domingo, novembro 01, 2020

Outra semana de guerra híbrida: fechamento da pauta midiática e do universo de locução

Depois do dinheiro na cueca, traficante do PCC sendo libertado pelo STF e jogador condenado por estupro contratado no futebol, o show não pode parar: mais uma semana de “crises” com o “Caso Nhonho”, o “Boi Bombeiro” ganhando status de “tese” nos telejornais e Bolsonaro fazendo piada homofóbica com o Guaraná Jesus no Maranhão. Cenas de uma recorrente guerra semiótica criptografada, que se intensifica na proximidade das eleições e aprofundamento da recessão econômica. Os chamados “fatos diversos” (outrora confinados nas colunas de “drops da política”) agora trancam a pauta como fossem temas relevantes para a opinião pública. Mas a eficácia desse fechamento noticioso não vem do nada: foram necessários anos de bombas semióticas para criar o “fechamento do universo da locução”, uma nova espécie de “novilíngua”. Afinal, é por meio das palavras que uma sociedade aceita ou rejeita os “novos normais”.

sexta-feira, outubro 30, 2020

O Tempo destrói o cinema e a vida no filme 'Irreversível'


“Irreversível” (Irréversible, 2002) é brutal e cruel. Assim como o Tempo, no qual todo momento de felicidade depende de uma linha tênue que é corroída pela entropia na medida em que avançamos para o futuro. O diretor franco-argentino Gaspar Noé nos mostra como a vida seria insuportável sem a inocência da nossa ignorância sobre o Tempo – uma estória contada em ordem cronológica invertida: começamos pelas cenas brutais e selvagens para recuarmos para as cenas calorosas e divertidas de um casal apaixonado cujas vidas estão prestes a ser alteradas para sempre. Gaspar Noé desconstrói tanto o tempo da narrativa cinematográfica (que nos deixa desarmados diante das sequenciais iniciais), quanto a nossa inocência diante do Tempo: a ilusão do livre-arbítrio diante do Tempo que tudo destrói.

quarta-feira, outubro 28, 2020

O obscuro vazio lacaniano do desejo no filme 'The Special'


Alguém lhe entrega um saco de ouro. Uma grande responsabilidade e você não pode desperdiça-la. Um tesouro ou uma oportunidade perdida? O filme “The Special” (2020) parte desse conto moral simples para transformar em uma experiência de terror corporal: desconfiado que sua esposa está o traindo, Jerry decide se vingar: ele e seu amigo vão a um misto de prostíbulo e gabinete de uma vidente chamada Madame Zorah. Porém, a principal atração não são as prostitutas, mas uma misteriosa caixa preta chamada “The Special”. Uma simples caixa que revela ser um estranho dispositivo que lhe dá a maior experiência sexual da sua vida. “The Special” é uma história de um homem que descobre que não está no controle de sua compulsão quando experimenta uma estranha forma de prazer pela primeira vez. A misteriosa caixa é uma das melhoras metáforas cinematográficas sobre o obscuro objeto do desejo – o desejo como o vazio tal como descrito por Lacan: o impulso que por aproximações tenta recuperar alguma coisa que foi perdido entre o Real, o Simbólico e o Imaginário. O desejo de algo que nem o próprio desejo sabe o que é.

domingo, outubro 25, 2020

Em 'Borat Subsequent Moviefilm' o humor enfrenta uma realidade que quer superar a ficção


Catorze anos depois, Sacha Baron Cohen encontra um mundo pós-Borat que realizou na prática tudo aquilo que o primeiro Borat ridicularizava em 2006: confederados, supremacistas, o Sul Profundo da América e negacionistas conspiratórios que encontraram na Internet e na tecnologia digital (que, acreditávamos, nos tornaria mais sábios) o seu mundo para crescer e se reproduzir. E chegaram ao Poder. Como será que o novo filme de Sacha Cohen, “Borat Subsequent Moviefilm” (2020, disponível na Amazon Prime Video), vai conseguir fazer uma sátira crítica de uma realidade que parece ter superado qualquer ficção imaginada pelo Borat de 2006? Resposta: através do paroxismo - enfrenta o desafio de superar a realidade que está além da mockufiction fazendo um humor crítico travestido de comédia vulgar. 

sexta-feira, outubro 23, 2020

Série dinamarquesa 'Borgen' desmonta a bomba semiótica de gênero

Ao assistirmos a série dinamarquesa “Borgen” (2010-2013, agora disponível na Netflix), é inevitável não fazermos uma comparação com "House of Cards" e os maquiavelismos do senador Frank Underwood para chegar à Casa Branca. E lá permanecer em sórdidas conspirações. “Borgen” acompanha a meteórica ascensão de Birgitte, presidenta do partido dos Moderados, ao cargo de Primeira-Ministra da Dinamarca. Apesar de cada episódio abrir com uma epígrafe de Maquiavel, “Borgen” está bem longe da mitologia política do sistema presidencialista que a série americana popularizou: o mito do “Mr. President”, o “Estado Sou Eu”, o “Príncipe Maquiavélico” e jornalistas como patifes desesperançados. A grande virtude da série é não cair nos clichês fáceis do sexismo, como sugere o tema de uma mulher comandando uma nação cercada de homens que lutam para arrancar um naco que seja do poder. Há sexismo na Dinamarca, mas as mulheres de “Borgen” não jogam com estereótipos fáceis: com anos de antecedência, “Borgen” desmonta a bomba semiótica que mais tarde a extrema-direita utilizaria para criar a política de polarizações identitárias e de gênero que transformam a discussão política em um debate irracional.

segunda-feira, outubro 19, 2020

André do Rap, o Caso Robinho e o dinheiro na cueca: cenas de uma guerra híbrida invisível

O velho semiólogo Roland Barthes usava a “técnica de comutação” para descobrir as unidades mínimas de significados em um sistema linguístico ao substituir arbitrariamente um signo por outro, para descobrir os sentidos ocultos no sistema. No caso da guerra semiótica híbrida basta algo mais simples: o exercício de jornalismo comparado - por que casos semelhantes no passado não foram pautados pelo jornalismo corporativo e agora monopolizam a pauta com direito a infográficos caprichados e extensos holofotes midiáticos sobre figuras vaidosas como a do presidente do STF, Luiz Fux? Os casos André do Rap, do dinheiro na cueca do senador Chico Rodrigues e da contratação do jogador Robinho pelo Santos mostram que o gênio da guerra híbrida é o fato dela funcionar como uma “macro” em ciência da computação: regra ou padrão que especifica uma certa rotina de atividades determinada por um macrocomando invisível. A partir desse macrocomando (a “guerra cultural”) todos os lados começam a agir no automático, criando a polarização política que é a própria atmosfera na qual a extrema-direita respira e se reproduz.

sábado, outubro 17, 2020

'Jodorowsky's Dune': o maior filme que nunca foi feito

Um filme que talvez fosse mais importante do que “2001” de Kubrick. Diante do portentoso volume do roteiro e storyboard da adaptação do livro “Dune” feito pelo diretor franco-chileno Jodorowsky em 1975, os grandes estúdios de Hollywood tiveram medo e recusaram um projeto no qual tinha presenças confirmadas de Salvador Dali, Mick Jagger, Orson Welles, Gloria Swanson, David Carradine. Além de trilha musical original de Pink Floyd e Magma. “Dune” de Alejandro Jodorowsky transformaria “Star Wars” (lançado dois anos depois) numa pálida imitação. A história do maior fracasso bem-sucedido da história do cinema é contada no documentário “Jodorowsky’s Dune” (2013). Se realizado, o projeto “Dune” mudaria toda a estrutura dos blockbusters como conhecemos. Mas o roteiro, imagens e conceitos de Jodorowsky foram recusados, para depois serem imitados em doses homeopáticas a partir de ‘Star Wars’: ‘Alien’, ‘Bladerunner’, ‘Indiana Jones’, até chegar em ‘Matrix’ e ‘Prometheus’.

quarta-feira, outubro 14, 2020

Descendo pela toca do coelho da viagem no tempo com Christopher Nolan em 'Tenet'


Um filme opulento em que o estrondoso orçamento de US$ 200 milhões aparece em cada enquadramento. Somente o diretor Christopher Nolan poderia obter tamanho orçamento com um roteiro original. Em “Tenet” (2020) ecoam todos os temas de seus filmes anteriores (Amnésia, A Origem, Interestelar, Dunkirk etc.), chegando ao estado da arte de um tema recorrente na sua obra: a desconstrução da realidade. Em “Tenet”, Nolan combina conceitos abstratos (entropia invertida, viagem no tempo, universos em colisão etc.) com o gênero mais norte-americano do cinema: os filmes de perseguição. Uma bomba espaço-tempo invertida é enviada do futuro com o objetivo de destruir a nossa geração, a causadora do futuro apocalipse climático. Um rico e poderoso traficante de armas tenta reunir os fragmentos do dispositivo escondidos no tempo. Enquanto um grupo de agentes especiais tentam detê-lo. Acompanhamos uma guerra no tempo entre universos com tempo-espaço invertidos. Que muitas vezes ocorrem na mesma sequência, batalhas impossíveis no mesmo espaço-tempo. Nolan desafia o espectador a descer pela toca do coelho da viagem no tempo.

sexta-feira, outubro 09, 2020

Trump e Bolsonaro desconstroem a lógica do Papai Noel na Propaganda

Até aqui as estratégias de comunicação da chamada “direita alternativa” vêm sendo bem-sucedidas. Fala-se muito no poder de eleições viciadas, cheias de aplicativos, robôs e fake news com postagens automáticas em grupos de Whatsapp e mineração de dados pessoais de usuários de redes sociais. Porém, essas ferramentas somente são potencializadas através de uma deliberada desconstrução do campo da Política. Principalmente de duas instituições que são a alma dessa esfera pública: a Propaganda e a Publicidade – através de discursos hiperbólicos cheio de pegadinhas e iscas para jornalistas fisgarem, desconstrói o seu núcleo: a “Lógica do Papai Noel”. A eficácia da Propaganda e Publicidade sempre esteve muito menos na persuasão e muito mais na fábula e adesão. Trump e Bolsonaro ridicularizam não apenas a política, mas a própria Propaganda ao expô-la como uma piada. Um exemplo: a forma proposital como o presidente expõe os currículos fraudados de seus indicados.

quarta-feira, outubro 07, 2020

"Rent-a-Pal": a manipulação psicológica através do 'Efeito Forer' na era da solidão midiática


O diretor e roteirista Jon Stevenson encontrou um vídeo VHS de 1987 chamado “Rent-a-Friend” (“Alugue um Amigo”) cujo conceito era insólito: você apenas alugaria um amigo. Levaria a fita para casa e falaria com um personagem na fita. Era uma conversa unilateral, mas para os anos 80 era interativa. Isso inspirou o filme “Rent-a-Pal” (2020), passado em 1990 no auge do videocassete e das videolocadoras. Mas que discute o tema atual da solidão e incomunicabilidade em plena Era da Informação: David passa dias solitários cuidando de uma mãe idosa e que sofre de demência, enquanto procura uma garota em uma espécie de Tinder em VHS. Até que encontra na videolocadora a fita “Rent-a-Pal”, cujos “diálogos” começam a plantar sementes de amargura e ressentimento na mente de David, criando a dinâmica do ódio que alimenta grupos atuais como os “Incels” (celibatários involuntários) da Deep Web – matéria-prima do atual protofascismo que dá energia à extrema-direita. Técnica psicológica de manipulação chamada “Efeito Forer”. Uma eficiente técnica de “validação subjetiva”, largamente usada por astrólogos, videntes e coaches motivacionais.

domingo, outubro 04, 2020

O terror interdimensional gnóstico em 'Intersect'


O tema da viagem no tempo no cinema certamente é aquele em cujo pressuposto está uma das grandes discussões da Filosofia: livre-arbítrio X determinismo, a esperança de que através da tecnologia o homem vencerá a entropia da seta do Tempo. Mas com o auxílio luxuoso do horror cósmico de HP Lovecraft, o filme “Intersect” (2020) encerra de vez essa esperança. Se a viagem do tempo moderna é quântica (múltiplas dimensões e timelines) ela se aproxima da mitologia Gnóstica dos “muitos céus” - em cada um deles, entidades malévolas chamadas “Arcontes” mantêm o homem na ilusão para aprisiona-lo no mundo material. Em “Intersect”, um grupo de jovens cientistas cria uma máquina do tempo. Para confirmar a mitologia gnóstica dos Arcontes: somos manipulados por forças invisíveis interdimensionais.

quinta-feira, outubro 01, 2020

Trump X Biden: a desconstrução pós-moderna de um debate político

Toda a desconstrução pós-moderna de Wittigenstein, Lyotard e Derrida ironicamente se transformaram em “pratical joke” nas estratégias semióticas da chamada “direita alternativa”. É o que foi mostrado ao vivo, como uma espécie de show metaliguístico de desconstrução de um debate político: o tão aguardado debate entre o republicano Donald Trump e o candidato democrata Joe Biden. Trump foi o grande “vencedor” porque a “magia do caos” é o fio condutor de uma estratégia “desconstrutivista” que vai muito além da mentira ou das “fake news” – orienta-se pelo fenômeno da pós-verdade na qual a comunicação e a linguagem foram pulverizados em jogo e performance. O caos semiótico metodicamente criado através de cinco estratégias: Comunicação Indireta, Técnica de Dissociação, Desautorização do Interlocutor, Roll Over e forçar ao limite os pontos fracos das regras.

segunda-feira, setembro 28, 2020

Bolsonaro na ONU, grande mídia e as queimadas: esquerdas devem conhecer Ernst Bloch


O filósofo alemão Ernst Bloch foi uma das influências de Theodor Adorno e da chamada “Escola de Frankfurt”: foi o primeiro pensador marxista a considerar o imaginário nos meios técnicos (rádio e cinema) explorados pela propaganda nazi-fascista no século passado. Sua “Teoria da Assincronia” mostrou como o imaginário social foi politizado pela propaganda política: os tempos latentes, arcaicos e idílicos se mantêm em camadas mais antigas nas mentes das pessoas, mantendo a contradição em relação às modernizações tecnológicas e econômicas. E a propaganda atuou nesse tempo assíncrono do imaginário. Tanto o discurso de Bolsonaro na ONU quanto a cobertura da grande mídia das queimadas no Pantanal e Amazônia exploram esse imaginário assíncrono do “ódio ao presente”, o material explosivo das bombas semióticas da extrema-direita: religião, nacionalismo etc. A esquerda precisa urgentemente conhecer Ernst Bloch: como atuar nesse espaço assíncrono do imaginário? 

sábado, setembro 26, 2020

Série 'Upload': quando as corporações irão monetizar a imortalidade?


No cinema e audiovisual, sempre as representações sobre a existência após a morte fala muito mais sobre os vivos do que sobre o Além.  Porque o espírito de cada época cria sua própria representação da morte – hoje, influenciada pela Inteligência Artificial e a possibilidade de a alma ser transcodificada em bytes para um dia, conquistarmos a imortalidade no “céu” de uma nuvem de dados. A série da Amazon Prime “Upload” (2020-) tematiza esse sonho que é na atualidade levado bem a sério pelos engenheiros das Big Techs do Vale do Silício. A série acompanha a trilha atual de diversas séries e filmes onde a imortalidade é conquistada por meio da transferência da consciência digital. À beira da morte, um programador aceita os termos de um serviço de upload da consciência para um Paraíso transformado em luxuoso resort virtual hospedado em um servidor da corporação Horizon. No pós-morte descobrirá que a imortalidade pode ser tão enlouquecedora quanto a vida entre os vivos. E como as corporações serão capazes de monetizar a mais íntima experiência humana.

quinta-feira, setembro 24, 2020

Cinegnose lança livro 'Cinema Secreto: temas gnósticos, alquímicos e quânticos no cinema, audiovisual e cultura pop'

Este editor do Cinegnose está lançando o livro: “Cinema Secreto: Temas Gnósticos, Alquímicos e Quânticos no Cinema, Audiovisual e Cultura Pop”. O livro é o resultado dos dez anos de pesquisa deste blogue em mapear as principais mitologias gnósticas presentes no cinema (o Mito do Demiurgo, o Mito da Alma Decaída, o Mito do Salvador, o Mito do Feminino Divino etc.) e a sua categorização: filmes CosmoGnósticos, TecnoGnósticos, PsicoGnósticos, AstroGnósticos e CronoGnósticos. E as implicações tanto na cultura pop quanto na Ciência que esse conjunto de filmes sugere: as conexões do Gnosticismo com as filosofias herméticas, Alquimia e Física Quântica. 

domingo, setembro 20, 2020

Curta da Semana: 'Lady Gaga: 911" - o esotérico airbag mental diante da morte


Basicamente a estética videoclipe consiste na passagem de significante a significantes (alusões, referências etc.), sem apresentar significados, criando jogo para as referências culturais presentes no repertório do espectador. Essa é a chave do sucesso da cultura pop:  a metonímia no lugar do aprofundamento de metáforas. O novo videoclipe de Lady Gaga, “911” (faixa do seu novo álbum “Chromatica”) confirma essa lógica, mas vai além ao aproximar a fórmula metonímica pop da linguagem freudiana dos sonhos e do fenômeno esotérico da “tela mental” criada no momento da morte – o “airbag” emocional criado pela mente como proteção diante do medo da morte, do mergulho no desconhecido. Dos filmes de Jodorowsky (“El Topo” e “A Montanha Sagrada”) o videoclipe pega inúmeros simbolismos cristãos, budistas, zen, magia negra, paganismo etc. E dos filmes “The Wave” e “A Passagem”, o tema do fenômeno da “tela mental” no momento da morte. Criando um final ambíguo: Lady Gaga foi ressuscitada pelos paramédicos ou está morta num limbo entre vida e morte?

sexta-feira, setembro 18, 2020

Entre a utopia e a distopia, 'O Dilema das Redes' esquece do principal dilema do Capitalismo


“O Dilema das Redes” (The Social Dilemma, 2020) chega à Netflix na trilha de uma série de produções sobre a manipulação mercadológica e política dos dados de usuários das mídias sociais, desde a controvertida vitória eleitoral de Trump em 2016. Mas traz uma novidade: entrevista os primeiros executivos de Bigtechs como Twitter, Facebook e Instagram. Envergonhados, tentam explicar como projetos tão altruístas deram tão errado, como o botão do “Curtir” que pretendia “espalhar positividade pelo mundo”. O documentário tenta apresentar o “dilema” que dá título à produção: as redes e aplicativos simultaneamente entre utopias e distopias. Porém, não consegue enxergar o principal dilema que tem a ver com própria natureza do Capitalismo: bens de interesse público (comunicação, conhecimento, informação) apropriados como produtos de interesse privado – o lucro.

quarta-feira, setembro 16, 2020

'The Boys' e 'O Dilema das Redes': esquerda precisa de hackers e 'artivistas'

Ataques massivos de hackers de extrema-direita estão derrubando lives acadêmicas com temáticas progressistas revelando o campo mais bruto da guerra semiótica: os ataques cibernéticos em uma terra de ninguém no qual hackers agem livres como as gangs no deserto distópico de “Mad Max”.  Escandalizada, a esquerda ainda crê no senso de obrigação moral a direitos universais ou republicanos, simplesmente ignorando o paradigma comunicacional da viralização. Séries ficcionais como a segunda temporada de “The Boys” (2019-) e o documentário “O Dilema das Redes” (2020) mostram com a tática de viralização leva ampla vantagem sobre as estratégias tradicionais de propaganda. Restará à esquerda lutar no mesmo campo semiótico da extrema-direita, mesmo que seja nos limites da moral e da ética. Como mostra a “violência metafórica” do “Freedom Kick” do coletivo de artistas ativistas “Indecline”: vídeos de protesto com esculturas de cabeças hiper-realistas de Putin, Trump e... Bolsonaro – chegam aos países afetados pelas suas políticas para os seus opositores jogarem futebol com elas. A esquerda precisa de harckers e "artivistas".

sábado, setembro 12, 2020

Na série 'Ares', 'O Guia Pervertido da Ideologia' de Zizek encontra-se com as sociedades secretas


O documentário “O Guia Pervertido da Ideologia” (2012), com o filósofo Slavoj Zizek, no qual mapeia uma série de filmes para explicar a natureza atual da ideologia, certamente contaria com a série holandesa “Ares” (2020-) como mais um exemplo audiovisual. Disponível na Netflix, acompanha uma jovem e ambiciosa estudante de Medicina que, apesar de não carregar um sobrenome com pedigree, é convidada a entrar numa sociedade secreta de universitários que mais parece um culto. Cujos participantes são capazes de identificar seus tataravôs na conhecida pintura de Rembrandt “Ronda Noturna”. Um terror psicológico que sintetiza a ideologia cínica que permeia todas as elites: “Eu sei muito bem o que estou fazendo, mas mesmo assim faço”. Uma sociedade secreta que gira em torno de um culto aparentemente demoníaco cujo propósito principal é a expiação do sentimento de culpa - o legado do colonialismo da história da Holanda na sua elite: uma riqueza fundada historicamente na exploração, escravidão e violência.  

quinta-feira, setembro 10, 2020

A canastrice na política: os vídeos do Porta dos Fundos, Bolsonaro e Lula

Três vídeos marcaram esse feriado da Independência. O primeiro, um vídeo da série “#Polêmicadasemana” da trupe de humor Porta dos Fundos. E depois, o pronunciamento do presidente Bolsonaro e a fala de Lula à Nação. Dois paradigmas comunicacionais opostos: o vitorioso, até aqui, da viralização (através da canastrice na política em linguagem audiovisual tosca) da direita alternativa; e do outro o paradigma da “sedução”, com vídeo profissionalmente produzido trazendo o discurso racional de um estadista. E o vídeo do Porta dos Fundos, mais um exemplo da estranheza do humor que tenta fazer a paródia da política que já faz de antemão uma paródia de si mesma. Onde as esquerdas encontrarão o alfinete para furar a bolha que separa esses dois paradigmas comunicacionais? No campo semiótico da canastrice,  meta parodiado no vídeo do Porta dos Fundos.  

segunda-feira, setembro 07, 2020

Os infinitos mundos interiores da mente em "Estou Pensando em Acabar com Tudo"


Uma estória simples e direta: Jake quer apresentar a sua namorada para seus pais. Cruzam uma noite gelada de neve em direção à fazenda dos pais em uma pequena cidade. Porém, estamos em um filme do diretor e roteirista Charlie Kaufman: nada é tão simples ou parece ser o que aparenta. O filme “Estou Pensando em Acabar com Tudo” (I’m Thinking of Ending Things, 2020), disponível na Netflix, carrega todas as obsessões temáticas e ousadias formais dos filmes anteriores de Kaufman (“Quero Ser John Malkovich”, “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças” etc.) – personagens presos nos labirintos do próprio psiquismo. Explorações sobre arrependimento, fracassos e solidão contadas através de narrativas surrealistas que parecem dobrar sobre si mesmas em infinitos mundos interiores. Por isso, muitos sentem-se “bugados” ao assistir a um filme “confuso” e “enigmático”. O “Cinegnose” explica.

sábado, setembro 05, 2020

VAR no país da Lava Jato transforma futebol em esporte quântico


“Existe Justiça no Futebol?”, pergunta o Globo Esporte depois das polêmicas envolvendo o VAR nas últimas rodadas do Campeonato Brasileiro. Diferente da Europa onde a ferramenta tecnológica é um mero assistente do árbitro no campo, aqui foi contaminada pelo paradigma do moralismo ao estilo Lava Jato: teremos que passar tudo a limpo - política, economia, esporte... tudo deverá ser regido pelos princípios da Transparência, Verdade e Justiça. Então, o VAR é o instrumento para encontrar o “quantum” da Verdade que deve estar em algum frame infinitesimal da mecânica cinemática. Ao pretender remover a suposta subjetividade de um esporte essencialmente interpretativo, a “objetividade” do VAR pode ser uma farsa. Em busca do último frame, do quantum da Verdade, o VAR transforma o futebol em um “esporte quântico”. Porém, a separação dos frames, a resolução da imagem e interferência humana no processo para determinar o instante exato do passe ou posição dos atletas envolvidos na sucessão dos quadros esquece do “Princípio da Incerteza” de Heisenberg: o olhar do observador sempre altera aquilo que é observado.

quinta-feira, setembro 03, 2020

A mercadoria notícia da grande mídia banaliza a pandemia e seus mortos


Por que, apesar de toda a extensiva cobertura midiática da pandemia, a percepção do público parece muito mais de fastio, cansaço, do que de mobilização e emergência? Parece que a pandemia foi banalizada, como se as notícias não passassem de mais do mesmo. A grande mídia se autodescreve como de “utilidade pública”: o cidadão precisaria de informações para se orientar num momento de crise sanitária. Porém, a notícia é mais um produto mercadológico com interesses privados: atrair anunciantes e proporcionar ao espectador/consumidor uma experiência positiva. Horror, indignação ou mal-estar são sensações evitadas por estratégias discursivas: abstração dos números e infográficos, “canastricização” dos mortos, as palavras “população” e “sociedade” substituindo “classes sociais” e a indignação seletiva: aglomeração nas praias não pode, ônibus e metrôs lotados sim... desde que a aglomeração esteja gerando mais-valia aos anunciantes do noticiário.  

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