionais de gestão e criação em publicidade, marketing e comunicação, também desenvolverá ferramentas críticas para o consumidor se proteger das manipulações e abusos da indústria do consumo e entretenimento.

Esse humilde blogueiro inicia no dia 18 de agosto o curso na pós graduação em Comunicação e Semiótica da Universidade Anhembi Morumbi intitulado “A Linguagem das Mercadorias”. O curso pertence ao módulo 2 da pós lato sensu da Universidade cujo objetivo é a aplicabilidade das ferramentas da Semiótica na criação e gestão de processos criativos em comunicação, marketing e publicidade.

O curso é composto de seis encontros, todas as segundas das 19h às 22h40 no campus Vila Olímpia da Universidade Anhembi Morumbi.

sábado, agosto 09, 2014

O "escândalo da Wikipédia" e a autofagia da TV Globo

O “escândalo da fraude da Wikipédia” é a confirmação de que nada mais resta para a grande mídia do que a bomba semiótica da não-noticia. Em nova “denúncia” jornalistas Miriam Leitão e Carlos Sardenberg tiveram seus perfis na enciclopédia virtual Wikipédia “fraudados” com a inserção de difamações e críticas. E tudo teria partido do endereço virtual “da presidência”... ou teria sido “do Palácio do Planalto”... ou, então, “de um rede pública de wi fi?”. A ambiguidade dá pernas à não-notícia que revela um insólito desdobramento de um jornalismo cuja fonte primária (a Wikipédia) nega a si própria como fonte confiável de investigação. Abre uma surreal possibilidade de um tipo de jornalismo que se basearia exclusivamente em fontes onde o próprio repórter pode criá-las para turbinar a sua pauta. E de quebra revela o momento autofágico da TV Globo que oferece suas próprias estrelas jornalísticas em sacrifício no seu desespero de ter que lutar em duas frentes simultâneas: a política e a audiência.

Com o “escândalo Wikipédia” e a perspectiva de uma hilária “CPI do wi fi” está se confirmando que na atual batalha semiótica pela opinião pública a única arma que restou para a grande mídia é a da não-notícia – sobre esse conceito clique aqui.

O jornal O Globo deu a manchete (“Planalto altera perfil de jornalistas com críticas e mentiras”) e a TV Globo repercutiu nos seus telejornais durante todo o dia a “notícia” de que os perfis dos jornalistas Carlos Alberto Sardenberg e Miriam Leitão na enciclopédia virtual foram alterados com o objetivo de criticá-los. E o IP (endereço virtual) de onde partiram as alterações era da rede do Palácio do Planalto.

As supostas “críticas” inseridas no perfil dos jornalistas qualificam as análises e previsões econômicas de Miriam Leitão como “desastrosas” e de ter defendido “apaixonadamente” os ex-banqueiro Daniel Dantas quando foi preso pela Polícia Federal em escândalo de crimes contra o patrimônio público. E o jornalista Sardenberg de ser crítico à política econômico do governo por ter um irmão economista da Febraban que tem interesse em manter os juros altos no Brasil.

quarta-feira, agosto 06, 2014

Explode a bomba semiótica da não-notícia

Apesar das previsões catastróficas a Copa do Mundo foi um evento bem sucedido. As grandes manifestações de rua declinaram. E as eleições se aproximam, mostrando uma oposição política cada vez mais inepta. Pressionada, a grande mídia lança a “piece de resistance” do seu arsenal de bombas semióticas, testada durante a Copa: a não-notícia, blefe turbinado pelos “efeitos de realidade” - estratégia semiótica de produzir uma sensação de verossimilhança através de imagens e sons propositalmente “sujos” que, numa televisão de alta definição, ganha uma conotação “investigativa” ou de “denúncia”. E as supostas denúncias da revista “Veja”, repercutidas de imediato pela grande mídia, sobre a “farsa da CPI da Petrobrás” são os primeiros estilhaços das não-notícias na opinião pública, apontando a necessidade urgente de combate a um novo analfabetismo: o midiático-visual.

Em plena televisão digital de alta definição se repetem em telejornais e congêneres imagens granuladas em preto e branco, câmeras com imagens desfocadas e trêmulas e infográficos toscos reproduzindo supostos diálogos telefônicos e microfones escondidos com áudios sujos e trechos inaudíveis acompanhados de legendas.

Na medida em que as eleições aproximam-se, a Copa do Mundo foi organizacionalmente bem sucedida (apesar das previsões catastróficas), as grandes manifestações de rua acabaram e a oposição política ao Governo se demonstra cada vez mais inepta, a grande mídia lança a piece de resistance do arsenal das bombas semióticas: o blefe das não-notícias, turbinadas por uma estratégia que, em tempos de paz, a televisão sempre utilizou de forma discreta e esparsa: aquilo que o semiólogo francês Roland Barthes chamava de “efeitos de realidade” – detalhes semioticamente estratégicos para produzir uma sensação de verossimilhança principalmente em telejornais – leia BARTHES, Roland, S/Z  - Um Ensaio, Edições 70, 1999.

domingo, agosto 03, 2014

O Templo de Salomão da Igreja Universal e a arquitetura da destruição

O que há em comum entre Las Vegas e Disneylândia com a recém-inaugurada réplica do Templo de Salomão construída pela Igreja Universal? Las Vegas é a cidade que irradia hiper-realismo kitsch para todo o planeta com suas réplicas da Torre Eiffel, Esfinge de Gizé e palácios romanos da Antiguidade. Ao lado da Disneylândia, foi o primeiro parque temático da História, complexas cenografias de neons, gesso, concreto e metal que, assim como o Templo da Igreja Universal, exploram a fé nas entidades “espirituais” – Deus, jogo, sorte e animações digitais. E assim como shoppings e prédios corporativos espelhados, o Templo é mais um “bunker” em uma cidade que não se integra. Mais um exemplo de arquitetura da destruição, dessa vez a serviço da teologia da prosperidade cuja igreja esconde a mesma natureza dos cassinos: a banca sempre ganha.

Nessa semana foi inaugurado em São Paulo o suntuoso novo prédio da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), uma réplica do que teria sido o Templo de Salomão como descrito na Bíblia. Os detalhes que envolveram a construção do complexo de 74 mil m2 de área construída são faraônicos: todo o piso do templo e o altar são revestidos com pedras trazidas de Israel. O altar traz a Arca da Aliança, descrita na Bíblia como o local em que Salomão construiu para guardar os Dez Mandamentos no primeiro Templo, em torno do século 11 a.C, em Jerusalém. Foram ainda trazidos do Uruguai doze oliveiras para reproduzir o Monte das Oliveiras, local sagrado onde Jesus teria transmitido alguns dos seus ensinamentos.

O templo supera em quatro vezes o tamanho do espaço construído do Santuário Nacional de Aparecida (SP), além da grandiosidade dos altos custos de R$ 685 milhões.

Como era de se esperar, a mídia partiu para cima lembrando a célebre frase de Balzac: atrás de uma grande fortuna há um crime. Desde 2010 sob investigação pelo Ministério Público, fala-se em alvarás irregulares, desrespeito à lei de zoneamento, falta de contrapartidas de trânsito exigidas pela CET, irregularidades na importação de matérias usados na construção etc.

sexta-feira, agosto 01, 2014

"La Jetée"´foi o marco da viagem no tempo no cinema


O filme de média metragem francês La Jetée (1962) do diretor Chris Marker foi uma das obras que mais influenciaram a cultura atual: da literatura, rock ao cinema de ficção científica como “Os 12 Macacos” de Terry Gilliam, “Red Espectacles” de Momoru Oshi ou “Em Algum Lugar do Passado” de Richard Matheson. Pela primeira vez na ficção científica a viagem no tempo é explorada de forma proustiana como memórias induzidas por estados alterados de consciência. Em um mundo pós III Guerra Mundial, um homem com uma recorrente imagem da infância de uma misteriosa e bela mulher é submetido à experiência de viagem no tempo por meio de drogas como esperança de encontrar no passado um meio de salvar a espécie humana. Mas lá ele encontrará mais do que isso. Filme sugerido pelo nosso leitor Daniel Cruz de Souza.

terça-feira, julho 29, 2014

Em "O Teorema Zero" Terry Gilliam revela seu niilismo gnóstico

Em “O Teorema Zero” (The Zero Theorem, 2013) Terry Gilliam retorna aos temas das produções anteriores “Brazil, O Filme” (1985) e Os 12 Macacos (1995), porém em um tom mais intimista e filosófico: enquanto espera uma misteriosa ligação telefônica que revelaria o verdadeiro sentido da vida, um analista de dados e programador é obrigado a comprovar matematicamente o contrário: que um dia todo Universo acabará sugado por um buraco negro e a vida não tem qualquer sentido ou propósito. Esse é o projeto secreto de uma gigantesca corporação, comprovar matematicamente o “Teorema Zero” – zero é igual a 100%. Gilliam vai abraçar alegremente esse niilismo gnóstico como a última esperança de libertação – zero é igual a 100% se aproxima da filosofia do filme “O Clube da Luta” de David Fincher: depois que perdermos tudo é que estaremos livres. Então encontraremos as respostas dentro de nós mesmos.

Quem não se lembra daquela situação nas aulas de álgebra e equações de segundo grau na escola onde você olhava para o enunciado da equação e intuitivamente já sabia o valor de X? Você escrevia X = 15, mas o professor não aceitava a reposta, embora correta, pois exigia que demonstrasse o método resolutivo que fez chegar ao resultado.

Pois é exatamente sobre isso que trata o novo filme de Terry Gilliam O Teorema Zero onde Christoph Waltz faz um “triturador de entidades” (Qoen Leth, um analista e programador de dados) que é incumbido de montar computacionalmente uma gigantesca equação cujos enunciados comprovem que 0 = 100%, ou seja, que todo o Universo um dia vai ser encolhido em uma pequena singularidade e engolir a si mesmo em um buraco negro. Colocado em termos filosóficos, ele deve comprovar matematicamente que a vida não possui qualquer sentido ou propósito, embora intuitivamente suspeite (e procure negar) isso.

sábado, julho 26, 2014

Por que "E.T. O Extraterrestre" tornou-se um clássico AstroGnóstico?


Quase três gerações depois o filme “E.T. O Extraterrestre” (1982) continua emocionando, tornando-se um clássico como “O Mágico de Oz”. Como uma produção cinematográfica alcança esse estágio atemporal? O filme oferece mais do que uma história de amizade e amor entre um menino e um ser extraterrestre: de um lado refletiu a incipiente cultura adolescente dos subúrbios norte-americanos da época, mas também o arquétipo contemporâneo do Estrangeiro, a condição humana de alienação e estranhamento através de uma fantasia AstroGnóstica: o paralelo da condição humana com a de um ser extraterrestre querendo retornar para casa.

terça-feira, julho 22, 2014

"Killer Cuisine" faz paródia surreal dos chefes de cozinha midiáticos



A série de curtas “Killer Cuisine” (2010) do norte-americano Ross Goodman é uma surreal e hilária paródia dos clichês da gastronomia midiática: um cozinheiro, cujo avô foi um açougueiro na Alemanha à época do nazismo, fuma compulsivamente na cozinha enquanto manipula alimentos e facas de forma agressiva, sob uma trilha sonora que varia de um melancólico blues às músicas de terror B nos anos 1950. Enquanto isso uma mulher é amarrada e embebedada com vinho branco à espera de ser o próximo ingrediente culinário. Os curtas são uma verdadeira aula sobre aquilo que em linguagem cinematográfica se chama “efeito Kuleshov” e também suscitam um debate sobre os alimentos regidos pela lógica do “look” e do “light” dos chefes de cozinha midiáticos. Veja os curtas.

domingo, julho 20, 2014

"Transcendence" mostra fábula nietzschiana sobre tecnologia e poder

Crítica e público estão massacrando o filme “Transcendence – A Revolução” (2014). Todos esperavam um sci fi clássico com super-heróis e narrativas de ação e terror. Mas o filme nos oferece uma extrapolação do atual discurso autopromocional das neurociências e ciências da computação através do olhar de uma autêntica fábula nietzschiana sobre o Poder: a grande questão da onisciência e onipresença de uma suposta superinteligência digital por trás de corporações como Google e do projeto da Internet das Coisas não é a do Poder vulgar em conquistar mais dinheiro e controle político: é o Poder pelo Poder, como jogo, vontade de potência em transcender os limites da ética e moral humana representado pela superação do próprio corpo.

Nelson Rodrigues dizia que toda unanimidade é burra. Certamente essa máxima pode ser aplicada à forma como a crítica e o público está recebendo o filme Transcendence – A Revolução. Bilheterias decepcionantes nos EUA e Brasil e péssimas críticas tanto aqui como lá.

“Muito conceito e pouca história para contar”, “explicações incessantes”, “elenco estrelado (Johnny Deep, Morgan Freeman e Cillian Murphy e Paul Bettany) que parecem não saber o que fazer trocando frases soltas entre si”, “pretensioso e chato” etc. O que parece criar estranhamento para os críticos são os desempenhos “contidos” ou até “robóticos” do protagonista Deep e um filme que parece investir muito mais nas rimas visuais e em conceitos abstratos do que em uma história dramática.

Crítica e público esperavam um “filme de ficção científica” com super-heróis ou narrativas de ação e terror com um “sabor” de sci-fi, que é o que normalmente Hollywood oferece. Mas o que o diretor Wally Pfister (desde o filme Amnésia diretor de fotografia dos filmes de Christopher Nolan) foi uma verdadeira ficção científica: a partir da agenda tecnologia atual, extrapolar para onde estamos indo e o que isso pode significar para a raça humana, intelectual e espiritualmente.

sexta-feira, julho 18, 2014

Lição para trainees da TV Globo: análise de um vídeo "fractal"

Sintoma? Ato falho? Autoparódia? Provocação? Talvez seja tudo isso, um verdadeiro vídeo “fractal” (figura geométrica similar a um padrão que se repete em escala maior) feito para promover o Programa de Trainees 2014 da TV Globo. Certamente, a primeira lição para os trainees da emissora poderia ser a de analisar esse vídeo performado por Marcius Melhem e Marcelo Adnet: um general estilizado recruta jovens de 18 anos para o alistamento na “maior emissora de comunicação do... Brazziilll” (o nome do País em sotaque inglês). Sabendo-se das polêmicas origens da TV Globo no período da ditadura militar, podemos encontrar no “teaser” promocional o reflexo da corda bamba em que se encontra atualmente a TV Globo entre ter que ser politicamente de oposição e, ao mesmo tempo, aparentar transparência e modernidade.

O “Banco de Talentos”, site de recrutamento onde a TV Globo forma sua verdadeira reserva de mão de obra cadastrando candidatos a diversos programas corporativos da emissora, publicou uma página do Programa de Trainee Globo 2014. Visualmente a página é interessante e até saudosa: lembra os projetos visuais da extinta MTV Brasil com as fontes de texto irregulares, o grafismo com ares retro e no destaque Marcelo Adnet em cena do vídeo promocional do programa.

Se o gigante se conhece pelo dedo, esse vídeo promocional é uma ótima oportunidade para os jovens candidatos conhecerem o DNA da emissora na qual pretendem trabalhar. O site possui até uma página intitulada “Conhecendo a Rede Globo” onde encontramos um daqueles textos com estilo corporativo eufemístico falando de “missão”, “sonhos” e “líderes”.

quarta-feira, julho 16, 2014

Em Observação: "Teorema Zero" (2013) - o sentido da vida pela via negativa

Quase 20 anos depois, o diretor inglês Terry Gilliam está de volta ao gênero ficção-científica, mas as suas preocupações filosóficas continuam as mesmas. Misturando distopia e religião, Gilliam em “O Teorema Zero” (2013) pretende discutir qual o sentido da vida, já que a ciência nos informa que todo o Universo um dia acabará em uma singularidade no interior de um buraco negro. No interior de uma igreja abandonada o protagonista espera uma ligação telefônica que lhe traga a resposta, mas o diretor parece pouco preocupado com isso: ele abraça alegremente a ausência de sentido (a chamada "via negativa" da Filosofia), lembrando a máxima do personagem Tyler Durden em “O Clube da Luta”: “Depois que perdermos tudo, então estaremos livres”. Filme sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende.

terça-feira, julho 15, 2014

Mídia esportiva sofre de transtorno semiótico bipolar

Entre as palavras e as coisas existe uma estrutura fixa, pronta, que tenta capturar a dinâmica das coisas para congela-las em mitos. Com a mídia esportiva não seria diferente: a cada Copa do Mundo entra em funcionamento um discurso bipolar pronto para explicar os fracassos do futebol brasileiro – ora nos falta racionalidade, organização e planejamento; ora precisamos retornar “às nossas raízes” sufocadas pela mesma “modernidade” defendida na Copa anterior. Essa mitologização do futebol teria duas funções: neutralizar o acaso e a incerteza, eliminando a natureza lúdica do esporte, e evaporar a História – deixar de fora desse discurso bipolar os fatores midiáticos e político-econômicos que parasitam o futebol.

Na postagem anterior discutíamos que a goleada acachapante sofrida pela Seleção no jogo contra a Alemanha tinha sido mais do que um evento, mas o sintoma de fatores de influência midiática (“efeito Heisenberg” e esquizofrenia midiática – clique aqui). Mas nessa discussão acabamos achando outra coisa: descobrimos que a imprensa esportiva parece ter um discurso pronto a cada fracasso do futebol brasileiro em copas.

Embora seja um discurso estruturado e fixo, também é dinâmico como fosse um pêndulo semiótico: ora os jornalistas especializados culpam as derrotas pelo atraso, desatualização e falta de “modernidade” do futebol brasileiro (que chamaremos de “fase 1”), ora falam de um excesso de pragmatismo que faria a Seleção abandonar suas “raízes” (“fase 2”).

quinta-feira, julho 10, 2014

"Efeito Heisenberg" e esquizofrenia midiática derrubam a Seleção

A mídia parece ter um discurso pronto para cada traumática desclassificação nas Copas, em um movimento semioticamente pendular: ora diz que falta “modernidade”, ora defende “tradição” ao futebol brasileiro. Mas dessa vez, nada explica a anomalia de um 7 X 1. Pelo menos os comentários da imprensa especializada foram unânimes: não foi placar de um jogo de futebol profissional. Quem lida com semiótica e sincromisticismo sabe que quando eventos tornam-se bizarros e anômalos deixam de ser meros acontecimentos para se converterem em sintomas. No caso dessa partida, sintoma de dois fatores extra-esportivos: o chamado “efeito Heisenberg” (a patologia de toda cobertura midiática extensiva) e a esquizofrenia de uma mídia sob o desgaste de politicamente ter que sabotar o evento e ao mesmo tempo faturar comercialmente.

Holanda 2 X Brasil 0, o jogo na Copa de 1974 que desclassificou o Brasil para as finais; Itália 3 X Brasil 2, jogo que tirou a Seleção da Copa de 1982; Holanda 2 X Brasil 1, jogo que eliminou a Seleção nas quartas na Copa da África do Sul em 2010.

É interessante perceber nesses momentos de aguda comoção nas crises da chamada “pátria de chuteiras” a construção de um script midiático para racionalizar as catástrofes. Um script pendular que vai do discurso da necessidade de “modernização” ao do “retorno às raízes”: de um lado a ideia de que o futebol brasileiro está ultrapassado diante da modernidade europeia (a revolução tática do “carrossel holandês” em 1974 ou a crítica ao futebol bonito da seleção em 1982, mas sem a eficiência e aplicação europeias) e do outro um futebol que ficara tão pragmático que teria esquecido “a arte” – como no caso da comemoração do “fim da Era Dunga” acusada de abandonar o “futebol bem jogado” em 2010. Ora a modernidade, ora a tradição.

terça-feira, julho 08, 2014

Matemática e Surrealismo: Carroll, Escher e matemagos


Em que momento a Matemática, a ciência do raciocínio lógico e abstrato, pode converter suas deduções rigorosas em surreais paradoxos visuais e lógicos? Surrealismo e matemática não se opõem, mas podem ser excelentes aliados. A férrea lógica matemática pode contribuir eficazmente em desmascarar a falta de lógica dos esquemas de pensamento e o funcionamento de sistemas opressivos. Muitos paradoxos, charadas e falácias matemáticas constituem autênticas sátiras dos vícios de pensamento da nossa cultura. Os romances matemáticos de Lewis Carroll e o insólito fascínio pelas imagens de M.C. Escher acabaram criando a lógica do “non sense” presente tanto em escritores como Kafka quanto em filósofos como Jean Baudrillard. Vamos explorar as possibilidades de encontros entre o Surrealismo e a Matemática.

domingo, julho 06, 2014

Em Observação: "Equilibrium" (2002) - totalitarismo, artes marciais e anti-depressivos

O filme “Equilibrium” um daqueles filmes que a gente nunca ouviu falar, mas que quando assistimos ficamos surpresos pelo anonimato. Com visual, figurino e fotografia que lembra muito Matrix dos irmãos Wachowski, o filme mostra um sistema totalitário baseado na repressão de tudo aquilo que poderia estimular no homem a expressão de sentimentos – arte, principalmente. Os sentimentos seriam a pior parte da natureza humana, capaz de provocar guerras e mortes. Por isso, todos seriam induzidos a tomar uma droga capaz de inibir qualquer expressão de sentimentos. “Sacerdotes” especializados em lutas marciais e concentração Zen caçariam todos os “ofensores” que teimam em manter objetos artísticos. Como um documento de época, “Equilibrium” representaria o imaginário atual da banalização de drogas como Prozac ou Ritalina onde um secreto sistema totalitário se desenha baseado na seletividade dos sentimentos que devemos ter.

sexta-feira, julho 04, 2014

"L'Immortelle" criou a mulher metafísica para o cinema

Filmes gnósticos como “Matrix” e “Vanilla Sky” apresentam uma galeria de personagens femininos fortes, sem história, que de repente surgem na vida do protagonista para retirá-lo de um mundo de ilusões. Esses filmes são tributários não só da mitologia gnóstica de Sophia, mas, cinematograficamente, do cult “L’Immortelle” (1963) de Allain Robbe-Grillet. Depois de mulheres pin-ups, objetos e femme fatales na história do cinema, o diretor e romancista francês inseriu a mulher em narrativas de mistério metafísico: misteriosas, etéreas, mas ao mesmo tempo sensuais e sedutoras. Dessa forma, a mulher metafísica de Robbe-Grillet converte o protagonista masculino em "Estrangeiro" – metáfora da condição humana de alienação e estranhamento.

Quem não se recorda da personagem Sofia (Penélope Cruz) em Vanilla Sky (2001) despertando o protagonista David Aymes aprisionado em uma simulação de realidade em um sonho lúcido? Ou de Trinity (Carie-Anne Moss) que, graças ao seu amor, fez Neo descobrir que era O Escolhido em Matrix (1999)? Ou ainda da personagem Sylvia que fez Truman descobrir que sua vida era uma prisão dentro de em um gigantesco reality show em Show de Truman (1998)? Personagens femininos fortes, sem história, que surgem de repente na vida do protagonista para despertá-lo do sono das ilusões que o prendem a esse mundo. Mulheres que muitas vezes sacrificam o seu amor e a si mesmas pela redenção do herói e de toda humanidade.

Pois essas mulheres por trás de todos esses heróis do gnosticismo pop cinemático descendem mitologicamente do personagem gnóstico de Sophia, o aeon que vai despertar no homem a fagulha de luz interior (a gnose) para conectá-lo de volta à Plenitude. Mas cinematograficamente, são devedoras de um cult do cinema onde a mulher foi elevada a outro patamar, depois de décadas de mulheres objetos, femme fatales e pin-ups: o filme francês L’Immortelle (1963). Aqui o diretor Alain Robbe-Grillet (romancista e roteirista indicado ao Oscar no filme de Allain Renais The Last Year at Marienbad - 1961) eleva a mulher a um patamar metafísico - mas sem deixar de ser carnal e provocante.

quarta-feira, julho 02, 2014

"Agnosia" revela formas alternativas da mente no cinema

O filme espanhol “Agnosia” de Eugenio Mira e “A Origem” de Christopher Nolan foram lançados no mesmo ano de 2010. São dois filmes com versões diferentes para o mesmo tema: um thriller de espionagem industrial que envolve a invasão da mente de alguém para extraírem um segredo que envolve interesses corporativos. Um exercício de análise comparativa entre os dois filmes revela diferentes formas de representar a mente humana: se na Europa a Psicanálise e a psicologia da percepção possuem prestígio no meio artístico e intelectual, nos EUA a mente não é pensada como uma máquina desejante, mas informática onde dados são deletados ou inseridos. Enquanto “Agnosia” é um conto gótico inspirado em psicanálise, “A Origem” é o inconsciente traduzido pelas neurociências.

A análise comparada em cinema (o exercício de analisar diferentes visões de filmes e diretores sobre um mesmo tema) sempre dá surpreendentes resultados ao revelar as diferenças ideológicas e culturais de países ou de polos de produção cinematográfica.

Um exemplo evidente é o filme espanhol Agnosia (2010) do diretor Eugenio Mira e escrito por Antonio Trashorras. Assistindo ao filme, é impossível não comprarmos com o filme de Christopher Nolan A Origem (Inception, 2010), produção norte-americana lançada no mesmo ano da produção espanhola. Ambos exploram o tema da espionagem industrial: há um segredo de grande interesse industrial que está na mente de uma pessoa e que deve ser extraído.

sexta-feira, junho 27, 2014

Por que nossa mente quer ser enganada?

Militantes do PSDB posando para fotografias ao lado de um display de papelão do candidato Aécio Neves em tamanho real na convenção do partido e um jornalista que confundiu o sósia do Felipão com o verdadeiro. Qual a secreta conexão entre esses dois episódios? O estranho desejo humano de querer ser enganado. E a filosofia da percepção e a neurologia podem explicar isso. Por que pacientes que sofriam de afasia global e agnosia tonal ridicularizaram um discurso na TV do presidente Ronald Reagan em 1985 enquanto os receptores normais o consideravam um “grande comunicador”? Talvez o caminho seja entender a natureza das “imagens-afecção” e a solução do enigma do porquê demoramos meio segundo para ter consciência das decisões que o nosso próprio cérebro teve. A contra-tática para combater a canastrice na política pode estar nas mão dos filósofos da percepção como Brian Massumi e em neurologistas como Oliver Sacks.

As imagens dos bonecos de papelão do candidato Aécio Neves na convenção do PSDB para que militantes posassem ao lado do display e a “barriga” jornalística cometida pelo colunista Mario Sergio Conti que confundiu o sósia com o verdadeiro Felipão revelam um secreto sincronismo: o estranho desejo humano de querer ser enganado.

Em postagem anterior discutíamos como era possível que ainda hoje a opinião pública ainda seja mobilizada por táticas publicitárias e de propaganda tão estereotipadas, exageradas, com personagens tão canastrões, caricatos, com gestos, expressões faciais e poses tão overacting. Péssimos atores que não conseguiriam passar pelo mais simples teste de seleção do cast do filme de mais baixo orçamento - sobre esse tema clique aqui.

Assistindo ao filme O Grande Ditador de Chaplin, somos dominados por uma estranha sensação ao se questionar sobre quem teria inspirado quem: a pantomima de Chaplin também estava presente nos gestuais e discursos de Hitler e Mussolini. Quem se inspirou em quem? O gênio de Chaplin não foi o de fazer uma caricatura genial de um ditador, mas de revelar a todos que na política levamos a sério maus atores – Chaplin mostrou de uma forma profissional o que Hitler e Mussolini faziam de forma canastrona.

terça-feira, junho 24, 2014

Curta "BlinkyTM" mostra as obscuras relações humanas com a tecnologia

O curta metragem “BlinkyTM - Bad Robot” (2011) dirigido pelo irlandês Ruairi Robinson segue a trilha temática análoga ao filme premiado pelo Oscar “Ela” de Spike Jonze: a relação mágica e fetichista com os gadgets tecnológicos. Se no filme de Jonze um usuário se apaixona por um sistema operacional, no curta de Robinson uma criança acredita na promessa de um anúncio publicitário de que um robô de estimação será capaz de reunificar a sua família, cujos pais estão em constantes brigas. O curta é uma ótima oportunidade para discutir os efeitos do descompasso entre os modelos de família perfeita apresentados pelo discurso publicitário e as relações reais entre pais e filhos. Curta sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende.

Em um futuro próximo toda casa terá um robô ajudante capaz não só de entreter seu filho como de também fazer o almoço. Mas não se preocupe. É perfeitamente seguro... mas, cuidado com o que você pedir para ele: o robô poderá interpretar ao pé da letra o que você desejar e as consequências podem ser imprevisíveis.

O diretor e animador irlandês Ruairi Robinson (indicado ao Oscar em 2002 com o curta Fifty Percent Grey) com o curta BlinkyTM - Bad Robot nos sugere como pode ser perigosa a combinação dos velhos problemas humanos com a moderna tecnologia, não só incapaz de resolvê-los como ainda podendo ampliá-los. Máquinas e seus programadores são incapazes de inserir julgamentos éticos ou morais entre os O e 1 das codificações. Mas os usuários dos gadgets tecnológicos não veem dessa maneira e passam a ter uma relação fetichista ou mágica, acreditando que aplicativos, programas ou robôs irão misticamente encontrar soluções para nós.

Tecnologia do Blogger.

 
Design by Free WordPress Themes | Bloggerized by Lasantha - Premium Blogger Themes | Bluehost Review